Publicado originalmente em 30/09/2003

É hora dos Comitês Municipais realizarem suas Conferências, com vistas à fase estadual. As orientações que eles vão assumir e as deliberações que vão adotar, serão o elo decisivo do impulso do PCdoB no período dos próximos dois anos.

Por Walter Sorrentino*

O debate da 9a. Conferência Nacional repôs, para as novas condições em que atuamos, orientações definidas para pautar o esforço de dotar os Comitês Municipais do PCdoB de maior capacidade para dirigir a atividade do Partido. O documento alcançou forte consenso, expresso no fato de que todos os Estados se apropriaram de suas formulações para direcionar o esforço de Conferência. Particularmente, ressaltou a compreensão de que vivemos um novo período estratégico da vida do Partido que exige o desenvolvimento de novas linhas de acumulação de forças.

Recolhemos para isso as experiências de quatro planos de estruturação partidária, aplicados nos últimos 5 anos. Falamos centralmente que o processo de estruturação partidária tem dimensão política, ideológica e organizativa. A política como vetor impulsionador, a ideologia como fator aglutinador, a organização como fator que materializa a força dos comunistas. Ao longo desses planos, perseguimos como um dos objetivos centrais uma base comunista mais forte e estruturada, sobretudo entre os trabalhadores e a juventude, tendo por centro a consolidação dos Comitês Municipais, sobretudo nas cidades com mais de 100 mil habitantes. Eles são 227 em todo o país, entre os quais o Partido está estruturado em 185 deles. Como se vê, estabeleceu-se um claro eixo e alvo nessa matéria, configurando um objetivo mais perene e duradouro de nossa direção organizativa. Isto é importante de se compreender – trata-se de um processo estratégico, que não se alcança em curto prazo, mas precisa ser perseguido a partir de cada situação concreta, agarrando os elos da cadeia que podem dar maior força ao PCdoB.

As presentes conferências municipais colocam condições para um passo extraordinário nessa direção. O Partido cresce em todo o país, possivelmente na que é a maior onda de crescimento vivida pela nossa geração militante, em qualidade e extensão. Sobressai-se o ingresso de numerosos quadros da luta política e social, não só nos médios e pequenos municípios, mas em quase todas as capitais e em numerosos grandes municípios de regiões metropolitanas. Vão para uma perto de uma centena os novos vereadores que ingressam, somando-se aos 150 eleitos em 2000; comparecem também vários prefeitos e ex-prefeitos, vice-prefeitos, deputados eleitos ou suplentes, além de lideranças expressivas em variados campos de ação. Uma base mais extensa e numerosa significa maiores exigências para a atividade de direção, mas também maiores possibilidades de dar um salto no processo de direção, pela maior disponibilidade de quadros. Por isso, precisamos acertar os eixos que definem a construção das novas direções municipais.

A Resolução da 9a. Conferência Nacional fornece um conjunto de indicações bastante coerentes para isso. É imprescindível que suas formulações sejam re-estudadas, e norteiem o esforço em curso. Podemos dizer, em síntese, que a construção desse elo indispensável do fortalecimento partidário está atravessada por quatro vetores centrais.

O primeiro, o de situar a linha política da 9a. Conferência no ambiente concreto do município. Pôr a política no posto de comando será sempre o fator decisivo para constituir o papel protagonista do PCdoB e impulsionar seu crescimento. O PCdoB ocupa determinado lugar político na sociedade, e isso precisa ser construído em cada município, à luz da política nacional. Isto é particularmente importante neste momento, pois se trata de re-posicionar o PCdoB, em condições mais favoráveis, diante do modificado quadro de forças. Por um lado, ampliou-se a base social de interesse na política de desenvolvimento de caráter democrático e progressista. Por outro, decorrência disso, ampliou-se o arco de forças com que o PCdoB pode relacionar-se, em sustentação do êxito do governo Lula. Aí a ciência e arte dos comunistas precisa ser posta em ação, palmilhando uma política ampla e firme no rumo de alianças, com uma justa definição de alvos e objetivos políticos. Mas, para além da sagacidade política, compreender também a exigência de ir ao encontro das sentidas aspirações populares, dando forte protagonismo ao papel do Partido no movimento social, politizando-o e elevando sua organização e mobilização. Ou seja, é preciso incorporar essa exigência como parte do reposicionamento político do Partido e como fator essencial do êxito tático. Isso tudo terá importantes efeitos para a batalha eleitoral de 2004, destinada a ser o vetor decisivo da afirmação do PCdoB como portador de um projeto consistente para o país e, portanto, alternativa política para um contingente ainda maior de forças militantes.

