Lavrov: “É inadmissível que EUA tenha armas nucleares na Europa”
Em pronunciamento à conferência da ONU sobre desarmamento na terça-feira (1º de março), o ministro russo das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, advertiu que é “inaceitável que até hoje haja armas nucleares dos EUA no território de uma série dos países europeus” não-nucleares – “contrariando as disposições fundamentais do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP)” – e chamou a retirá-las já.
“Já é hora das armas nucleares americanas voltarem para casa e de desmantelar completamente toda a infraestrutura ligada a elas na Europa”, afirmou o chefe da diplomacia russa.
Lavrov acrescentou que continua “a prática perversa de ‘missões nucleares conjuntas’ envolvendo países não nucleares da OTAN” em que há treinos de uso de armamento nuclear contra a Rússia, em aberta violação do TNP.
O chanceler russo enfatizou que “os países ocidentais devem abdicar da construção de instalações militares nos territórios dos países que anteriormente foram parte da União Soviética e não são membros da Aliança, inclusive sua infraestrutura para realizar quaisquer atividades militares”.
Lavrov ressaltou que os EUA e a Otan ainda “não mostram estar prontos” para prestar à Rússia as garantias de segurança jurídicas e de longo prazo, especialmente o fim da expansão da OTAN para leste.
Ele destacou que é “de importância crucial” para Moscou atingir esses objetivos, inclusive o retorno dos sistemas de armas e infraestrutura da OTAN ao estado em que estavam em 1997, quando foi assinado o Ato entre a Rússia e a Aliança Atlântica.
Quanto à situação ucraniana, Lavrov disse que “a tragédia da Ucrânia é resultado da tolerância dos patrocinadores ocidentais em relação ao regime criminoso que se formou no país após o sangrento golpe de Estado em fevereiro de 2014, realizado a despeito das garantias dadas pela Alemanha, Polônia e França conforme o acordo sobre a resolução da crise interna ucraniana”.
Lavrov enfatizou que a Rússia não pretende de forma alguma “infringir os interesses dos cidadãos ucranianos, com os quais estamos unidos não apenas pela história conjunta, afinidade civilizacional, espiritual e cultural, mas também simplesmente por laços de sangue. Milhões de ucranianos vivem agora na Rússia. Para nós, eles são ‘nossos’. Juntos fomos e seremos muito mais fortes e bem sucedidos
A Rússia, que vem exigindo que a Ucrânia mantenha o status de neutralidade estabelecido nos Memorandos de Bucareste pós-dissolução da União Soviética, ou seja, não ingresse na Otan, também está tomando todas as medidas para que o status não-nuclear, também ali definido, seja mantido.
Na conferência de Segurança de Munique recém realizada, o presidente Zelensky ameaçou obter armas nucleares. Para Lavrov, as declarações irresponsáveis de Kiev não são simplesmente uma bravata: “a Ucrânia possui tecnologias nucleares herdadas dos tempos soviéticos e os meios de lançamento de tal armamento”.
“Posso lhes assegurar: a Rússia como membro responsável da comunidade internacional, comprometida com suas obrigações de não proliferação de armas de destruição em massa, está tomando todas as medidas necessárias para impedir o surgimento de armas nucleares e tecnologias relacionadas na Ucrânia.”
Padrões duplos
Os EUA e seus aliados mais uma vez mostraram que seguem padrões duplos, ao criticar a operação russa na Ucrânia, acrescentou Lavrov, “sendo responsáveis por numerosos abusos dos direitos humanos e do direito humanitário internacional, culpados por crimes, dos quais centenas de milhares de pessoas comuns na Iugoslávia, Iraque, Líbia e Afeganistão foram vítimas”. A carapuça serviu e a ‘bancada da Otan’ se retirou do recinto assim que Lavrov começou por videoconferência seu discurso.
Lavrov também repudiou as sanções impostas recentemente à Rússia. “Ao escolher o caminho de sanções unilaterais ilegítimas, os países da UE tentam evitar o diálogo sincero cara a cara, os contatos diretos, destinados a favorecer as resoluções políticas dos candentes problemas internacionais”.
Corrida armamentista
Nas atuais condições, ressaltou Lavrov, é preciso “fazer tudo para impedir novas escaladas da corrida armamentista, e a Rússia exorta os EUA e seus aliados a se juntarem à moratória de implantação dos mísseis de médio e curto alcance na Europa”.
O Tratado INF, assinado por Bush Pai e Gorbachev, foi rasgado por Trump, assim como o Tratado de Céus Abertos de vistorias mútuas, na prática reduzindo a quase zero a arquitetura de segurança estratégica no continente europeu, que ao longo de três décadas evitou uma hecatombe nuclear.
Também na Assembleia Geral da ONU extraordinária, convocada por causa da crise na Ucrânia, o embaixador russo Vasily Nebenzya afirmou que a Rússia jamais executaria uma operação militar no Donbass a não ser que as autoridades ucranianas fizessem alguma ameaça direta e “foi este o caso”. “Temos informação crível que uma operação militar estava planejada e, nessas circunstâncias, foi inevitável”, assinalou.
Nebenzya assinalou que não foi a Rússia que desencadeou essa crise, que se arrasta há oito anos, após o golpe de Estado em Kiev, a recusa de várias regiões de se sujeitarem ao regime inconstitucional e a reiterada tentativa deste de, primeiro, resolver a questão pela força militar e, depois, por sabotar o caminho que se criara para solucionar o impasse e divisão na sociedade ucraniana e mais recentemente passar a dizer que “não ia cumprir” os Acordos de Minsk e concentrando na linha de contato com o Donbass metade do exército ucraniano.
O poder real na Ucrânia é dos radicais e dos neonazistas e não de Zelensky, assinalou o diplomata russo, denunciando que o presidente vem sendo manipulado por extremistas, pois é débil e não tem qualquer discernimento nem vontade política. “Não tem capacidade de resistir a esses radicais”, frisou.
Segundo o embaixador, a paz será conquistada com a “desmilitarização e a desnazificação” do país vizinho.
Sobre o impasse diante da expansão da Otan até às fronteiras russas, Nebenzya assinalou que o fato é que a infraestrutura da Otan está se aproximando perigosamente das fronteiras russas e, atualmente, vem multiplicando os exercícios militares.
“Do ponto de vista geopolítico, nos oferecemos aos EUA e aos países da Otan para sentar e conversar sobre a garantia de segurança. Essa oferta foi feita recentemente e essas propostas incluíam a não expansão da Otan, o não posicionamento de armamentos próximos de nossa fronteira e retorno da Otan para onde estava em 1997”. “Seria benéfico para todos os envolvidos. Mas nós recebemos um retorno que basicamente negou todas as nossas ideias nesse sentido”, apontou.