Sergei Shoigu, ministro da Defesa da Rússia | Foto: AFP/Photo

“Em 24 de fevereiro de 2022, o início da operação militar especial na Ucrânia marcou o fim do mundo unipolar, o domínio incondicional dos EUA e seus aliados é coisa do passado”, afirmou o ministro da Defesa da Rússia, Sergei Shoigu, na abertura da 10ª edição da cúpula de Segurança Internacional de Moscou, que reuniu representações da Ásia, África, Oriente Médio e América Latina.

“A multipolaridade se tornou uma realidade”, sublinhou Shoigu, assinalando que a “principal diferença” é que alguns “respeitam os interesses dos Estados soberanos e levam em conta as particularidades culturais e históricas dos países e dos povos”, enquanto outros “os desconsideram”.

Shoigu ressaltou que na Europa “a situação da segurança é pior do que no auge da Guerra Fria” e as atividades militares da OTAN “se tornaram tão agressivas e antirrussas quanto possível”. Ele acrescentou que o envio de mais forças da OTAN para o ‘flanco oriental’ “já havia começado antes do início da operação militar especial na Ucrânia”.

“A OTAN deixou cair suas máscaras. Hoje, os documentos de planejamento estratégico da aliança consagram as reivindicações de domínio global. Os interesses da Aliança incluem a África, o Oriente Médio e a Orla do Pacífico”, sublinhou o dirigente russo.

Para o Ocidente – acrescentou -, “o sistema estabelecido de relações internacionais deveria ser substituído por uma chamada ordem mundial baseada em regras”.

Cuja lógica é baseada em “ultimatos”. “Ou o candidato a ‘parceiro democrático’ da aliança perde a soberania e se torna supostamente do ‘lado certo da história’, ou é relegado à categoria dos chamados regimes autocráticos, contra os quais todos os tipos de medidas, incluindo a pressão coerciva, podem ser usados”.

Desnazificação na Ucrânia

Sobre o conflito na Ucrânia, Shoigu advertiu que as forças militares russas estão sendo confrontadas por forças ocidentais combinadas, que dirigem a liderança daquele país em uma guerra híbrida contra a Rússia. O fornecimento de armas à Ucrânia está sendo intensificado e enormes recursos financeiros estão sendo transferidos para manter o regime ultranacionalista, registrou.

As ações das forças armadas da Ucrânia estão sendo planejadas e coordenadas por conselheiros militares estrangeiros. Esforços que visam “prolongar a agonia do regime de Kiev”.

“Entretanto, sabemos de fato que ninguém na OTAN tem dúvidas de que os objetivos da operação militar especial da liderança russa serão alcançados e que os planos de enfraquecer estratégica e economicamente a Rússia estão fracassando. O dólar não atingiu o teto de 200 rublos, como previsto pelo presidente dos EUA, a economia russa se manteve firme”, enfatizou.

O ministro russo destacou ainda que a operação militar especial “dissipou o mito das ‘super armas’ fornecidas à Ucrânia pelo Ocidente”, que supostamente iriam mudar a situação na frente de batalha – sistemas javelin, drones, himars e howitzers. No entanto, tais armas não causaram um impacto significativo. As armas russas, por sua vez, provaram suas melhores qualidades em combate.

O fornecimento de armas da OTAN a Kiev significa que “os países ocidentais são responsáveis por seu uso desumano e pela morte de civis no Donbass e nos territórios libertados”, disse Shoigu.

As operações das forças armadas ucranianas – acrescentou – são planejadas “em Washington e Londres”. “Não apenas as coordenadas dos alvos a serem atacados são fornecidas pela inteligência ocidental, mas a entrada desses dados nos sistemas de armas é conduzida sob o controle total de especialistas ocidentais”.

Bucha de canhão

O papel de Kiev na abordagem de combate do Ocidente – ele observou – foi reduzido ao fornecimento de mão de obra, que é vista como dispensável. Isto explica a enorme perda de pessoal nas forças armadas e nas formações de defesa territorial da Ucrânia.

Shoigu também denunciou os laboratórios militares biológicos dos EUA na Ucrânia, cujas atividades não são exceção. Laboratórios controlados pelo Pentágono foram estabelecidos e operam em muitos países pós-soviéticos, asiáticos, africanos e latino-americanos.

O ministro russo da Defesa denunciou a “degradação dos mecanismos de confiança e controle de armas que surgiram na Europa durante a Guerra Fria”. “Há alguns anos, os especialistas propuseram que a experiência europeia fosse utilizada para construir medidas de confiança, em particular na Orla do Pacífico. Agora, de toda a ‘bagagem’ do Eurodiálogo, apenas a ideia do confronto em bloco é exportada para a Ásia, o que não trouxe nada de positivo para a segurança na Europa”.

A Organização para Segurança e Cooperação na Europa, que foi concebida como uma plataforma para diálogo e consideração de diferentes pontos de vista, tornou-se um gerador de narrativas anti-russas, apontou.

Arquitetura global de segurança

Shoigu também registrou “a destruição americana do Tratado de Mísseis Antibalísticos, do Tratado de Limitação de Alcance Intermediário e de Curto Alcance e do Tratado de Céus Abertos”, embora anteriormente estes acordos fossem “cruciais para o desarmamento e a criação de confiança”.

A oposição ocidental à consolidação de um mundo multipolar, além da Europa, é mais ativa na região Ásia-Pacífico, onde os EUA começaram a desmantelar o atual sistema de cooperação regional baseado na ASEAN.