O segundo, é o de situar essa atuação política partidária com base no conhecimento aprofundado da situação econômico-social, política e cultural do município. O PCdoB precisa e quer mergulhar a fundo na realidade mais profunda de vida do povo. Precisa levar em conta todas e cada uma das características da vida e economia local, as relações de classe, as forças políticas, o movimento social, o impacto local do projeto nacional, as tradições próprias, como parte do enriquecimento da aplicação da política nacional do PCdoB. Trata-se, portanto, de dar novos passos num processo que é cumulativo, no sentido de conhecer essa realidade e construir um projeto de mais médio prazo para o PCdoB no município, com eixos estratégicos.

O terceiro, é de natureza ideológica. Precisa-se compreender que quanto mais amplo e numeroso é o Partido, mais se necessita de direção firme, coesa, capaz de pôr em movimento unitário o conjunto do Partido. Ao lado disso, já é madura nossa experiência no sentido de que tais direções são uma construção coletiva de todos os comunistas, à base de um projeto político coletivamente formulado. Direção é mandatária do coletivo, é eleita para cumprir esse projeto, zelar pela aplicação da linha partidária em todos os campos, e construir e defender a unidade partidária. E o coletivo, por sua vez, defende e zela por uma direção desse tipo, pondo-a acima dos interesses de projetos particulares de qualquer natureza. Essa a dialética determinante do sucesso de nosso trabalho.

Um PCdoB forte e numeroso não é um PCdoB frouxo, que abre mão de sua identidade, suas normas e princípios, de sua aspiração de ser um Partido organicamente coeso. A recente reunião do CC, que tratou das sanções aos que violaram as normas partidárias, é um importante exemplo dado pela direção nacional no sentido de permanência de valores e ética essenciais da condição de comunistas. Isso demonstra o quanto é importante termos direções que zelem pelo projeto comum. Quanto mais formos capazes de construir direções assim nos municípios, mais sólido será o crescimento partidário.

O quarto é o aspecto propriamente da composição e papel da direção municipal. Os comitês municipais, insistimos, são o elo chave deste momento para ampliar as bases do Partido, um de nossos principais e perenes desafios organizativos. Para cumprir seu papel se exige um coletivo organizado, ou seja, estruturado em bases partidárias ou comitês distritais, sem o que não aprofundaremos nossos laços com os trabalhadores e o povo onde se travam as relações de conflito social, político, cultural. É um antigo aprendizado: não dirigimos um coletivo amorfo, mas um coletivo organizado de comunistas!

Ao lado disso, é necessário assimilar que o processo de direção deve interelacionar a esfera política, ideológica e organizativa. Uma sem a outra não conduz ao amadurecimento da estruturação partidária. Por isso falamos de fortalecer o caráter orgânico (não apenas organizativo) do trabalho de direção, e falamos de planificar a nossa atuação fazendo interagir essas três dimensões.

Por último, a composição e funcionamento das direções precisam se adequar às novas exigências postas pelo crescimento. A 9a. Conferência Nacional fez formulações importantes sobre limitações e vícios a superar. Está demonstrado em nossa experiência que visões diluidoras da responsabilidade de direção, bem com visões estreitas e sectárias de relação entre os dirigentes ou entre estes e os militantes, estiolam o Partido, faz murchar a chama que impulsiona homens e mulheres militantes a se superar em suas vivências do cotidiano para se pôr a serviço de um projeto de nova sociedade. Portanto, há novos impulsos a levar em conta nesse terreno. Com fileiras partidárias mais extensas, onde estão presentes numerosas lideranças de inserção social, política, cultural e técnica expressivas, a composição do comitê poderá ser mais ampla e numerosa. Não se trata de conferir caráter federativo a essa composição, mas alargar sua representatividade. Por outro lado, isso não deve levar a comprometer a eficácia do processo de direção, para o que se exige consolidar a instituição de comissões políticas – cuja composição expresse a capacidade de implementar o projeto coletivo – e, no seio delas, ser mais conseqüente com a exigência de um corpo de quadros mais permanente capaz de maior dedicação ao trabalho concreto de direção e estruturação partidária nas indispensáveis frentes internas e de ação de massas. Falamos portanto em renovação de práticas e vivências estratificadas, capaz de trazer novos contingentes ao trabalho de direção. É preciso superar, como se reitera na Resolução da 9a. Conferência, uma visão estreita de política de quadros, concentrando todo o trabalho executivo em um ou dois dirigentes “gerais”, bem como a limitada concepção de que só profissionalizados os quadros podem se dedicar ao trabalho orgânico de direção. Pelo contrário, se necessita de quadros de todos os tipos, regidos como uma orquestra no sentido de impulsionar o projeto definido. Em uma palavra, uma direção mais colegiada, capaz de integrar a experiência dos mais calejados, com o frescor dos novos militantes que vão sendo formados na senda da luta política de classes. Aos primeiros cabe a generosidade própria dos que são educadores; aos segundos, o impulso por superar limites na prolongada batalha por um PCdoB forte. 

Nisso reside então a importância do processo destinado a eleger as novas direções municipais. Um Partido com maior musculatura militante só é possível se estiver centrado em direções municipais capazes, coesas e representativas.

Publicado em 30-9-2003