Senado aprova multa a quem pagar salários menores às mulheres
O Senado aprovou, nesta terça-feira (30), o Projeto de Lei Complementar (PLC) 130/2011, que prevê multa para empresas que pagarem salários diferentes para homens e mulheres que exerçam a mesma função, combatendo a desigualdade salarial entre homens e mulheres.
De autoria do então deputado federal Marçal Filho (MDB-MS), o projeto teve relatoria do senador Paulo Paim (PT-RS) e foi aprovado por unanimidade, em votação simbólica, muito comemorada pelas senadoras. Elas afirmaram em seus discursos que a discrepância salarial entre homens e mulheres é uma discriminação vergonhosa, imoral e inconstitucional.
O projeto aguardava votação do Senado desde 2011, quando foi aprovado pela Câmara. Agora, vai à sanção da presidência da República e as mulheres sabem que precisam pressionar pela sanção para que a medida passe a vigorar.
O senador Paulo Paim diz que é importante ter mecanismos que ajudem a modificar a disparidade salarial entre homens e mulheres. Conforme afirmou à Agência Senado, o objetivo do projeto é “estabelecer um desincentivo monetário significativamente elevado, de modo a beneficiar a condição remuneratória feminina por meio de pena pecuniária que torne a discriminação antieconômica”.
Ao defender o projeto no Senado, Paim disse que a multa não é apenas para dar uma indicação, mas sim “demonstrar todo o peso da reprovação social ao empregador infrator. Naturalmente, temos consciência de que a discrepância salarial de gênero tem profundas raízes sociais e culturais e que a mudança legislativa é incapaz, individualmente considerada, de eliminá-la. No entanto, nessa luta da mais elevada Justiça, qualquer contribuição positiva é válida”, conclui Paulo Paim em seu relatório.
Disparidade histórica
A proposta aprovada altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), acrescentando o parágrafo 3º ao artigo 401 da CLT, que determina “considerar sexo, idade, cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional importará ao empregador multa em favor da empregada correspondente a cinco vezes a diferença verificada em todo o período da contratação”.
Historicamente, as mulheres sempre receberam salários menores para as mesmas funções, mesmo isso sendo vedado pela Constituição de 1988. “A inclusão da multa é uma forma de municiar a trabalhadora de uma proteção legal para que ela possa ingressar na Justiça pleiteando seu direto e também de exigir a fiscalização pelo Ministério Público do Trabalho na medida em que houver denúncias contra as empresas”, afirma a secretária nacional da Mulher do PCdoB, Vanessa Grazziotin, que considera essa uma grande vitória das mulheres brasileiras.
Em 2019, as trabalhadoras receberam o equivalente a 77,7% dos salários dos homens, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A diferença é ainda maior em cargos de maior rendimento, como diretores e gerentes. Nesses grupos, as mulheres ganhavam apenas 61,9% do que recebiam os homens.
A desigualdade permanece no Brasil, apesar de mais mulheres terem diplomas de curso superior. Na faixa etária entre 25 e 34 anos, 25,1% das mulheres concluíram o nível superior e entre os homens o percentual é de 18,3%, uma diferença de 6,8 pontos percentuais.
Mesmo mais escolarizadas, as mulheres têm menos inserção no mercado de trabalho. Apenas 54,6% das mulheres de 25 a 49 anos, com filhos menores de três anos, estavam empregadas em 2019, enquanto os homens na mesma condição eram 89,2%. Quando não havia crianças nos lares, o nível de ocupação das mulheres aumentava para 67,4% e o dos homens, 83,4%. Entre as mulheres pretas e pardas com crianças de até três anos de idade o nível de ocupação era de apenas 49,7%.
Além da diferença salarial, a crise sanitária aumentou o desemprego entre as mulheres. Uma pesquisa publicada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que, entre o 3º trimestre de 2019 e o de 2020, cresceu em 8,6% o contingente de mulheres fora do mercado de trabalho. O número de mulheres empregadas, por sua vez, diminuiu 5,7 milhões no Brasil nesse mesmo período.
“Esses dados demonstram que há muito o que superar para que as mulheres possam exercer seus ofícios em condições de igualdade com os homens. A paridade salarial é uma grande vitória, mas ainda precisará de muita luta para que seja garantida na prática”, diz Vanessa Grazziotin.
Vitória das mulheres
Para a secretária da Mulher Trabalhadora da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Celina Arêas, a vitória foi muito importante para as mulheres e para a classe trabalhadora como um todo, principalmente no momento de dificuldades no mundo do trabalho, político e de crise sanitária. “Infelizmente, o direito que conquistamos em 88 não era respeitado porque não previa nenhuma multa. A inclusão da multa vai dificultar que a Constituição seja descumprida”, afirma. Celina diz que, agora, “é preciso pressionar para que o projeto seja sancionado, criando mecanismos que permitam fiscalizar as empresas para que a lei seja cumprida. Será um primeiro passo rumo à equidade salarial”. Ela pretende sugerir uma reunião extraordinária do Fórum Nacional de Mulheres das Centrais Sindicais que se reúne uma vez por mês para unificar a mobilização pela sanção da lei.
Glaucia Morelli, presidenta da Confederação das Mulheres do Brasil (CMB) também comemorou a aprovação do PLC no Senado. “ É um marco histórico na luta das mulheres brasileiras por salário igual para trabalho igual. Estamos rompendo com a naturalização da desvalorização do trabalho das mulheres. Nós, mulheres, ainda acumulamos mais lucros ao capital quando trabalhamos em casa nas tarefas domésticas, que deveriam ser custeadas pelo Estado através de infraestrutura pública e não são. Com isso, o Estado economiza e os empresários lucram ainda mais, tudo nas costas das mulheres. Mas nós estamos aqui para derrotar todas as coisas que criam injustiças e dificultam a humanidade de ir para a frente e o processo civilizatório ser mais respeitoso com o próprio ser humano, principalmente com as mulheres”, afirma.
Glaucia destaca que o PLC ficou na gaveta esse tempo todo por pressão dos empresários, mas que agora a luta está em outro patamar. “É preciso garantir a sanção e construirmos mecanismos de rigorosa fiscalização, fazendo alianças com o Ministério Público do Trabalho, com os sindicatos e as centrais sindicais, mobilizando as mulheres trabalhadoras e fazer valer a Lei”.
A presidenta da UBM diz que ainda pesa sobre as mulheres a cultura patriarcal que lhe atribui papel secundário na relação entre a maternidade e o trabalho. “Ser mãe é uma função social e deve receber do Estado iniciativas, via políticas públicas, que favoreçam a ampla participação das mulheres, sobretudo no mercado de trabalho”.
O presidente da República tem 15 dias para sancionar ou vetar o PLC 130/2011. Se sancionado, será publicado no Diário Oficial da União. Se vetado todo o projeto, volta para o Senado para análise dos vetos. Se vetado em parte, a parte sancionada é publicada e os vetos serão analisados pela Casa legislativa.
Por Guiomar Prates
(PL)