O Brasil e o mundo enfrentam uma situação com singularidade e enormes desafios. Enfrentá-los é uma questão que exige a compreensão dessa complexa realidade e muito disposição de luta.

Por Luciana Santos*

Definitivamente, somos protagonistas uma mudança de época. A pandemia do coronavírus – certamente a mais grave do último século – precipitou mudanças de ordem geopolítica, econômica, social e no imaginário coletivo. O mundo não será mais o mesmo.

No pós-epidemia, um novo cenário internacional tende a emergir, com total descrédito das políticas de austeridade fiscal e grande papel da China socialista. Serão ainda mais acirradas as disputas no tabuleiro geopolítico. Ameaças autoritárias e novos modelos de dominação tendem a surgir. Neste bojo, a questão da alternativa permanecerá no centro do debate, seja para nosso campo, seja para o sistema capitalista.

São nestas condições que celebramos os nossos 98 anos do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), um partido engajado nas grandes causas nacionais, seja no enfrentamento ao governo de extrema direita, seja fazendo frente à grave crise sanitária que vivemos com a Covid-19. Assim são os comunistas, indissociáveis da luta do povo.

Um vírus de propagação exponencial

A epidemia se encontra em seu início no Brasil, com somente 10,8% de população idosa. Mas temos singularidades. Somos um país profundamente desigual, com grandes comunidades com uma urbanização precária

As estimativas de agências internacionais é de que a economia mundial sofra fortes retrações neste ano, e o risco de recessão não está descartado. A OCDE estima que pela primeira vez em anos a China crescerá abaixo de 5% (4,9%). A OIT estima, em sua primeira projeção, que a Covid-19 poderá eliminar 25 milhões de postos de trabalho. Contudo, a mesma organização afirma que irá atualizar suas projeções na próxima semana; o número tende a subir.

No Brasil, quando o vírus começou a assustar o mundo já tínhamos de 11,6 milhões de desempregados e 26,2 milhões de pessoas subutilizadas. O governo Bolsonaro nada fez para enfrentar este drama. De acordo com um estudo da FGV, o Brasil poderá ter um PIB negativo de – 4,4%; alguns analistas falam que poderá chegar a -8%.

Vivemos o momento mais agudo de nosso desnorteamento enquanto nação

No Brasil, este quadro se torna mais complexo por vivermos uma justaposição de crises. Crise na saúde, na política, na economia e na proteção social. É o momento mais agudo do nosso desnorteamento enquanto nação. Estando diante do maior desafio dos últimos anos; nos encontramos sem uma liderança capaz de unir o país para fazer o enfrentamento à pandemia.

Bolsonaro tem adotado a postura de negar a gravidade da Covid-19, considerada por ele como uma “gripezinha”, chamando de histeria as inciativas adotadas para a sua contenção. Esta atitude se agrava pelo fato de que o presidente, ao invés de liderar os esforços de coordenação no combate ao coronavírus, busca politizar a situação e estabelecer um enfrentamento aberto aos governadores e prefeitos que vêm seguindo as orientações do próprio Ministério da Saúde e da OMS.

Sua equipe econômica afirmava, até a poucos dias, que a melhor forma de enfrentar a crise era fazer as “reformas” e privatizar a Eletrobrás, ou suspensão dos salários por quatro meses. E, apesar do discurso priorizar a economia, o governo praticamente não adotou medidas neste sentido.

O fato é que, mesmo diante de uma crise desta envergadura, Bolsonaro prefere manter sua estratégia de enfrentamento, ante a necessidade de construção de convergência. Sua postura, que já vinha sendo criticada, o deixou ainda mais isolado após um vergonhoso pronunciamento em cadeia nacional.

Bolsonaro viu seu isolamento político subir de modo vertical. Foi desconsiderado pelos governadores, desautorizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e deixado de lado pelo parlamento. Até mesmo aliados como o governado do estado de Goiás Ronaldo Caiado, com grande participação no agronegócio, rompeu publicamente com o presidente.

Acuado, Bolsonaro parte para o ataque, se desresponsabilizando com as consequências de suas ações. Elegeu como alvo o isolamento social, tentando jogar no colo dos governadores a responsabilidade pela crise econômica que, independente de confinamento, existirá.

Bolsonaro dobra a aposta – “O Brasil não pode parar”

O novo factoide é a necessidade de retomada da atividade econômica, frente a qual defende medidas mais brandas, como o chamado isolamento vertical, para conter a propagação do vírus e não parar a atividade econômica.

O tempo para as populações mais vulneráveis é outro. Para elas, com uma semana de reclusão o armário vazio chega antes do coronavírus. Chegam as contas para pagar, a falta dinheiro e a ausência de perspectiva. Neste momento, bate o desespero e o medo, sentimentos instrumentalizados pelas redes bolsonaristas.

Com esse discurso, Bolsonaro busca se dirigir a uma parcela mais vulnerável, tentando dizer que são os “políticos”, os prefeitos e os governadores, com suas medidas exageradas, que estão colocando em risco o emprego e a sobrevivência das pessoas.

Não há dúvidas de que se trata de uma estratégia articulada, com uso pesado de bigdatas, de pesquisas qualitativas e mensagens segmentadas, fazendo uso inclusive da máquina do Estado.

