Senador Eduardo Gomes (PL-TO), líder do governo Bolsonaro no Congresso, discursa em plenário

Mais um caso com indícios fortíssimos de corrupção no governo Bolsonaro, desta feita envolvendo seu líder no Congresso Nacional, senador Eduardo Gomes (PL-TO)

A Polícia Federal interceptou mensagens em que o senador, hoje licenciado para cuidar, segundo ele, de suas “bases eleitorais”, embora sua cadeira não esteja em disputa, solicita quantias em dinheiro a um empresário que solicita demandas junto aos órgãos públicos, principalmente o Inmetro.

As mensagens foram capturadas durante as investigações da Operação Lavandeira que apura possíveis crimes de lavagem de dinheiro praticados por empresários do Estado de Tocantins. O conteúdo delas foi revelado pelo jornal O Globo e confirmado pela Folha de S. Paulo.

De acordo com relatório produzido pela Superintendência Regional da PF do Tocantins, “chamou atenção” o teor dos diálogos entre Gomes e um empresário do ramo da construção, Jorge Rodrigues Alves. Alves é apontado pela polícia como membro de um grupo organizado com objetivo de conseguir contratos com o poder público em municípios tocantinenses. Ele teve um mandado de busca e apreensão cumprido pela polícia em março deste ano em sua casa.

Segundo essas mensagens, Gomes chegou a fazer pedidos de depósitos bancários a um empresário em troca de ‘ajudar a adiar’ uma portaria do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). Tais diálogos foram encontrados no celular de Alves, amigo do senador.

Mas não foram só essas mensagens que apontam indícios de corrupção. A PF encontrou também comprovantes de depósitos a pessoas indicadas pelo senador e encaminhou um relatório sigiloso para a 4ª Vara Federal do Tocantins no último dia 11 de julho, solicitando o envio do caso para o Supremo Tribunal Federal em razão do foro privilegiado de Gomes.

“Há, por fim, diversas conversas entre Jorge e o senador Eduardo Gomes, indicando que Jorge aparentemente paga contas para o senador e lhe envia dinheiro, assim como lhe pede favores e intercessão em assuntos de suas empresas”, diz um trecho do documento.

Conforme o documento, os depósitos ocorrem desde 2016 em contas ligadas ao senador e somam cerca de 760 mil reais. Em uma delas, o parlamentar questiona ao empresário se ele “acha que consegue 20?” ao indicar os dados bancários do seu assessor João Bosco Pinto da Silva. Alves então responde com um ‘Opa! Certeza!’. O assessor alega não se lembrar do episódio específico, mas disse ser possível, já que empresta a conta constantemente para o senador.

Ainda naquele ano, em outro diálogo, é possível ver uma espécie de prestação de contas de Alves para Gomes. O senador pergunta o que já foi feito e o empresário responde com comprovantes de depósitos em cinco contas ligadas ao líder do governo Bolsonaro. O total dos valores ultrapassa os 42 mil. Pelo relatório, Alves teria pago, inclusive, contas pessoais do senador. Na véspera de Gomes assumir seu mandato no Congresso, ele pediu que o empresário custeasse o buffet da sua festa, lhe encaminhando a conta de uma mulher. Alves fez o pagamento: “Estamos juntos, amigo”, escreveu o empresário.

O Globo procurou a mulher mencionada na mensagem, mas ela não quis falar sobre o assunto e passou o telefone para outra pessoa, identificada como seu marido. O homem, que não quis dizer o nome, afirmou que o pagamento serviu para custear as bebidas da festa de posse do senador e disse que ‘vários amigos se juntaram para ajudar a bancar o evento’.

Em outra conversa, Gomes também pediu pagamentos para bancar despesas com veículos e alimentação. “Tenho que passar 70 mil para uma locadora que pode dar nota que cuida de todos os veículos que estão na campanha”, pediu o parlamentar dois meses antes das eleições. Alves apenas questionou se o pagamento precisaria ser feito naquele dia. Em seguida, o empresário recebe a solicitação de mais dinheiro para alimentação naquela semana. “Eu preciso de 30 para comer até domingo”, escreveu o líder de Bolsonaro. “Uai, tá comendo muiiiito amigo rs”, ironizou o empresário.

“Há elementos para se acreditar que parte dos valores movimentados pelo grupo possa ter ido para o referido senador, por meio de Jorge Rodrigues Alves, como forma de manutenção de uma boa relação, assim como para o financiamento de campanhas política”, conclui a PF.

Já em 2019, em pleno governo Bolsonaro, o empresário pediu que Gomes ‘intercedesse por ele’ no Inmetro, ao que o senador assentiu. “Preciso muiiiiito de sua ajuda”, escreveu o empresário. “É só falar aonde”, respondeu o parlamentar. “Portaria 20 do Inmetro Precisa ser URGENTEMENTE suspensa ou adiada”, afirmou Alves. “Vou pedir assim que sair da presidência […]. Falo direto com o Carlos”, disse Gomes, referindo-se a Carlos da Costa, então secretário de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia. “Importantíssimo! Amigo, cuida de mim!”, finaliza Alves.

Gomes, que ainda era vice-líder do governo na ocasião, dias depois, chegou a dizer que poderia trabalhar pela demissão da então presidente do Inmetro, Angela Flôres Furtado, caso o órgão não atendesse ao pedido dele. “Vou ler aqui e montar uma

estratégia. Em último caso, a gente questiona via comissão de Infraestrutura. Se houver motivação de espírito público a gente até derruba essa mulher.”.

Precisamente no dia 26 de junho daquele ano, o senador informou a Alves o “comprovante” de sua articulação junto ao governo, um flagrante tráfico de influência, um delito previsto em lei: um e-mail em que a presidente do Inmetro informava ao seu gabinete que a vigência da portaria seria adiada em três meses. Uma reunião entre o senador e a Angela Furtado está publicamente registrada no dia seguinte. As novas regras foram, de fato, postergadas e só passaram a valer em novembro de 2019.

Alves, por sua vez, disse, em nota, que não comenta investigações que correm sob sigilo. Carlos da Costa não quis se pronunciar. O Ministério da Economia disse não ter conhecimento do assunto e orientou que fosse consultado o Inmetro que, em manifestação pública, afirmou que a vigência da portaria foi adiada porque o órgão ‘constatou que não havia luminárias com certificação dentro dos parâmetros estabelecidos’.