ONU vê “razões para otimismo” frente à determinação do presidente Petro em buscar a paz

O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) recebeu na última quinta-feira (14) o relatório trimestral sobre o processo de paz na Colômbia, quando destacou que “há muito boas razões” para o presidente Gustavo Petro estar otimista com a consolidação da construção de uma “paz total”.

Conforme o representante especial do secretário-geral e chefe da Missão de Verificação da ONU, Carlos Ruiz Massieu, foram avanços importantes, especialmente após terem sido superadas eleições “muito duras”, em um processo resolvido pacificamente com “a diversidade da sociedade florescente”.

Ruiz esteve presente na cerimônia junto com o presidente da Comissão da Verdade, Francisco de Roux Rengifo, e a vice-presidente e chanceler colombiana, Marta Lucía Ramírez.

Segundo dados tratados pela Comissão, a guerra afetou mais de 10 milhões de pessoas “de diferentes maneiras”, sendo que somente entre 1985 e 2018, mais de 450.000 pessoas foram assassinadas, 50.000 foram sequestradas e 80% das vítimas, entre mortos e sobreviventes, eram civis.

Em números objetivos, alertou Gustavo Petro, “dos 700 mil mortos que deixa o conflito armado desde 1958, a primeira fase política, a segunda narcotraficante, somente 1,5% morreu em combate”. Diante disso, “podemos falar de um genocídio em Colômbia”.

Sobre os desaparecimentos forçados e os chamados “falsos positivos” – as execuções extrajudiciais de civis em mãos de militares – a Comissão explicou que o Estado tem uma responsabilidade “imensa e direta” nos mais de 4.000 massacres registrados durante o conflito, “alguns deles com mais de 100 pessoas”. Nestas chacinas foram destruídas populações inteiras e onde foi protagonista “a barbárie dos paramilitares”, que transbordou “todos os limites possíveis”.

A guerra também causou o deslocamento forçado de mais de 8 milhões de pessoas e milhares de violações de direitos humanos contra comunidades camponesas, indígenas e afro-colombianas.

Soluções negociadas

O chefe da Missão de Verificação avaliou que a partir de agora o processo de unidade nacional precisa fortalecer e respaldar o Acordo de Paz de 2016, buscando “soluções negociadas, tanto políticas quanto judiciais, com os atores armados ilegais”. “O novo governo tem uma tremenda responsabilidade de acelerar a implementação do Acordo de Paz”, apontou Ruiz, acrescentando que nesse caminho a ONU e a comunidade internacional “devem fazer de tudo o que puderem para apoiar o processo”.

Embora haja conquistas significativas, como a incorporação de representantes das vítimas no Congresso e o aumento para 30% da participação de mulheres no parlamento, a Colômbia ainda não aprovou pelo menos 30 novas regulamentações relacionadas ao processo de pacificação, entre elas, “a reforma rural integral e garantias de participação política”.

Outro obstáculo grave a ser enfrentado e superado, destacou a Missão, é “a violência persistente” contra lideranças dos movimentos sociais e ex-combatentes assassinados por grupos paramilitares que atacam em regiões devastadas pela “pobreza, economias ilegais e presença limitada do Estado”, que geralmente são indígenas e territórios afrodescendentes. “Uma prioridade para qualquer Acordo de Paz deve ser salvaguardar a vida daqueles que depuseram as armas de boa-fé com a garantia de que terão proteção”, enfatizou.

Apesar destes “múltiplos desafios”, considerou Ruiz, a Colômbia tem trazido “avanços inspiradores”, como a apresentação do relatório final da Comissão da Verdade, que mostrou as vozes das vítimas e dos perpetradores, revelando “descobertas dolorosas” e números “comoventes” do conflito.

O presidente da Comissão da Verdade, Francisco de Roux Rengifo, solicitou à comunidade internacional que pare de aportar recursos para continuar com uma “guerra inútil”. “Nada pela guerra (…) Queremos fazer da Colômbia um paradigma mundial de reconciliação depois de tanto sofrimento”, disse o padre, insistindo em seu apelo para que as forças de segurança do Estado atribuam seus esforços à construção da paz.

Roux explicou que a guerra interna se agravou quando os “países consumidores” assumiram que “o narcotráfico era uma questão de segurança nacional e, portanto, uma questão de guerra”. Foi isso, ponderou, o que levou o país a destruir o campesinato, deixando-o empobrecido, sem-terra, sem capital e refugiando-se na produção de coca. Ao inviabilizar a agricultura familiar e armar o narcotráfico, denunciou o padre, o que o Estado fez foi “aumentar os lucros do negócio”.

Por sua vez, a vice-presidente Ramírez apontou o narcotráfico como responsável “por boa parte da causa do conflito” e reconheceu que mesmo tendo se comprometido com a implementação do Acordo de Paz, dos três milhões de hectares acordados, apenas “meio milhão” foi entregue aos camponeses.

O representante do Reino Unido destacou o compromisso de Petro com a aplicação do Acordo e defendeu que um ponto chave para a consolidação do processo de paz é a reforma agrária a fim de acelerar o desenvolvimento regional.

A Rússia vê a proteção da integridade física dos habitantes rurais, com a incorporação dos ex-combatentes no processo de paz como essencial para a superação dos obstáculos apresentados nos últimos quatro anos. A intenção de Petro de iniciar negociações preliminares com atores que estavam isolados do processo de paz foi vista com “bons olhos”, bem como aplaudida a reaproximação com a Venezuela.

A China, por sua vez, destacou como avançaram a retomada das negociações de paz com o ELN e iniciaram outros canais de diálogo com grupos armados. A completa reinserção de ex-combatentes, avaliou Pequim, auxiliaria a que se alcançasse uma paz “sustentada e sustentável”.