Fidel Castro, olha para a multidão durante manifestação em Córdoba, na Argentina, em julho de 2006.

Neste 13 de agosto de 2021, dia que marca os 95 anos de nascimento de Fidel Castro Ruz, republicamos a resolução do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), aprovada em 4 de dezembro de 2016, em homenagem à memória do Comandante Invicto, então recentemente falecido.

O Legado de Fidel Castro

Revolução é sentido do momento histórico; é mudar tudo o que deve ser mudado; é igualdade e liberdade plenas; é ser tratado e tratar os demais como seres humanos; é emancipar-se por nós mesmos e com nossos próprios esforços; é desafiar poderosas forças dominantes dentro e fora do âmbito social e nacional; é defender valores nos quais se crê ao preço de qualquer sacrifício; é modéstia, desinteresse, altruísmo, solidariedade e heroísmo; é lutar com audácia, inteligência e realismo; é não mentir jamais nem violar princípios éticos; é convicção profunda de que não existe força no mundo capaz de esmagar a força da verdade e as ideias”. ( Fidel Castro,1º de maio de 2000)

1 – Os comunistas brasileiros receberam comovidos e profundamente consternados a notícia da morte do companheiro Fidel Castro, comandante de uma das mais importantes revoluções populares do século 20, a mais importante, até os nossos dias, na região da América Latina e Caribe.

2 – O regime que imperava até então em Cuba, liderado pelo tirano Fulgêncio Batista, governava com e para os Estados Unidos. Uma cláusula da Constituição Cubana – a absurda “Emenda Platt” – dava aos Estados Unidos o direito de intervir em Cuba sempre que achassem necessário. A revolução garantiu a soberania nacional e formou um povo altamente politizado que participa ativamente da vida da nação através das amplas e variadas formas de gestão popular garantidas pela Constituição da República de Cuba.

3 – O monopólio da comunicação empresarial, visando a menoscabar o significado transcendental da revolução liderada por Fidel e as conquistas que ela proporcionou, despeja uma torrente de mentiras sobre o passado de Cuba pré-revolucionária e sobre a realidade atual de pós-revolução. A verdade histórica, no entanto, é implacável.

3.1 – Entre maio de 1956 e junho de 1957, o Conselho Nacional de Economia dos Estados Unidos fez um estudo que resultou no relatório intitulado Investment in Cuba. Basic Information for the United States Busing Department of Commerce, onde revela que o número de desempregados em Cuba atingia 35% da população ativa. Dos empregados, 62% recebiam um salário inferior a 75 pesos mensais.

3.2 – No campo, antes de Fidel, ainda de acordo com esse relatório, cerca de 60% dos camponeses viviam em barracos com teto de palha e piso de terra, desprovidos de banheiros ou água corrente. Cerca de 90% não tinham eletricidade. Em cerca de 85% desses barracos havia um ou dois ambientes para toda a família. Somente 11% dos camponeses consumiam leite, 4% carne, 2% ovos. E 43% eram analfabetos e 44% nunca tinham ido à escola.

3.3 – O primeiro presidente americano a combater a Revolução Cubana, John Kennedy, criticou os antecessores por permitirem que a situação no país chegasse ao ponto de uma revolução, e suas palavras são um registro insuspeito de como era a verdadeira Cuba pré-revolucionária: “Penso que não existe um país no mundo, incluindo os países sob domínio colonial, onde a colonização econômica, a humilhação e a exploração foram piores que as que aconteceram em Cuba, devido à política do meu país, durante o regime de Batista”.

3.4 – A triste realidade da sociedade cubana foi transformada radicalmente. Se antes da revolução a expectativa de vida no país era de 62 anos, hoje, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), é de 79,07 – maior do que a dos Estados Unidos (78,74) e do que a do Brasil (73,62), países infinitamente mais ricos do que a ilha caribenha.

Fidel: “O bloqueio criminoso, que prometem acirrar, multiplica a honra e a glória de nosso povo, contra a qual vão se esmagar seus planos genocidas. Isso eu garanto”/ Foto: José Manuel Correa

3.5 – A mortalidade infantil era de 40 por mil em 1959, hoje é de 6 por mil, segundo relatório de 2015 das Nações Unidas. Segundo este mesmo relatório, o Brasil tem o índice de 16 por mil e os EUA de 7 por mil. Se antes Cuba tinha um médico para cada 900 pessoas, hoje tem 1 para cada 160 (o Brasil tem 1 para 500). Em Cuba, o índice de alfabetização chega a 99,9%. E Cuba é o único país da América Latina e Caribe com 0% de desnutrição infantil.

3.6 – Outra fonte insuspeita de qualquer simpatia com a causa revolucionária – o Banco Mundial – constatou em relatório de 2014 que Cuba era o único país da América Latina e do Caribe com um sistema de educação de alta qualidade. Em um relatório anterior, o Banco Mundial já dizia: “Cuba é internacionalmente reconhecida por seus êxitos nos campos da educação e da saúde, com um serviço social que supera o da maior parte dos países em vias de desenvolvimento, e em certos setores se compara ao dos países desenvolvidos. Desde a Revolução Cubana, em 1959 (…) o país criou um sistema de serviços sociais que garante o acesso universal à educação e à saúde, proporcionado pelo Estado. Esse modelo permitiu a Cuba alcançar a alfabetização universal, erradicar certas doenças, (prover) acesso geral à água potável e salubridade pública de base, (atingir) as taxas mais baixas da região de mortalidade infantil e uma das maiores expectativas de vida. Uma revisão dos indicadores sociais de Cuba revela uma melhora quase contínua de 1960 até 1980”. Estes e outros dados insofismáveis desmascaram a propaganda anticomunista e anticubana e revelam o impacto gigantesco da Revolução na melhora das condições de vida daquele povo.

4 – Fidel Castro se agigantou ao comandar a resistência tenaz do seu povo. Ao longo de cinco décadas e meia, o imperialismo estadunidense mobilizou todos os meios possíveis para estrangular a nação caribenha e derrotar sua revolução. O bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos, segundo dados do governo cubano, causou prejuízos da ordem de mais de 112 bilhões de dólares além dos custos humanos e políticos.

5 – Mesmo diante desses ferozes e poderosos ataques, que incluíram tentativas de assassinar o líder revolucionário, Fidel garantiu a independência nacional e a continuidade da construção do socialismo. Comandou essa epopeia heroica nas duras condições do período especial, após a derrocada da União Soviética e dos países socialistas do Leste Europeu, com os quais Cuba mantinha mais de 80% das suas relações econômicas e comerciais externas.

6 – Um autor cubano, Jesús Arboleya Cervera, relata o drama do chamado “período especial” e ressalta o papel de Fidel: “Alienada dos mecanismos de regulação da economia internacional, sem acesso às agências financeiras, a empréstimos ou créditos, Cuba tinha muita dificuldade de atrair investimentos estrangeiros, devido às pressões norte-americanas (…). O país enfrentou então a mais profunda crise econômica de sua história. Em apenas três anos o PIB caiu 23,8%”. Neste cenário, “não havia outra chamada possível que não fosse o apelo à resistência, quase como se fosse resistir por resistir, pois não se vislumbrava uma saída para a situação, e a coesão se sustentava a partir da confiança na Revolução e a desconfiança que inspirava a contrarrevolução (…). Neste momento a figura de Fidel Castro se consolidou como o principal depositário das esperanças populares”.

7 – E Fidel mostrou, mais uma vez, que estava à altura das esperanças do povo cubano. Confrontando-se com um obstáculo que parecia intransponível, revelou profunda visão dialética e liderou de forma criativa e antidogmática a implementação de medidas originais para combater a crise, sem renunciar um milímetro aos princípios revolucionários. Mesmo durante a fase mais dura do “período especial”, Cuba continuava a sustentar os melhores índices do continente em matéria de educação, saúde, mortalidade infantil etc. No plano político, Cuba promoveu forte campanha diplomática de denúncia do cerco ilegal, além de explorar habilmente as contradições interimperialistas.

8 – Para o conjunto da América Latina, a Revolução Cubana significou a abertura de novos caminhos na luta anti-imperialista. Demonstrou que é possível derrotar um império e regimes reacionários. Desde 1959, nossa região conheceu distintos cenários. Das ditaduras militares aos governos conservadores neoliberais até a fase de governos democráticos e populares que impulsionaram a integração latino-americana. Em todas essas etapas o pensamento e a obra de Fidel Castro foram referência para as forças revolucionárias. Os líderes progressistas que surgiram nesta fase mais recente, sem exceção, reconhecem em Fidel uma fonte de inspiração e orientação.

9 – O papel de Fidel Castro, ao lado de outros líderes e forças revolucionárias e anti-imperialistas da América Latina, foi também decisivo na nova etapa política que a região passou a viver a partir dos fins da década de 1990, quando emergiram governos progressistas e a integração latino-americana tomou impulso, com a criação de mecanismos tais como a Aliança Bolivariana para os povos da nossa América (Alba) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac). Em 2013, o papel de Cuba como fiadora e impulsionadora da unidade e integração dos povos e nações da região foi reconhecido com a assunção por esse país da presidência da Celac.

10 – Fidel foi um defensor intransigente da paz e fez a constante denúncia dos arsenais nucleares e dos milionários gastos com a indústria bélica, em contraste com a fome no mundo, inclusive em memoráveis discursos na Assembleia Geral das Nações Unidas.

11 – Foi sob a presidência de Cuba que em 2014, em uma reunião de Cúpula da Celac realizada em Havana, 33 chefes de Estado e de Governo aprovaram a Proclamação da América Latina e Caribe como zona de Paz, onde se estabelece formalmente o compromisso “com a solução pacífica de controvérsias a fim de eliminar para sempre o uso e a ameaça de uso da força em nossa região”. O texto da Proclamação consagra o princípio da não ingerência e da autodeterminação – conceitos que representam um obstáculo político para os mercadores da guerra.

12 – Em um dos seus últimos escritos, divulgado em fevereiro deste ano, Fidel faz da luta pela Paz o principal tema: “A paz tem sido o sonho dourado da humanidade e o anseio dos povos em cada momento da história (…). Lutar pela paz é o dever mais sagrado de todos os seres humanos, quaisquer que sejam suas religiões ou país de nascimento, a cor de sua pele, sua idade adulta ou sua juventude”.

13 – Fidel foi um internacionalista. A solidariedade internacional foi um traço distintivo essencial da Revolução Cubana. Desde 1963, com o envio da primeira missão médica humanitária à Argélia, Cuba se comprometeu em cuidar das populações pobres do planeta em nome da solidariedade internacionalista. As missões humanitárias cubanas se estendem por quatro continentes e apresentam um caráter único. Com efeito, nenhuma outra nação do mundo, nem sequer as mais desenvolvidas, teceu semelhante rede de cooperação humanitária no planeta. Desde seu lançamento, cerca de 132.000 médicos cubanos, além do pessoal sanitário, atuaram voluntariamente em 102 países. No total, os médicos cubanos atenderam aproximadamente a 100 milhões de pessoas no mundo e salvaram um milhão de vidas. Atualmente, 37.000 médicos colaboradores oferecem seus serviços em 70 nações do Terceiro Mundo. A consigna “Cuba não exporta armas, exporta médicos”, ao lado da já famosa “Nesta noite ao redor do mundo milhões de crianças irão dormir nas ruas, nenhuma delas é cubana”, expressam o sentido mais elevado da obra de Fidel Castro.

14 – A morte de Fidel Castro ocorre no momento em que Cuba ingressa em nova etapa, de aperfeiçoamento e atualização de seu modelo econômico, em meio ao processo de restabelecimento das relações com os Estados Unidos e em uma fase em que Cuba e a América Latina se confrontam com graves desafios. Para Cuba, seguir a luta contra o bloqueio e em defesa do socialismo assume novos contornos com a eleição, nos EUA, de Donald Trump, que ofendeu duramente a memória de Fidel Castro logo após sua morte e, como já havia feito durante a campanha, prometeu “acabar com o acordo com Cuba”, mas agora acrescentando a frase: “se o acordo não mudar”. Para a América Latina como um todo, o desafio é enfrentar a ofensiva do imperialismo e da direita.

15 – Marxista-leninista convicto, Fidel assimilou a fundo também o pensamento de José Martí, o líder da luta pela independência de Cuba. Fundiu na sua obra e ação política o pensamento marxista-leninista e o martiano, e armado com esses pressupostos ideológicos unificou organizações revolucionárias no Partido Comunista de Cuba e educou com sua prédica a jovem geração.

16 – O PCdoB expressa sua convicção de que, sob a direção de Raúl Castro e do Partido Comunista de Cuba, o povo cubano preservará e desenvolverá as ideias de Fidel, que representam uma poderosa fonte irradiadora de energia e esperança.

São Paulo, 4 de dezembro de 2016

O Comitê Central do Partido Comunista do Brasil

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