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A luta antirracista deve estar vinculada a um projeto nacional de desenvolvimento, perpassando todo o projeto, como componente de todas as iniciativas, na opinião do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), que participou do painel “A perspectiva antirracista em um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento”, durante o seminário “Luta antirracista, democracia e desenvolvimento nacional”. “O Brasil retomando a sua reconstrução, como imagino, com o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva à frente em 2023, vai nos exigir termos o olhar negro em todas as esferas”, observou.

O parlamentar destacou que um tema caro para o PCdoB é que o debate sobre a democracia seja vinculado à superação do racismo, ao lado de acesso a direitos e representação política. “Temos de nos orgulhar de uma mulher negra na presidência do partido porque não temos a justa expressão do que correspondem os negros na sociedade nos planos da economia e da política. Não há presença negra nas chapas de governador e de senador”, apontou.

Orlando Silva

Para o deputado federal, o tema deve ser tratado com objetividade, a exemplo das mulheres cuja experiência da luta levou à paridade de gênero. “O nosso desafio é refletirmos sobre o que fazer para a maior presença negra na política. E pode ser defender cota de 30% de negros, porque tem que haver uma proposta objetiva. Somos 21 negros no Parlamento. Neste ritmo, vamos levar mais 100 anos. Sinto que carecemos de mais expressão na política”, pontuou. “Um projeto nacional de desenvolvimento do Brasil exige a superação dessa nossa sub-representação na política, que ganha contorno mais importante na Era Bolsonaro, com o governante racista que faz declarações racistas. Temos de ser protagonistas”, ressaltou.

Orlando Silva lembrou as desigualdades econômicas verificadas nos recortes de raça e gênero. “Não é possível que há anos os estudos do IPEA mostrem a diferença da renda do trabalho entre homem branco e homem negro, e entre mulher branca e mulher negra. Entre homem branco e mulher negra é abissal, é de algumas vezes o salário. Isso exige uma intervenção”, defendeu. “A proposta do PCdoB em um projeto nacional de desenvolvimento é apresentar esta linha que atravessa todos os temas com a ótica de classe, gênero e raça”, acrescentou o deputado federal, recordando que o partido iniciou um processo de construção nesta questão nas discussões que marcaram os 500 anos do Brasil.

A presidenta nacional da UNEGRO, Ângela Guimarães, também destacou a importância do entrelaçamento de classe, gênero e raça em fóruns de discussões do partido, como o último congresso nacional. “É importante continuar fazendo o debate político de forma a disputar novas consciências, nos amalgamar ao povo, às massas, especialmente, àquelas que estão mais marginalizadas”, afirmou.

Angela Guimarães, presidenta da Unegro – reprodução internet

Ângela recordou que, historicamente, para parte da esquerda no Brasil, o racismo não tinha centralidade nas relações sociais e econômicas, com a crença de que ele apresentava no país forma mais branda do que nos EUA e na África do Sul. “Nós nomeamos como mito da democracia racial o que serviu de legitimação do projeto dos anos 1930 aos 1980, do salto desenvolvimentista no Brasil, que fez o país sair de nação agrícola para industrializada. Mas a nossa leitura é que esse processo se deu às custas da exclusão da maioria negra da população. Essa massa negra continua sendo excluída pelo estado e é hoje o principal alvo de uma agenda ultraliberal neofacista. É só pegar os dados da Covid, da fome e da exclusão no mundo do trabalho”, enumerou.

A presidenta nacional da UNEGRO destacou conquistas importantes nos anos dos governos Lula e Dilma para propiciar acesso a direitos a que a população negra não tinha tido oportunidades, como acesso à habitação com o programa Minha Casa, Minha Vida; à universidade e à emprego com carteira assinada. “Nós, da luta antirracista, defendemos uma agenda massiva de educação, trabalho, acesso a ciência e tecnologia, cultura e espaços de representação; ao tempo que defendemos essas políticas universais redistributivas, com políticas de reparação para população negra”, explicou. “Quando há um golpe midiático jurídico militar que afasta uma presidenta sem crime de responsabilidade e há desmonte dessas políticas, quando há precarização do mundo do trabalho, é a população negra que é a mais atingida”, apontou.

Ao mencionar os dados que mostram que 78% dos brasileiros assassinados no Brasil são jovens negros, Ângela frisou que o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento precisa avançar em relação ao genocídio negro. “Nós temos obrigação enquanto comunistas, vanguarda da classe trabalhadora, de não termos uma visão pueril do capitalismo do Brasil. A nossa agenda deve avançar, com um antirracismo ativo, um antipatriarcado ativo. É inadmissível darmos curso, batalharmos, derrotarmos Bolsonaro para voltarmos ao antigo estágio de genocídio”, considerou.

Edilson Silva

Na opinião do ex-deputado estadual e presidente da UNEGRO em Recife, Edilson Silva, a pauta da construção de um governo popular não pode ser capturada por estratégias de curto prazo que não levem em conta a forma estrutural do racismo. “O governo Bolsonaro estabelece para nós, a população negra, a necessidade de termos um recorte particular sobre a opressão, discriminação, que nossa população vive. Existe a necessidade de conjugar esse recorte para o que consideramos ser um projeto político para esse país. E o PCdoB tem colocado um papel importante nesse recorte”, afirmou.

Bruna Brelaz durante audiência na Câmara (Foto: Billy Boss/Câmara dos Deputados)

Para a presidenta da UNE, Bruna Brelaz, as ações afirmativas devem desempenhar papel relevante nesta nova agenda. “Queria parabenizar a inciativa do PCdoB para aprumar a luta antirracista, por um projeto nacional de desenvolvimento. Acredito que haja bandeiras muito importantes nesse processo. Sou presidenta da UNE e não há como não falar sobre educação: as cotas foram vitoriosas para que uma geração da família fosse a primeira a entrar para a universidade. Na luta para pensar no país, as cotas, além de serem políticas públicas de reparação histórica, são política estratégica para repensarmos o Brasil que queremos, uma vez que a universidade é instrumento importante para, por meio do ensino, da pesquisa e da extensão, repensarmos o país”, defendeu. “O povo brasileiro não tem o que comer, não tem emprego, não tem acesso à educação. Essa retomada de projeto será feita pela mobilização do nosso povo e o ex-presidente Lula tem colocado que nós, negros e negras, precisamos estar juntos na mesa para alcançarmos esse projeto”, continuou.

Gerson Pinheiro

Ao fazer um relato sobre a política de reparação que vem sendo realizada no estado, o secretário de Promoção da Igualdade Racial do Maranhão, Gerson Pinheiro, ressaltou a importância na construção desta agenda de haver a clareza de que o modelo cívico e cultural brasileiro se subordina à economia: “Há a necessidade de nós, comunistas, deixarmos claro que tudo isso é a serviço de uma elite que explora. Nos acusam de identitarismo quando tentamos trabalhar essa luta, que tem que estar ligada à luta econômica, porque o negro é quem é perseguido, quem está morando nos piores locais e é quem passa fome”.