Audálio Dantas

A primeira vez que fui à sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, foi em maio de 1975, na posse de Audálio Dantas na presidência da entidade.

Por José Carlos Ruy*

Eu ainda não era jornalista, mas minha turma acompanhava a luta política travada contra a censura e pela liberdade de imprensa, uma dimensão importante da resistência contra a ditadura. Luta em que Audálio Dantas se destacava desde pelo menos 1967, quando esteve à frente dos protestos contra a censura.

Por uma coincidência cruel, irei novamente hoje (31 de maio) à sede do sindicato, para a última homenagem a esse jornalista que foi um paladino da luta pelos direitos humanos e pelas liberdades democráticas, e que ontem (30), deixou a vida, levado por um câncer. Viveu 88 anos de uma vida dedicada à arte de escrever, e a defesa da liberdade para ela.

Audálio, que se tornou jornalista em 1954, admirava Jorge Amado, Rachel de Queiroz e principalmente seu conterrâneo Graciliano Ramos. Admiração que o animou a tornar-se o jornalista e escritor notável que foi. Jornalismo que o levou, em 1958, à descoberta de outra grande escritora, Carolina Maria de Jesus – naquela que o próprio Audálio considerou, certa ocasião, a principal reportagem que fez em toda sua vida.


Audálio Dantas e Carolina de Jesus (Foto: Arquivo Ruth de Souza)

Pode haver controvérsia a respeito. Afinal, ele encabeçou também, em outubro de1975, o protesto e a denúncia dos jornalistas e democratas de São Paulo contra o assassinato, sob torturas, no DOI-CODI, do jornalista Vladimir Herzog. Protesto que encabeçou, ao lado de outro democrata gigante e corajoso, dirigente da luta contra a ditadura, o cardeal D. Paulo Evaristo Arns.

Audálio viveu no coração da imprensa brasileira. Foi repórter, redator, editor, na Folha da Manhã (que mais tarde virou Folha de S. Paulo), nas revistas O Cruzeiro, Quatro Rodas, Veja, Realidade, Manchete, Nova e vai por aí. Em 1978, depois da experiência de dirigente sindical, foi eleito deputado federal pelo oposicionista MDB. Escreveu alguns livros importantes – Graciliano Ramos (2005), sobre a infância do escritor que admirava; O Menino Lula (2009), em que o personagem é o ex-presidente menino; A Infância de Ziraldo (2012), que conta outra história cheia de aventuras; As Duas Guerras de Vlado Herzog: da perseguição nazista na Europa à morte sob tortura no Brasil (2012): a saga que foi a fuga do nazismo da família Herzog e a história de seu filho célebre, Vladimir, assassinado na tortura por semelhantes algozes no DOI CODI, em São Paulo. Outro livro foi publicado em 2012, é uma antologia de jornalismo: O Tempo de Reportagem: histórias que marcaram época jornalismo brasileiro.

O Brasil e a luta pela democracia em nosso país perderam ontem um dos seus símbolos e inspiradores, o jornalista e escritor que se atribuiu a tarefa de descrever os acontecimentos com a marca da literatura – o jornalista com alma de poeta Audálio Dantas.

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*Jornalista, escritor, estudioso de história e do pensamento marxista.

 

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