Isto começou com o anúncio da aliança AUKUS pelos EUA, Austrália e Reino Unido. AUKUS está se fundindo com a OTAN, que por sua vez reivindicou um papel dominante na região da Ásia-Pacífico na cúpula de junho. Isto apesar de todos os países da OTAN estarem a milhares de milhas de distância da região.

Shoigu destacou ainda o 2 de agosto e os 77 anos da entrada da União Soviética na guerra com o Japão. “A derrota das forças japonesas no Extremo Oriente selou efetivamente o fim da Segunda Guerra Mundial e proporcionou o início da libertação dos povos da Ásia da opressão colonial. A assistência da URSS foi de fundamental importância”.

O ministro russo também se referiu à provocação de Washington à China em Taiwan. Ele chamou de “movimento para desestabilizar a situação” ao ostensivo desembarque em Taiwan da terceira pessoa na hierarquia dos EUA.

Shoigu também saudou os mecanismos de interação e diálogo com parceiros extra-regionais. Antes de tudo, é a Reunião dos Ministros da Defesa e Parceiros da ASEAN, o chamado formato “ADMM-Plus”. Suas diversas atividades se concentram em questões de segurança de relevância para a região Ásia-Pacífico. Além disso, há uma experiência positiva de cooperação dentro da Organização de Cooperação de Xangai, de implementação de projetos mutuamente benéficos numa base bilateral.

“Como antes, estamos prontos para compartilhar nossa experiência de treinamento em combate, em particular durante o exercício estratégico Vostok-2022, a ser realizado em um futuro próximo”. Ele também destacou o engajamento dos países garantidores no formato Astana e se congratulou com o maior engajamento entre a liderança síria e o mundo árabe.

Em relação à África, Shoigu apontou que a especificidade reside no desejo dos países do Ocidente coletivo de “retornar à ordem e às regras de engajamento típicas do período colonial”, exemplificando com o desastre imposto pela OTAN à Líbia.

Quanto à América Latina, é a tentativa de prorrogar os ditames da Doutrina Monroe. Shoigu comparou o que a mídia ocidental agora diz sobre a operação especial russa na Ucrânia com o que fez, quando do conflito nas Malvinas, em relação às ações britânicas.

Shoigu também agradeceu à expressiva participação no fórum de Moscou, apesar das tentativas dos EUA e da OTAN de isolarem a Rússia. A participação de vocês é a “confirmação visível” de que tais planos colapsaram.

Ele observou que a realidade de hoje é o mundo multipolar, apesar de que a transição da dominação por um só ‘líder global’ para vários centros de gravidade não é uma coisa fácil. Contudo, cria “condições reais para o desenvolvimento dos estados soberanos”. Ele acrescentou que a cooperação militar não apenas garante um ambiente seguro para o desenvolvimento econômico, como também constrói previsibilidade e confiança entre os países.

I congresso antifascista internacional

Em outro evento em paralelo, o I Congresso Antifascista Internacional, Shoigu chamou de “reminiscência da política nazista” a proposição em debate de proibir todos os cidadãos russos de entrar nos países da União Europeia.

“Hoje estamos testemunhando outra manifestação vívida da política nazista, quando a ideia russofóbica de proibir todos os cidadãos russos de entrar nos países da UE está sendo ativamente promovida pelos mais altos tribunos europeus”, ele denunciou no sábado (20).

Shoigu destacou que os princípios fundamentais da ordem mundial e as avaliações jurídicas e políticas do Tribunal de Nuremberg são cada vez mais ignoradas e revisadas por diferentes países, em particular, os governos bálticos.

“Na Estônia e na Letônia, as marchas dos legionários da SS se tornaram tradicionais, monumentos e obeliscos estão sendo erguidos para criminosos de guerra. Slogans e apelos nazistas são ouvidos abertamente nas ruas das cidades lituanas”, indignou-se Shoigu.

O ministro também enfatizou que a principal razão do conflito armado na Ucrânia reside no fato de que muitos de seus habitantes simplesmente não aceitaram a política das autoridades ultranacionalistas em Kiev que visava reabilitar o colaboracionismo nazista e incitar o ódio a tudo relacionado à Rússia.

“Incluindo os moradores de Donbass, que não apoiavam o regime dominante em suas aspirações nazistas. Então, uma operação de punição brutal foi lançada contra eles”, disse Shoigu.

Ele destacou que esses eventos feriram a memória histórica dos russos, já que a agressão da Alemanha nazista contra a União Soviética foi uma guerra de aniquilação total que custou a vida de 27 milhões de pessoas. Nenhum outro país no mundo pagou tal preço pela vitória.

Além disso, destacou que “as lições da história foram mal aprendidas por aqueles que, confiando em seu próprio poder, cometem atos de violência”.

“O bombardeio da Iugoslávia, as guerras no Afeganistão, Iraque e Líbia, a promoção de estruturas terroristas na Síria. Esses e outros crimes semelhantes sempre têm iniciadores e perpetradores. A responsabilidade por essas ações e suas consequências é inteiramente dos líderes dos Estados Unidos e da OTAN”, concluiu.

O I Congresso Internacional Antifascista visa “oferecer uma plataforma para defender a verdade histórica sobre a contribuição decisiva da URSS na derrota do fascismo durante a Segunda Guerra Mundial, bem como resistir à propagação da ideologia nazista”, sublinhou o portal Sputnik.

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