Eric Garner foi estrangulado em via pública; policiais ignoraram seus 11 avisos de que não conseguia respirar

Cinco anos e um mês após o brutal e gratuito estrangulamento em via pública de Eric Garner, um camelô negro desarmado e que por 11 vezes pedira, suplicara que ‘não consigo respirar’, na segunda-feira (19) o Departamento de Polícia de Nova Iorque anunciou finalmente a demissão do policial assassino, Daniel Pantaleo, até aqui a única punição a ele.

Um júri de Staten Island e os promotores federais simplesmente o deixarem impune por meia década, apesar do golpe usado, o ‘mata-leão’, estrangulamento, estar banido da ação policial desde os anos 1990 em decorrência de assassinatos anteriores. Garner, de 43 anos, ganhava a vida vendendo cigarros na rua.

Logo após o anúncio, a filha de Garner, Esmerald Snipes, agradeceu ao mais que atrasado desligamento de Pantaleo e prometeu que “a luta ainda não acabou, vamos tentar reabrir o caso, vamos para cima dos demais policiais envolvidos, porque não acabou”.

Com toda a convicção que só uma filha que teve o pai morto da forma mais estúpida pode expressar, Esmerald acrescentou que “não quero outro Eric Garner. Farei tudo ao meu alcance para nunca mais ver outro Eric Garner”.

Há um mês atrás, quando se completaram cinco anos do assassinato de seu pai, na manifestação que cobrava o fim da impunidade e a imediata demissão de Pantaleo, Esmerald lembrara como sua irmã, Erica, de 27 anos, morrera lutando por justiça para Eric Garner, em 2017. Luta da qual a família nunca abriu mão – Erica, Esmerald, a viúva Esaw e a mãe de Eric Garner, Gwen Carr.

Ali, diante de um tribunal, a filha de Garner exigira que Pantaleo, o policial assassino, fosse demitido. “Ele precisa ser demitido … cinco anos depois e ainda não há justiça. Não há espera. Não há nada. Então, não, não haverá calma. Então, não, não haverá paz. Sem justiça, sem paz. … Não me peçam desculpas, demitam o policial”.

Nessa manifestação em Nova Iorque, Esmerald batera de frente com o acobertamento tácito do Departamento de Justiça para com o assassino, as esquivas do prefeito, dito progressista, Bill de Blasio, a omissão do chefe de polícia.

IMPUNIDADE FEDERAL

Aos promotores federais, disse que não queria “condolências”, mas justiça. O próprio ministro da Justiça de Trump, William Barr, havia batido o martelo de que não havia como imputar Pantaleo “sem margem razoável de dúvida” – e com vídeo e tudo. O anúncio da impunidade no plano federal veio na véspera dos cinco anos do estrangulamento à luz do dia e gravado.

Com as eleições se aproximando, enfim o chefe de polícia de Nova Iorque, James O’Neill, anunciou que o NYPD havia determinado que Pantaleo havia violado a política do Departamento ao colocar Garner em estrangulamento ao prendê-lo em julho de 2014. “Está claro que Daniel Pantaleo não pode mais servir como policial”, acrescentou. Além da demissão, Pantaleo não terá direito a pensão.

Em comunicado, o Centro de Direitos Constitucionais (CDC) apontou que a demissão de Pantaleo depois de permanecer na força por cinco anos representou apenas um “mínimo de justiça” para a família de Garner. A entidade pediu ao NYPD que impute os outros policiais envolvidos na prisão de Garner.

“Danos – incluindo danos graves – cometidos por policiais não são meramente uma questão de maus atores individuais”, assinalou a entidade. “Da falta de transparência e de responsabilização pelos atos, a uma cultura contínua de policiamento tendencioso e sigilo, muitos dos fatores que levaram à morte de Garner e à injustiça que se seguiu permanecem”, assinala o comunicado. “Para Garner, sua família e todos os nova-iorquinos, é preciso uma mudança de cultura dentro do Departamento de polícia no atacado e que as reformas avancem”.

“DEMISSÃO NÃO É SUFICIENTE“

Nas redes sociais, o senador Bernie Sanders ressaltou que a demissão de Pantaleo “não é suficiente” e conclamou por mudanças no sistema de justiça: “obrigando criminalmente a responsabilização por todas as violações de direitos civis resultantes de má conduta policial, dirigindo o Departamento de Justiça dos EUA para investigar todas as mortes causadas por policiais” e dando fim às práticas abusivas.

Também as 140 mil petições pela demissão de Pantaleo devem ter contribuído para que, afinal, o Departamento de Polícia de Nova Iorque concluísse que ele mentira ao relatar sua abordagem de Garner e assinalasse sua explicação como “implausível e egoísta”.

As últimas palavras de Eric Garner: “Afaste-se… para quê? Toda vez que você me vê, você quer mexer comigo. Estou cansado disso. Isso para hoje. … Todo mundo aqui vai dizer que eu não fiz nada. Eu não vendi nada … Porque toda vez que você me vê, você quer me assediar. Você quer me parar … Estou cuidando dos meus negócios, oficial, estou cuidando dos meus negócios. Por favor apenas me deixe em paz. Eu te disse da última vez, por favor, me deixe em paz. Por favor, por favor, não me toque. Não me toque … não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar. Eu não posso respirar”.

Do ponto de vista judicial, Pantaleo segue impune; só foi demitido por justa causa.