Concentração em Camaguei em defesa da Revolução Cubana

Ao denunciar o bloqueio “intensificado em condições de pandemia” dos EUA contra Cuba – uma “perversidade manifesta” -, o presidente Miguel Díaz-Canel foi direto ao ponto da situação vivida agora pela pequena e altiva Ilha, enquanto o governo Biden se esmerava em declarações cínicas, quando há seis meses mantêm intactas as 243 criminosas sanções adicionadas por Trump exatamente para provocar escassez, apagões, crise sanitária e divisão.

Em qualquer tempo – longo tempo, seis décadas -, o bloqueio tem sido, como Díaz-Canel chamou, “injusto, criminoso e cruel” – mas seu agravamento em plena pandemia, uma que acontece uma vez em um século, contra um pequeno país, é muito mais odioso, muito mais injusto, muito mais criminoso, muito mais covarde.

O bloqueio – e seu agravamento na pandemia – é “uma política de crueldade contra uma pequena ilha que só aspira defender sua independência, sua soberania e a construir sua sociedade com autodeterminação”, segundo os princípios respaldados por “mais de 86% da população na aprovação da atual Constituição de Cuba”, registrou o presidente cubano.

Mas já que o repto foi lançado, Díaz-Canel convocou os revolucionários a “tomarem as ruas”, para esclarecerem a quem precisa e não dar refresco para as cabeças feitas em Miami.

“Paz e tranquilidade cidadã, respeito, solidariedade entre os compatriotas e para com os necessitados do mundo, salvando Cuba para continuar a construir, crescer, sonhar e alcançar a maior prosperidade possível. Essa é a nossa mensagem para o nosso povo”, sublinhou.

Infâmia

Como reiterou o ministro das Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodríguez, em 23 de junho – votação da Assembleia Geral da ONU repudiando as sanções – as medidas de Trump em vigor “moldam a conduta do atual governo dos Estados Unidos precisamente durante os meses em que Cuba experimentou as maiores taxas de infecção, o maior número de mortes e um maior custo econômico associado à pandemia de COVID-19”.

“Foi uma tentativa deliberada, cruel e oportunista de aproveitar as condições de uma pandemia para tentar estrangular nossa economia”, com o objetivo de “gerar desordem, instabilidade e fraturar a ordem constitucional e o consenso social” em Cuba, ele repetiu na terça-feira (13).

Em relação às declarações do presidente Biden após os protestos, Rodriguez destacou que “é necessário muito cinismo para nos pedir que escutemos nosso povo, que é vítima da política do governo dos Estados Unidos”. Se é para “ouvir a voz do povo” porque os EUA não escutou todas as manifestações dos cubanos contra o bloqueio?, questionou.

Se o governo Biden tivesse “sincera preocupação” pelos cubanos – reiterou – deveria levantar o embargo ou, pelo menos “tomar decisões executivas que pudessem modificar substancialmente, sem a necessidade de votação legislativa, aspectos fundamentais do bloqueio, incluindo aqueles que mais causam os danos humanitários e os que mais afetam o enfrentamento da pandemia por parte de nossa nação”.

243 sanções adicionais

Ao endurecer o bloqueio, Trump visou perseguir financeiramente o setor energético, dificultando a importação do petróleo quase ao ponto do desabastecimento, para sufocar a economia cubana e provocar dissensões na população. O rótulo infame de ‘país patrocinador de terrorismo’, uma completa falsidade, serviu para tornar ainda mais rígidos os entraves ao uso por Cuba dos mecanismos normais de pagamento no intercâmbio comercial.

As 243 sanções visaram cortar fontes de receitas em divisas a Cuba, vetar as viagens de cubano-americanos e as remessas de dinheiro. “Urdiu-se um plano para desacreditar as brigadas médicas cubanas e as colaborações solidárias que presta Cuba, que por essa colaboração recebia uma parte importante de divisas”, assinalou Díaz-Canel. Com a pandemia, o turismo parou, agravando a falta de divisas.

O que provocou uma situação de desabastecimento, principalmente de alimentos, medicamentos, matérias-primas e insumos, levando à redução da capacidade de exportar, de investir e de desenvolver bens e serviços. A isso se juntou aos problemas acumulados desde o período especial.

Faltam 20 milhões de seringas

Agora mesmo, a entidade Global Health Partners denunciou a escassez de seringas para a campanha de imunização em Cuba, apesar de a Ilha ter conseguido desenvolver cinco vacinas, com duas já aprovadas. “Cuba precisa de cerca de 30 milhões de seringas para sua campanha de vacinação em massa de Covid e estão com falta de 20 milhões”, alertou a GHP.

Grande parte dos fabricantes de seringas no mundo, segundo a GHP, está incursa nas sanções, por algum tipo de laço com os EUA e, portanto, proibida de exportar seringas para Cuba.

A questão do sofrimento acarretado pelo agravamento das sanções contra Cuba em plena pandemia já havia sido apontada em carta aberta, em abril de 2020, por sete relatores especiais de direitos das Nações Unidas.

