Foto: José Paulo Lacerda/CNI

O primeiro Relatório de Transparência Salarial já publicado no Brasil pelo Governo Federal, com recorte de gênero e raça, lançado nesta segunda-feira (25), confirma a diferença entre homens e mulheres (negras e não negras) no mercado de trabalho quando o assunto é a remuneração. Segundo o levantamento, elas recebem 19,4% a menos do que eles. Em cargos de dirigentes e gerentes, a diferença chega a 25,2%.

Quando considerado o aspecto racial, o relatório aponta que as mulheres negras, além de estarem em menor número no mercado de trabalho, também recebem menos do que as não negras. Enquanto a remuneração média da mulher negra é de R$ 3.040,89, a da não negra é de R$ 4.552,45, diferença de 49,7%. No caso dos homens, os negros recebem em média R$ 3.843,74 e os não negros, R$ 5.718,40, o equivalente a 48,77%.

O documento, elaborado pelos ministérios das Mulheres e do Trabalho e Emprego, resulta da exigência do envio de dados em atendimento à Lei 14.611, que dispõe sobre a igualdade salarial e critérios remuneratórios entre mulheres e homens e foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em julho de 2023.

Ao todo, 49.587 empresas com 100 ou mais funcionários no Brasil — perfil exigido por lei — responderam ao questionário e apresentaram os dados. Destas, 73% têm dez anos ou mais de existência. Juntas, elas somam quase 17,7 milhões de empregados. 

Outro ponto trazido pelo relatório diz respeito às políticas efetivas de incentivo à contratação de mulheres pelas empresas, como flexibilização do regime de trabalho para apoio à parentalidade, entre outros critérios vistos como de incentivo à entrada, permanência e ascensão profissional feminina. 

Segundo o documento, 51,6% das empresas possuem planos de cargos e salários; 38,3% adotam políticas para promoção de mulheres a cargos de direção e gerência; 32,6% têm políticas de apoio à contratação de mulheres; e 26,4% adotam incentivos para contratação de mulheres negras.

Do total, apenas 20,6% possuem políticas de incentivo à contratação de mulheres LGBTQIAP+, 23,3% incentivam o ingresso de mulheres com deficiência, e apenas 5,4% têm programas específicos de incentivo à contratação de mulheres vítimas de violência. Poucas empresas ainda adotam políticas como licença maternidade/paternidade estendida (17,7%) e auxílio-creche (21,4%).

Quanto às diferenças regionais, o relatório aponta que o Piauí tem a menor desigualdade salarial entre homens e mulheres: elas recebem 6,3% a menos do que eles, em um universo de 323 empresas, que totalizam 96.817 ocupados. A remuneração média é de R$ 2.845,85.

Na sequência aparecem Sergipe e Distrito Federal, com elas recebendo 7,1% e 8% menos do que os homens, respectivamente. Em Sergipe, a remuneração média é de 2.975,77. No DF é a maior do país: R$ 6.326,24.

A maior desigualdade salarial no Brasil ocorre no Espírito Santo, onde as mulheres recebem 35,1% menos do que os homens. Na sequência dos estados mais desiguais, aparecem Paraná (66,2%), Mato Grosso do Sul (67,4%) e Mato Grosso (68,6%).

Combate às desigualdades

Embora a isonomia salarial esteja prevista na Constituição, na CLT (Consolidação das Leis de Trabalho) e em ratificação de convenções da OIT (Organização Internacional do Trabalho), das quais o Brasil é signatário, a desigualdade ainda é uma dura realidade. A Lei 14.611, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 3 de julho de 2023 após muita luta das mulheres, busca reforçar os mecanismos de combate a essa desigualdade.

Como forma de esclarecer como a lei funciona, tanto para trabalhadores quanto para empresários, os dois ministérios também lançaram, nesta segunda-feira (25), a cartilha “Tira-Dúvidas: Lei da Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens”. 

Conforme destaca a publicação, as desigualdades de gênero “são frutos de práticas discriminatórias e da divisão sexual do trabalho que atribui às mulheres o trabalho de reprodução (cuidado com a casa e cuidado com as pessoas dependentes) e desvaloriza o seu papel na atividade econômica remunerada”. 

E lembra, ainda, que “as mulheres também enfrentam mais dificuldades para ingressar e se manter no mercado de trabalho. O desemprego entre as mulheres é o dobro do desemprego masculino, elas são maioria entre as pessoas que estão fora da força de trabalho e o tempo de permanência na busca por trabalho é superior ao dos homens. Para as mulheres com filhos e chefes de família, os desafios se multiplicam porque muitas vezes não contam com serviços públicos de cuidado, e as ausências para levar filhos ao médico ou a escola não encontra compartilhamento”. 

Disparidades no trabalho

A desigualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho vai além da questão salarial. O avanço da situação econômica do país também vem se refletindo positivamente na vida das brasileiras — entre os quartos trimestres de 2022 e de 2023, a taxa de desemprego feminino diminuiu de 9,8% para 9,2% —, mas, ainda assim, elas representam a maioria dentre os desempregados, 54,3%, das quais 35,5% eram negras e 18,9%, não negras, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos). 

Além disso, de acordo com pesquisa realizada pelo Infojobs e divulgada pelo G1, oito em cada dez mulheres vivem dupla jornada de trabalho com afazeres domésticos e cuidados e 45% não contam com rede de apoio ou ajuda de parceiros.

Cabe destacar, ainda, que outro levantamento do Dieese revela que as mulheres representam 90,6 milhões da força de trabalho em potencial no Brasil, das quais 47,8 milhões estão efetivamente neste universo e 42,8 milhões estão fora. 

Para se ter uma ideia, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2022, pouco mais de 53% das mulheres participavam da força de trabalho, contra 73% dos homens, reflexo da estrutura patriarcal que ainda determina para a parcela feminina um lugar fora do mercado, ligado aos cuidados com a casa e a família. 

Com informações do Ministério das Mulheres e MTE