Multidão repudia deposição de Imaram Khan sob intervenção norte-americana

Milhares de manifestantes, por todo o Paquistão, foram às ruas no domingo (10) para repudiar a deposição do primeiro-ministro Imran Khan, ocorrida na véspera em votação no parlamento, denunciada como uma “operação de mudança de regime” sob ordens dos EUA.

“Queremos #ImranKhan de volta. O Paquistão não descansará até que novas eleições sejam realizadas!”, exigiram manifestantes em dezenas de cidades.

O ex-primeiro-ministro Imran Khan disse que o país se encaminha para uma nova “luta pela liberdade”, condenando sua deposição como uma “mudança de regime apoiada pelos EUA” destinada a trazer “ao poder um círculo de bandidos flexíveis, todos sob fiança”.

Na semana anterior, falando para uma multidão na capital, Islamabad, Khan dissera que um “país estrangeiro” – que agora se sabe ser os EUA – transferiu “milhões de dólares” para partidos da oposição para aprovar um voto de desconfiança no parlamento.

“Nunca tantas multidões saíram tão espontaneamente e em tantos números em nossa história, rejeitando o governo importado liderado por bandidos”, agradeceu Khan, pelo Twitter, compartilhando imagens das manifestações. Os maiores protestos ocorreram na capital do país, Islamabad, em Karashi, Peshawar, Quetta e Lahore.

Khan acrescentou que o país está entrando em um novo período de “luta pela liberdade” com o povo paquistanês protegendo “a soberania e a democracia” de uma “conspiração estrangeira de mudança de regime”.

Na tentativa de evitar a deposição, o governo tentara antecipar as eleições, após ter perdido a maioria no parlamento depois de deserções em suas fileiras patrocinadas pelos EUA, mas a convocação foi revogada pela Suprema Corte.

Nesta segunda-feira, um novo primeiro-ministro será votado no parlamento paquistanês.

Deposição

A oposição prevaleceu no voto de desconfiança, com dois votos a mais dos 172 [em 342] necessários para afastar Khan. Sete deputados do partido do primeiro-ministro desertaram para a oposição, virando a correlação de forças no parlamento.

Entre outros ‘pecados’, o governo de Khan recusou abrir bases dos EUA para manter tropas que estavam se retirando do Afeganistão, ao mesmo tempo em que o Paquistão desenvolveu um corredor econômico chave da assim chamada Nova Rota da Seda Chinesa, reforçando os tradicionais laços com Pequim, e ampliou as relações com a Rússia.

Em fevereiro, Khan foi a Moscou em visita oficial e, na ONU, o Paquistão se absteve na votação pela suspensão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos.

O mandato de Khan deveria ir até 2023. No Paquistão, desde sua fundação, nenhum governo completou o mandato.

Política externa independente

A bancada de apoio a Khan se retirou antes que a votação ocorresse, com exceção de um parlamentar, Ali Muhammad Khan, que proferiu uma contundente denúncia do esbulho em curso. O parlamento do Paquistão deve realizar uma votação para escolher um novo primeiro-ministro nesta segunda-feira.

Imran Khan “sacrificou seu governo, mas não aceitou a submissão”, sublinhou Ali Muhammad Khan.

“Imran Khan falou sobre um bloco muçulmano, esse é o pecado dele. Imran Khan falou sobre uma política externa independente, esse é o pecado dele… A visita à Rússia é apenas uma desculpa, o verdadeiro alvo sempre foi Imran Khan”, acrescentou.

Também o ministro das Relações Exteriores Shah Mahmood Qureshi se pronunciou ao parlamento e repudiou a troca de consciências por vantagens ilícitas, para pavimentar o caminho para o afastamento de Imran Khan.

“Os poderes que juraram defender a Constituição não estão vendo este bazar?” ele perguntou, acrescentando que a nação estava ciente de como os votos foram comprados e vendidos durante as eleições para o Senado do ano passado.

“O Paquistão está na encruzilhada da história. A nação tem que decidir se vamos viver de cabeça baixa ou de cabeça erguida”, sublinhou.

Sobre a visita do primeiro-ministro à Rússia, ele destacou que a decisão de realizá-la foi tomada após consulta a diplomatas experientes, acadêmicos e mídia, sobre os prós e contras, chegando-se à conclusão de que seria “do interesse do Paquistão”.

“Somos um estado soberano. Não queremos carregar o jugo da escravidão”, disse. Ele também afirmou que antes da visita, o conselheiro de segurança nacional dos EUA ligou para seu homólogo paquistanês com uma mensagem: Não vá. Qureshi questionou como um estado soberano poderia ser impedido de uma visita bilateral dessa maneira.

Ele acrescentou que, uma vez tomada a decisão de ir, o Paquistão decidiu dar sua opinião sobre a guerra na Ucrânia. “O Paquistão é um país que acredita na carta das Nações Unidas e na autodeterminação e nunca apoiamos o uso da força”.

A interferência de Washington incluiu uma carta em que há a ameaça de que, se o voto de desconfiança não fosse aprovado, haveria conseqüências para o Paquistão.

Qureshi afirmou que o Paquistão tem relações de longa data com os EUA. “Queremos ter boas relações com eles, nosso objetivo não é estragar [as relações]. Mas os EUA querem que o Paquistão ofereça apoio em todas as questões importantes para eles”.

Sobre o Corredor Econômico China-Paquistão, ele disse que o governo do PTI sentiu que este era um projeto que melhoraria a conectividade regional e tiraria milhões de pessoas da pobreza.

Ele convocou os parlamentares a não empurrarem o Paquistão para uma crise constitucional e a anteciparem as eleições. “Por que vocês estão com medo da nação?”, ele perguntou à oposição.

Por sua vez, a ministra dos Direitos Humanos, Shireen Mazari, classificou de “desgraça desta nação que os Estados Unidos sempre tenham sido bem sucedidos em [mudar] os líderes do Paquistão.”

Ela lembrou que a oposição foi convidada a verificar a ‘carta de ameaça’ que o governo considera a prova de uma conspiração com financiamento estrangeiro.

“Mas eu sei por que vocês não vieram… porque vocês fazem parte dessa conspiração, que afirma claramente que ‘se você expulsar Imran Khan e o voto de desconfiança for bem-sucedido, então a nação será perdoada’”, acrescentou.

“O que será perdoado? Que crime o Paquistão cometeu? Uma política externa independente? Quem diabos é a América para nos perdoar? E por qual crime? O Reino Unido conspirou para derrubar o líder iraniano Mossadegh – que era um líder democrático”.

Ela disse que os Estados Unidos derrubaram líderes democráticos ou os assassinaram e instalaram ditaduras nos países. “Alguns dias atrás, Biden foi à Polônia e disse ‘remover Putin e trazer mudança de regime’. Este é o jeito da América”.

Edição: Guiomar Prates