“Na emergência da pandemia”, escreveram eles, “a falta de vontade do governo dos Estados Unidos em suspender as sanções pode levar a um risco maior de tal sofrimento em Cuba e outros países visados por suas sanções”. Riscos “ao direito à vida, à saúde e a outros direitos críticos das camadas mais vulneráveis da população cubana”.

No dia 21 de maio último, o governo cubano já havia assinalado que Biden “não tinha se movido um milímetro” em relação às sanções a Cuba desde sua chegada à Casa Branca.

Hipocrisia

Também é de suma hipocrisia tentar difamar o governo cubano em sua ação contra a Covid-19. Com 12,39 mortes por 100.000 habitantes, Cuba tem um desempenho muito melhor que os EUA (185 óbitos por 100.000), Colômbia (222 por 100.000) ou Peru (605 por 100.000). Bélgica e a Suécia, de população semelhante à de Cuba, tiveram respectivamente 10 e 20 vezes mais mortos por Covid.

Com a chegada das cepas mais agressivas, o sistema de saúde cubano, sob as penosas condições do bloqueio, não conseguiu dar mais conta, e a necessidade de manter centros de tratamento intensivo funcionando acabou tendo reflexo no aumento de apagões.

Como revelou Díaz-Canel, com “mais pacientes, há mais consumo de remédios, e também nossas reservas de remédios estão acabando, as possibilidades de adquiri-los são muito difíceis”. “Agora temos que passar à experiência da internação domiciliar devido à falta de capacidade em um grupo de províncias, e tivemos que convocar as famílias para que tenham uma participação mais direta e responsável”.

“Não poupamos recursos para enfrentar o COVID-19”, disse em 12 de julho o ministro da Economia e do Planejamento, Alejandro Gil Fernández. “Aqueles com COVID-19 são internados em hospitais, onde o tratamento custa ao país US$ 180 por dia; se o paciente precisar de cuidados intensivos, o custo por dia é de $550. Ninguém paga um centavo pelo tratamento”, acrescentou.

Memorando

Logo após a vitória da revolução, um subsecretário de Estado Adjunto fez um memorando secreto ao então presidente Eisenhower sobre o que deveria ser feito. “A única forma previsível de reduzir o apoio interno (refere-se a Fidel e a Revolução) é através do desencanto e da insatisfação decorrentes do mal-estar econômico e das dificuldades materiais … todos os meios possíveis devem ser usados rapidamente para enfraquecer a vida econômica de Cuba … Uma linha de ação que, sendo a mais habilidosa e discreta possível, consiga o maior progresso na privação de Cuba de dinheiro e suprimentos, para reduzir seus recursos financeiros e salários reais, causar fome, desespero e derrubada do Governo», diz textualmente.

Pelo descrito, o memorando continua na ativa. A pandemia agravou problemas antigos, que acabam tendo de ser enfrentados em uma quadra mais difícil, diante da falta de divisas, como a unificação do câmbio (Cuba tinha duas moedas desde 2004). O peso cubano ‘conversível’ foi abolido, o que afeta principalmente os trabalhadores autônomos, já os mais atingidos pelo estancamento do turismo sob a pandemia.

O prazo de troca das notas conversíveis terminou em 30 de junho. Foi estabelecida uma relação de 24 para 1 na troca. Também foram cortados subsídios e aumentados salários e aposentadorias, como compensação.

Corredor humanitário

Com tantos países tendo um desempenho diante da pandemia substancialmente pior do que Cuba, chamou a atenção por que foi exatamente a Ilha que foi brindada com a convocatória, pelas redes sociais, da instalação de um “corredor humanitário” para “socorrer as vítimas da pandemia”, sob a hashtag #SOSCuba.

Aliás, o último “corredor humanitário” na América Latina de que se teve notícia foi um proposto pelo autonomeado Guaidó na Venezuela, e deu chabú. Antes, na década de 1990, andou na moda o “imperialismo humanitário”, o “R2P”. Tais pressões foram rechaçadas imediatamente pelo governo cubano, com apoio da Rússia, China e México.

Segundo denúncia do chanceler cubano, a primeira convocatória do #SOSCuba apareceu uma semana antes da votação contra o bloqueio na Assembleia Geral da ONU. A campanha Intervenção Humanitária em Cuba foi lançada no Twitter no dia 5 de julho.

Malecón egípcio

No afã de reverberar os “acontecimentos em Cuba”, pesos pesados da mídia oficial passaram por vexames. O Guardian publicou uma foto de manifestação a favor da revolução cubana em Havana, como se fosse dos contras. Acabou tendo que carimbar a ‘falha nossa’.

A CNN ilustrou uma matéria sobre o palpitante assunto com uma foto de um ato da máfia cubano-americana em Miami, sugerindo que fosse na Ilha. Por azar, era visível um elemento com um boné MAGA do Trump, além do SOSCuba, e as redes não perdoaram.

Também: uma foto de multidão no Obelisco em Buenos Aires virou “Havana”. Outra, no Egito, foi transmutada para “Malecón”.

Mas há coisas graves no ar. A exortação a atos violentos de parte de certos círculos. Com os robôs funcionando a toda carga, começaram a surgir convocatórias para “ir aos botes”, prometendo que barcos norte-americanos estariam a postos para recolher os balseiros, o que já foi desmentido pelo Homeland.