Governo iraquiano mata 40 manifestantes que exigem emprego, água e luz
No retorno dos protestos no Iraque contra os apagões, a falta de água, o desemprego e a corrupção, 40 manifestantes foram mortos e mais de 2 mil ficaram feridos na sexta-feira (25), segundo a Reuters. O repúdio ocorreu na capital e nas províncias do sul.
Nas manifestações anteriores no início do mês nas mesmas regiões, forças de repressão e franco-atiradores mataram 149 civis, segundo relatório oficial, que registrou ainda que 70% dos mortos foram a tiros “na cabeça ou no torso” e admitiu que o governo “perdera o controle” sobre as forças de segurança ativadas.
O que não impediu o detestado primeiro-ministro Adel Abdul Mahdi de, na véspera, ameaçar os manifestantes de que “a violência não seria tolerada” e advertir sobre “o caos”. No decorrer dos protestos ele prometeu maquiar seu ministério e remendar algumas leis.
O principal líder religioso xiita do país, aiatolá Ali Sistani, em sermão lido nessa sexta-feira, conclamou todos os lados à contenção.
Na capital, Bagdá, manifestantes tomaram a praça Tahir tentaram entrar na Zona Verde, onde ficam os ministérios e as embaixadas, e que se tornou um símbolo da ocupação e da corrupção.
O fato de que dezesseis anos após a invasão e o assassinato do presidente Sadam o Iraque, um dos países mais ricos em petróleo do mundo, não consiga pagar salários dignos, proporcionar empregos ou pelo menos ter um sistema elétrico que funcione e garantir água potável, é expressão da devastação trazida pela guerra de W. Bush – a do “sangue por petróleo” e da mentira das “armas de destruição em massa”.
Mahdi, agora primeiro-ministro, foi ministro das Finanças do primeiro governo fantoche, que desde então manteve a curiosa particularidade de ser ao mesmo tempo pró-americano e pró-iraniano.
“Tudo o que queremos são quatro coisas: empregos; água, eletricidade e segurança. É tudo o que queremos ”, disse Ali Mohammed, 16 anos, que cobria o rosto com uma camiseta para evitar a inalação de gás lacrimogêneo, enquanto cenas caóticas dominavam a praça Tahrir, no centro de Bagdá, como registrou a Reuters. Manifestantes rechaçavam os colaboracionistas no governo: “fora, ladrões!”
Com o passar das horas, a indignação foi aumentando, com milhares de manifestantes, apesar da chuva torrencial, empunhando bandeiras iraquianas, bradando o cântico patriótico tradicional de “com nossa alma, nosso sangue, por ti Iraque”. Cântico que em outros tempos a rua árabe já bradou pelo gigante Nasser e pelo mártir Sadam.
Um manifestante ouvido pela agência de notícias britânica, Salah Mohhamad, disse que “o que queremos é que o governo seja derrubado”, depois de denunciar a repressão aos protestos. “Queremos que o Irã parta e vá embora, queremos que os EUA se vão e deixem o povo iraquiano decidir”, afirmou, condenando o estranho consórcio entre Washington e Teerã para manter o Iraque submetido e miserável, como denuncia a oposição baasista, mantida na clandestinidade sob a constituição escrita pela Casa Branca e mantida até hoje.
Os manifestantes também exigiram o fim do sistema político sectário, que funciona como a base da corrupção vigente, ao lotear o governo entre colaboracionistas e ladrões por credo ‘religioso’ e ‘etnia’. Segundo o Alto Comissariado dos Direitos Humanos, que é um órgão oficial, houve oito mortos na capital.
As cenas de Bagdá se repetiram de forma ainda mais intensa nas províncias do sul e de acordo com a BBC metade dos mortos ocorreu na tentativa de invadir prédios governamentais e sedes de agremiações notórias pela ladroagem e de milícias sectárias, ligadas ao morticínio de 149 civis há duas semanas.
Em Basra, terceira maior cidade do Iraque, imagens da Reuters mostraram manifestantes resistindo com pedras à tropa de choque em meio a nuvens de gás lacrimogêneo. Carros de polícia foram incinerados, enquanto jovens socorriam feridos como podiam. Houve três mortos, segundo fontes da segurança.
Em Nasiria, pelo menos nove manifestantes foram mortos quando membros da milícia sectária Asaib Ahl al-Haq abriram fogo contra manifestantes que cercavam a sede do bando.
Oito pessoas foram mortas na cidade de Amara, incluindo seis manifestantes. Um civil foi morto em Hilla e outro em Samawa.
O pior incidente foi na cidade de Diwaniya, onde doze manifestantes morreram após ficarem presos em um prédio em chamas, a sede da Organização Badr.
Sedes das milícias que dispararam contra manifestantes também foram depredadas nas províncias de Muthana e Wasit.
Um toque de recolher às 20h foi imposto até novo aviso nas províncias do sul de Basra, Muthanna, Wasit, Babel e Dhi Qar. De acordo com o porta-voz do Ministério do Interior Khalid al-Muhanna, pelo menos 68 membros das forças de segurança ficaram feridos.
Antes da ocupação norte-americana, o Iraque tinha o mais avançado sistema de saúde e educação do Oriente Médio e uma infraestrutura que fora possível pela nacionalização do petróleo e colocação da renda do petróleo a serviço do povo e do desenvolvimento. A invasão matou mais de um milhão de iraquianos, torturou em massa em Abu Graib e massacrou Faluja. Impôs o regime fantoche e corrupto e a divisão sectária, e ainda abriu caminho para o flagelo do Daesh (Estado Islâmico). É com esse desastre que o povo iraquiano deseja romper de vez.