Ministro da Educação, Abraham Weintraub.

Abraham Weintraub afirmou na segunda-feira (7) que “é difícil ter um bom encanador passando fome ou na fila do Bolsa Família” ao criticar o ensino superior no Brasil. Segundo o ministro da Educação de Bolsonar, o país “está cheio de doutor sem emprego” e, pouco depois chamou os pesquisadores brasileiros de “intelectualóides”.
Nas palavras de Weintraub: “A escola pode ensinar um ofício. Aí vem o preconceito desses ’intelectualóides’ que acham que escola técnica não é boa porque ensina ofício. Tem que ser doutor. Está cheio de doutor sem emprego, mas é difícil ter um bom encanador passando fome ou na fila do Bolsa Família. É difícil um eletricista, um técnico bom, que não consegue se virar”.
Além de ser um ataque rasteiro à ciência e ao ensino superior, o discurso do Ministro não é verdadeiro. O Brasil registrou 12,6 milhões de desempregados no trimestre encerrado em agosto, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Em setembro, o IBGE divulgou dados auferidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD-Contínua) onde mostra que o mercado informal no Brasil, bateu recorde histórico em agosto.
Ao todo, 41,1% da população que se declarou ocupada trabalha sem carteira assinada e, portanto, sem renda fixa e sem direitos. Em números, essa taxa representa 38,8 milhões de pessoas. É a maior proporção desde 2016, em plena recessão.
O número de empregados sem carteira assinada bateu novo recorde: 11,8 milhões de brasileiros, um aumento de 3,6% sobre o trimestre anterior (mais 411 mil pessoas) e 5,9% sobre frente ao trimestre de 2018.
Os que se declaram trabalhadores por conta própria, onde se enquadram os ambulantes, motoristas de aplicativos e quem vive de biscates, o crescimento em relação mesmo trimestre do ano passado foi de 4,7%, ou mais de 1,1 milhão de pessoas. Mais um recorde: 24,3 milhões de brasileiros vivendo de “bico”.
Como podemos ver, nem todo mundo conseguiu virar encanador, muito menos fazer disso um emprego formal com as garantias de direito do trabalhador.
Tanto não é verídica sua afirmação, que ele mesmo não optou por um ofício técnico para ganhar a vida. Antes de se tornar ministro, Weintraub cursou Economia na USP, seguiu carreira acadêmica, foi professor universitário e se envolveu com o mercado financeiro. Porque será que ele não optou em tornar-se encanador?
As declarações de Weintraub foram dadas por conta de um programa para incentivar o ensino técnico no Brasil. O “Novos Caminhos”, como foi batizado, promete aumentar em 1,2 milhão as vagas do ensino técnico, mas não apresenta qualquer referência de que estes cursos serão ofertados pela rede de Institutos Federais de Ensino Técnico, reconhecida pela qualidade dos cursos oferecidos.
Segundo órgãos de imprensa que acompanharam o lançamento do projeto, o “Novos Caminhos” tem os mesmos moldes do Pronatec, de Dilma Rousseff (PT) que, ao invés de investir no ensino público, pagava universidades privadas por vagas em cursos como “massoterapeuta”, “dj” e “churrasqueiro”, todos estes na modalidade de Ensino a Distância (EAD).
CORTES
Weintraub voltou a afirmar que a prioridade do governo Jair Bolsonaro (PSL) é a educação infantil e criticou as universidades federais, que já passaram por dois grandes contingenciamentos de verbas desde abril, num total de R$ 6,1 bilhões.
Na semana passada, o MEC anunciou a liberação de R$ 1,99 bilhão da pasta que será destinado, principalmente, para universidades e institutos federais. Porém, R$ 3,8 bilhões ainda seguem bloqueados.
“Tenho sofrido críticas porque falo que a Educação tem que ser prioritária para creches e pré-escola e não para universidade federal. Mas cada universidade federal dessas grandes custa mais de R$ 3 bilhões por ano. Com uma delas a gente põe todas as crianças na creche na pré-escola”, diz.
Outra mentira. De acordo com levantamento feito pelo G1, apenas uma universidade no Brasil teve orçamento na ordem de R$ 3 bilhões em 2019, que é a Universidade Federal do Rio de Janeiro. A universidade com o 10º maior orçamento tinha previsão de receber R$ 1,5 bilhão.
O ministro disse ainda que “é uma turma [das universidades federais] que recebia bilhões como se não houvesse amanhã e pede mais R$ 50 milhões, R$ 60 milhões, enquanto está faltando ônibus para crianças”.
Mas, a verdade é que Weintraub é contra as verbas para o ensino básico, para os institutos federais e para as universidades.
O ministro foi contra a proposta de aumentar a participação da União, de 10% para 40%, no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). A medida consta na PEC 15/2015, de relatoria da deputada Dorinha Seabra (DEM-TO).
O Fundeb é composto por recursos arrecadados por estados e municípios, e recebe uma complementação feita pela União de 10%. O fundo é hoje o principal mecanismo de financiamento da educação básica em todo país, que vai da creche ao ensino médio. Ele é ainda mais importante nos municípios de menor arrecadação e, portanto, mais pobres.
O ministro diz que quer tirar de um para investir em outro, mas tira de todos e não investe em nada.
Weintraub afirmou que manterá, no entanto, o mesmo orçamento para as universidades e institutos federais para o ano que vem.
Vale relembrar, como dito acima, R$ 3,8 bilhões do orçamento das universidades e institutos ainda seguem bloqueados.
Mesmo com a recomposição da totalidade da verba bloqueada, os R$ 6,1 bilhões, ainda não seria possível falar em investimento, ou em novas vagas na rede de institutos federais de cursos técnicos.
Por mais que Weintraub diga o contrário, a manutenção do orçamento para 2020 segue inviabilizando qualquer melhora na educação básica, no ensino técnico e no ensino superior brasileiro.
Para obter mais recursos, segundo o ministro, as universidades deverão recorrer ao Future-se, programa do MEC que pretende privatizar as instituições federais de ensino. A proposta ainda está em consulta pública, mas já foi recusada pelas principais universidades do país, pois fere a autonomia de gestão, e o principio constitucional da Educação pública e gratuita para todos.