O 3o. Salão do Livro Político encerrou-se com a mesa Que fazer? Socialismo ou Barbárie?, no Tucarena, teatro da PUC paulistana. O encontro de Renato Rabelo (PCdoB), Ciro Gomes (PDT), Márcio Pochmann (PT) e Juliano Medeiros (Psol), representantes de quatro partidos de esquerda, com mediação de Rosane Borges, se deu no dia 8 de junho de 2017, coroando um debate sobre o ciclo de governos progressistas no Brasil e o golpe neoliberal que o país enfrenta.

Por Cezar Xavier, no Portal Mauricio Grabois

Após quatro dias de intensos debates e muito movimento nos estandes de editoras que apresentaram seus lançamentos! Acabou nesta quinta-feira (8), o 3º Salão do Livro Político.

Debate sobre os rumos da esquerda:

A necessidade de reconstrução de um projeto nacional protagonizado pela esquerda brasileira como única alternativa viável para superar a atual crise foi consenso entre os debatedores, além da luta essencial para a derrubada do governo Temer e da realização de eleições diretas.

De acordo com Juliano Medeiros (Psol), os processos de mudança mantiveram a concentração do poder econômico, e o golpe ocorrido em 2016 confirma o fim de um ciclo e da agenda política da esquerda que perdurou até ali. “Quando se iniciou com a Constituição de 1988, houve ampliação dos direitos sociais, mas prevaleceram a economia monopolista, financeirizada e subalterna do ponto de vista internacional. Com o fim do ciclo, a classe dominante criou uma frágil aliança e passou a implantar uma agenda de retrocessos, com as reformas”, avaliou. Para ele, o que está em jogo é a reestruturação da natureza do Estado brasileiro e a localização do Brasil na divisão internacional do trabalho.

“Os desafios da esquerda são a produção de um balanço de sua experiência à frente do governo federal e de um programa que contemple uma agenda política estratégica”. Medeiros sugere que as esquerdas têm de fazer um balanço critico dos anos de governo de esquerda, e construir um programa a partir dos limites e dos avanços, uma agenda política estratégica, e não simplesmente um programa partidário. “O último programa de desenvolvimento criado pela esquerda foi o Programa Democrático e Popular do PT, que já tem 30 anos. Precisamos atualiza-lo e incorporar a nova agenda política, superando racismo, machismo, por exemplo, que ainda identificamos na esquerda”.

Pochmann (PT) abordou em sua exposição o processo histórico brasileiro que resultou em uma sociedade extremamente desigual e lembrou que não necessariamente o caos que vivemos hoje significa ausência de horizonte. “A aceleração da mudança no Brasil foi produto do progresso técnico com base na expansão da riqueza, e a partir do conflito se originou o desenvolvimento social. A crise propicia mudanças históricas”, disse. E citou como exemplos duas grandes mudanças ocorridas no país: a dos anos 1880, que resultou no fim da monarquia e da escravidão, e a de 1930, que decretou o fim da sociedade agrária.

Marcio Pochmann enxerga a crise brasileira inserida na crise global do capitalismo deflagrada em 2008, que vem derrubando dramaticamente tanto os ativos financeiros quanto o comércio internacional. Internamente criou-se um caos que sinaliza o fim de um ciclo de desenvolvimento comparável ao que resultou no projeto de desenvolvimento de Getúlio Vargas, que fez o país dar um salto formidável, porém sem desbancar o poder agrário, apesar da imensa e rápida concentração urbana produzida no período. O que fazer? “A América Latina pode se transformar numa espécie de Oriente Médio. Ou seguir a perspectiva de globalização inclusiva, como fez a China. A saída não será uma saída tradicional”.

Renato Rabelo (PCdoB) falou sobre a importância da luta pelo socialismo no mundo atual e sobre a atualidade da teoria marxista. “Vivemos uma grande crise, pois a classe dominante sabotou o governo Dilma e assaltou o poder por meio de um golpe parlamentar. Passou a negar a Constituinte de 1988, e a destruir direitos. Segundo ele a greve geral ocorrida em abril foi política, supera as questões corporativas, e deve ser ainda mais forte no dia 30 de junho. “Nossa luta por eleição direta é para garantir 2018”, pontuou.

Renato Rabelo enxerga no golpe parlamentar o realinhamento do país pelos golpistas ao capitalismo internacional, que demandam a derrubada da Constituição Cidadã de 1988. Ele ressalta que a transição na base material de produção em todo o mundo, diante da crise econõmica, não será entendida se não considerarmos a penetração do seu impacto em todos os âmbitos, inclusive na práxis partidária. O rebaixamento na consciência de classe é também parte dessa transição em que revoluções industriais transformam as relações de trabalho.

“O debate de um novo projeto de país é fundamental e tem de considerar a luta tanto contra o neoliberalismo quanto contra o colonialismo. Daí pode emergir até um novo modelo de sociedade, inclusive um modelo socialista”. Rabelo considera o capitalismo superado, por aprofundar a desigualdade numa base material gigantesca que poderia estar a serviço da humanidade. O capitalismo só se mantém ideologicamente forçando sua persistência nas mentalidades, embora na base material não se sustente mais.

Como parte dos governos progressistas que estiveram no centro do poder, o PCdoB considera importante um balanço em que se entenda as ilusões que levaram a esquerda a não entender a composição do estado brasileiro. “Mas já vou dizendo que não é fácil fazer síntese para um balanço!” Criticou o fato do desenvolvimento brasileiro estar baseado em exportação de commodities. A primarização e a base de serviços sem uma indústria à altura é considerado por Rabelo um atraso.

O dirigente comunista observa que o debate sobre o programa nacional para o país só se dá durante as eleições presidenciais. Portanto, 2018 será muito importante para a esquerda mostrar seu programa em oposição ao que vem sendo implementado pelo golpe. Defende a bandeira das “Eleições Diretas, Já”, ou em 2018, mesmo acreditando que as perspectivas diante do golpismo não são animadoras.

Ciro Gomes  (PDT) considera que é preciso “recelebrar” a ideia de projeto nacional de desenvolvimento, mas pontua que isso fará emergir conflitos e antagonismos, já que é urgente enfrentar a pobreza , entre outras questões prementes, pois só se consegue redistribuir renda tirando de quem tem mais. Ele, por isso, reflete sobre o crescimento econômico, que relativiza essa tensão, reduzindo a pressão por retirada de direitos ( custos para o capital). Mas, para ele, o antigo modelo de produzir desenvolvimento com distribuição de renda morreu. “Vejo fecundidade nesse caos. Mas as coisas podem piorar muito se continuarmos a adiar eternamente a reflexão. Precisamos por um ponto final na apologia da ignorância. O mundo acadêmico precisa estar em linha, dar suporte a esse processo”.

Ciro Gomes afirmou que Brasil precisa assumir como objetivo nacional permanente a superação da miséria e sua sequelas. “O que faz um país se afirmar é empreender, trabalhar, produzir, ganhar renda, salário, educar os filhos, fortalecer a base sanitária da sociedade e andar sem medo nas ruas. Mas isso é o oposto do que está ocorrendo no Brasil”.

“Crescendo, essas tensões podem ser atenuadas, podemos até impor fissuras no grande pacto conservador do país dado o tamanho da tragédia. Uma delas é a gravíssima desindustrialização”.

 

Assista a íntegra do debate pela TV Boitempo: