Cientista Ricardo Galvão, ex-diretor do Inpe | Foto: Reprodução

O ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, afirmou que os incêndios na Amazônia e no Pantanal são de origem criminosa e o combate pelo governo Bolsonaro está sendo “completamente mal feito” e não tem “nenhum êxito”.

O cientista criticou o anúncio do governo de comprar um satélite para, supostamente, monitorar a Amazônia. Segundo Galvão, “do ponto de vista do Inpe, para os trabalhos do Inpe, esse satélite é completamente desnecessário”.

“Os pesquisadores do Inpe são os melhores especialistas nacionais em análise de imagens e utilizam dados de satélites de radar, quando necessário”, afirmou o cientista em entrevista ao Ecoa, do UOL.

Ele apontou outro problema do satélite que o governo quer comprar: “este satélite possui uma banda de frequência que não é a mais apropriada para ver desmatamento, é uma banda apropriada para aplicações militares. Aliás, é definida especificamente para isso, para aplicações militares”.

Galvão questionou outra incoerência do governo Bolsonaro.

“Outra coisa: ora, por que ele está comprando isso quando poderia, inclusive, ter desenvolvido no Brasil? Porque o Inpe, na minha gestão no ano passado, fez um grupo de trabalho com a Aeronáutica para projetar um satélite de radar que fosse útil para monitoramento da Amazônia e para aplicações militares, trabalhando em uma banda mais apropriada. Foi elaborado um relatório imenso detalhando o projeto. Então o governo, em vez de dar continuidade a esse trabalho e investir em algo que seria construído no Brasil, resolve comprar um satélite desse”.

“Esse governo do Bolsonaro tem uma ideologia, uma agenda oculta, vamos dizer assim, de ser contra o controle do desmatamento. De ser contra o controle ambiental”, disse.

Segundo ele, “esse é um período de muita seca no Pantanal. O que complicou ainda mais a situação do Pantanal agora foi o desmonte do Ibama e do ICMBio”.

“O ministro Ricardo Salles quando entrou demitiu um grande número de pessoas. Muitos coordenadores estaduais foram demitidos. Em alguns casos, não colocaram ninguém no lugar e, em outros, quando colocaram, a pessoa não era especialista, era algum militar. Pessoas que podem ser até bem-intencionadas, mas não tem qualquer competência para fazer aquilo”, disse.

“O desmonte do Ibama foi enorme, e o próprio ministro dizia que o órgão só servia para aplicar multas, seguindo o conselho do Bolsonaro. O ministro Ricardo Salles sempre dá desculpas. Ele é especialista em dar desculpas. Não está marcado no coração dele a necessidade de preservar o meio ambiente”.

De acordo com Ricardo Galvão, “o Brasil, até um pouco antes desse governo, tinha uma política muito bem estabelecida de coibir desmatamento ilegal, de controle de fogo etc. Infelizmente, começou a decair no governo Dilma, mas claramente piorou nesse governo de hoje”.

As queimadas estão acontecendo “porque as pessoas colocam fogo”, disse.

“Não é fácil de pegar fogo na Amazônia. No Pantanal, mais ou menos. Na Amazônia, elas queimam porque são desmatadas primeiro, derrubadas, e aí vale falar que quase 35% do desmatamento lá é feito em terra pública para grilagem. Então, repito: as matas brasileiras queimam porque as pessoas colocam fogo nelas. Teve, claro, o discurso do presidente Bolsonaro que incentivou”.

“Eu acredito que essa pressão nacional e internacional vai ter efeito, não vai ter como o governo resistir a isso. Vai chegar um momento que ele não vai poder ficar mais só nas palavras. Eu espero que ele mude. E tem uma coisa que eu acho que o governo Bolsonaro não vai fazer, mas deveria, que é exonerar o Ricardo Salles imediatamente. E escolher um ministro que pudesse fazer um trabalho muito melhor para o país”, continuou.

Desde o começo do governo, Jair Bolsonaro e seus ministros têm questionado os dados sobre o desmatamento e as queimadas apresentados pelo Inpe. Bolsonaro chegou a acusar Ricardo Galvão de estar “a serviço de alguma ONG”.

O ex-diretor do Inpe garante que o Instituto “está provendo dados sólidos, científicos que desagradam as autoridades. Que vai contra o que eles dizem”. “A ciência do Inpe é respeitadíssima no mundo todo”.

“Esse governo tem uma formação muito fraca. Eles têm, infelizmente, o que chamo de ignorância autoritária. Se o ministro Ernesto de Araújo, antes mesmo de entrar no governo, disse que essa questão de mudança climática é um complô marxista, que não existe aquecimento global porque ele fez uma viagem para a Itália no verão e estava fazendo frio, se ele tem a coragem de dizer isso em público, que é de uma imbecilidade estupenda, o que a gente pode esperar?”.

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