Constrói um discurso que lhe deixa em sua zona de conforto, a de ser vítima, de estar isento das decisões de governar.

Busca, desse modo, responder à pressão dos agentes do mercado e da bolsa, de setores dos empresários do varejo, que pleiteiam a retomada imediata das atividades econômicas.

Estamos para iniciar mais uma semana da crise e as medidas da equipe econômica permanecem sem aparecer. Após a edição da Medida Provisória chamada de MP da morte, que deixava as pessoas por quatro meses sem salário, nada mais surgiu de concreto.

Bolsonaro fala em priorizar a economia, mas as iniciativas do governo não avançam, não chegam ao Congresso Nacional, não saem dos anúncios. Os recursos anunciados aos governos estaduais e municipais ainda não saíram do papel.

Mesmo o mais básico do básico não foi realizado. Até agora as primeiras inciativas não saíram das palavras. Se mantêm os atrasos no acesso aos benefícios do INSS, pessoas esperando o benefício do BPC, e mais de 1,5 milhão na fila do Bolsa Família.

Tímidas iniciativas na esfera econômica

Diante da magnitude da atual crise econômica do Brasil, a equipe do Ministério da Economia aparenta continuar dançando com uma música que já não existe mais. O mundo de políticas de autoridades do ministro da Economia, Paulo Guedes, perderá completamente o sentido, fazem parte do mundo que o coronavírus levou.

É hora de política econômica expansionista; e este tem sido o consenso entre os economistas das mais distintas matizes mundo afora.

A natureza da crise dificulta o sucesso de medidas tradicionais de política fiscal, em decorrência justamente da necessidade de isolamento. É uma variedade de medidas que vêm sendo adotadas, sua grande maioria busca ter como base a rapidez.

São mais de 30 países ao redor do mundo que adotaram medidas novas ou fortaleceram os já existentes programas de transferência direta de renda para socorrer trabalhadores, desempregados e os mais pobres.

Na grande maioria, os países adotaram medidas econômicas para enfrentar a Covi-19. Medidas de política monetária, como a redução da taxa de juros, que em vários países se encontra em 0%, ou mesmo negativo. No Brasil a taxa de juros se mantém em 3,75%.

Políticas fiscais para pôr dinheiro na mão das pessoas, garantir renda mínima, apoio às empresas que garantam o emprego, pagar parte dos salários e ampliar e melhorar o acesso ao seguro-desemprego.

Ampliar o acesso ao crédito de forma ampla, rápida, fácil e barata para as pequenas e medias empresas.

Diante das tensões e disjuntivas – qual é a tática a ser adotada? Como nos posicionarmos neste ambiente instável, imprevisível e de uma crise múltipla? O que fazer diante deste quadro?

O jogo de Bolsonaro é de tensionar ao máximo possível, levar a disputa política para o terreno do caos e da confrontação aberta entre os Poderes da República. Deixou claro em uma de suas declarações na porta do Palácio do Planalto que o Brasil corre o risco de convulsão social, de que as esquerdas gostariam de se utilizar disso para o retirar do poder.  Ambiente perfeito para a construção de um autogolpe.

Ampla convergência de salvação nacional

Mas qual é a saída política para este quadro? O centro da tática da luta continua sendo o esforço de construir uma ampla convergência contra Bolsonaro. É isto que tem dado liga a reunião dos governadores. Se opor aos excessos do governo e fazer com que se estabeleça uma agenda paralela para enfrentar os desafios da pandemia.

Há uma preocupação grande de setores da sociedade com o avanço da Covid-19, que demandam dos governantes o seguimento de medidas das autoridades sanitárias e da Organização Mundial de Saúde – como o isolamento social, ampliação da infraestrutura de atendimento no sistema de saúde, entre outras.

Bolsonaro deve responder por seus atos irresponsáveis. Haverá o momento. Devemos fortalecer as iniciativas dos governadores e prefeitos no combate à pandemia.

O parlamento terá como papel fazer avançar, de modo célere, as medidas destinadas a mitigar o sofrimento da população mais carente e vulnerável, como a aprovação da renda mínima. Terá papel importantíssimo no intuito de conter os arroubos autoritários e possíveis aventuras que Bolsonaro venha a tomar.

Em outra frente, é necessário ampliar a interlocução com as forças vivas da sociedade, com vistas a abrir veredas, contribuindo para que este desnorteamento tenha um fim. A Frente Ampla ganha múltiplos e variados contornos a partir de cada momento da luta política. Ela vem demonstrando ser o caminho viável para impor uma derrota ao governo Bolsonaro e construir um novo caminho para o Brasil.

Não há tempo a perder. Vamos cuidar das vidas!

No enfrentamento ao coronavírus, a grande variável que permeia todo o embate é o tempo. Seja porque o grande perigo do vírus e a rapidez com que ele se alastra, seja porque ser ágil na adoção de medidas preventivas podem salvar vidas, seja porque, ser rápido nas ações econômicas, protege a renda e o emprego dos mais vulneráveis. E desperdiçar tempo é o que mais Bolsonaro tem feito nas últimas semanas.

Não há tempo a perder. Vamos fortalecer a solidariedade, cuidar das vidas.

Basta de Bolsonaro!