Satélite geoestacionário que integra o sistema chinês de comunicações- foto ThinkStock

Uma equipe de cientistas chineses anunciou na segunda-feira(15) ter conseguido realizar a primeira transmissão simultânea de uma mensagem criptografada com base em tecnologia quântica, enviada de um satélite espacial para dois telescópios terrestres separados por 1.120 quilômetros, distância dez vezes superior a alcançada até então.

Pulsos derivados de partículas subatômicas e movimentos ondulatórios a elas entrelaçados, os fenômenos quânticos têm efeitos significativos no mundo visível.

Os chineses partem de enlaces entre partículas que reproduzem movimentos paritários praticamente instantâneos mesmo se estiverem separadas por bilhões de quilômetros.

Como esclareceram os cientistas, caso alguém tente observar tais partículas durante sua transmissão, a própria observação muda seu estado permitindo a ruptura do entrelaçamento e a denúncia da tentativa de invasão.

Segundo os cientistas, é isso o que possibilita a criação de um sistema de comunicação teoricamente impossível de ser violado ou hackeado, uma vez que a mera observação por parte do espião já destruirá a mensagem.

No estudo publicado na revista Nature, os cientistas chineses detalham a transmissão de uma chave secreta escrita com pares das partículas de luz (fótons) entrelaçadas. Emitidos pelo satélite geoestacionário Micius, os fótons orbitam a 500 quilômetros da Terra, para duas instalações terrestres construídas exatamente para essa finalidade nas cidades de Delingha e Nanshan, separadas por 1.120 quilômetros.

A inovação com raios de fótons supera os sistemas de comunicação via fibras óticas tanto em velocidade como em manutenção da fidelidade da transmissão. As fibras exigem estações repetidoras a cada 100 ou 150 quilômetros, aproximadamente. As limitações dos sistemas atualmente existentes permitem o hackeamento.

No método atualmente lançado, cada bit de informação é codificado usando dois fótons entrelaçados. Desta vez, os chineses mostram a transmissão segura de uma chave secreta de 372 bits. A chave pode depois ser usada para decifrar uma mensagem criptografada que pode ser transmitida por qualquer outro meio, incluindo Internet e telefonia.

“Nosso trabalho lança as bases para uma rede global de comunicação quântica”, destacam os pesquisadores, valorizando também a segurança, uma vez que a velocidade chega a ser 100 bilhões de vezes às da fibra óptica terrestre.

Especialista em comunicação quântica do Conselho Superior de Pesquisa Científica (CSIC), da Espanha, Juan José García-Ripoll destaca que “ninguém conseguiu fazer isso a uma distância tão grande”. “Este não é um protocolo novo, mas conseguiram algo único do ponto de vista técnico. A China está à frente neste campo”, sublinhou.

O país asiático vem há anos investindo pesado em novas tecnologias de comunicação quântica, tanto espaciais como terrestres. Neste último período já havia conseguido conectar Pequim e Xangai com uma rede para a transmissão de chaves quânticas. Além disso, tinha batido sucessivos recordes em comunicação espacial, como a transmissão em 2017 de uma chave quântica que permitiu manter uma teleconferência não passível de ser hackeada entre Viena e Pequim, a mais de 7.000 quilômetros de distância, também usando o satélite Micius.

“A diferença é que, neste caso, o satélite agiu como uma caixa-forte que guarda a chave enquanto se move do ponto A para o B e, durante esse período, é vulnerável à espionagem”, declarou Valerio Pruneri, pesquisador do Instituto de Ciências Fotônicas, em Barcelona. Conforme Pruneri, “esta ainda é uma corrida científica, mas está cada vez mais claro que cada continente precisa ter sua própria rede, não pode depender de outros para adquiri-la”. “É uma boa notícia que a China conseguiu isso porque mostra a viabilidade tecnológica. Isso deve pressionar a Europa a desenvolver sua própria rede com tecnologia própria”, assinalou.