Burocratas da União Europeia se submetem a ditames alheios e prejudicam suas populações, diz Putin

“A era da ordem mundial unipolar chegou ao fim”, declarou o presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante a sessão plenária do 25º Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPIEF*), Rússia, de 16 a 18 de junho.

Em seu discurso, Putin enfatizou que a União Europeia – que abre mão de sua soberania – está sendo drasticamente prejudicada ao aderir ao frenesi “louco e impensado” de sanções ditadas por Washington contra a Rússia.

O presidente da Rússia acrescentou que “os colegas do Ocidente estão tentando contrariar o curso da história pensando em termos do século passado”. E sublinhou que as nações do “bilhão de ouro” continuam a considerar todos os outros países como suas colônias de segunda classe. Ele destacou que as elites dominantes do Ocidente “vivem em um mundo de sonhos” e se recusam a ver as mudanças globais.

“Os EUA, ao declararem sua vitória na Guerra Fria, se manifestaram mensageiros de Deus na Terra, que não têm nenhuma obrigação, apenas interesses, e esses interesses estão sendo declarados como sagrados”, disse.

Ao expor que a era da “ordem mundial unipolar” terminou, Putin mostrou que isso ocorre apesar de todas as tentativas de “preservá-la por qualquer meio”. Para Putin “a diversidade de civilizações no planeta” e “a riqueza de culturas” são difíceis de combinar com “patrões”, sejam políticos, econômicos ou outros. “Os patrões não trabalham aqui, patrões grosseiros, sem alternativa, impostos desde um único centro”, assinalou.

“Nas últimas décadas, estão sendo formados no planeta e se manifestando de forma cada vez mais aguda novos centros de poder, cada um dos quais desenvolve seus sistemas políticos e instituições sociais, realiza os seus próprios modelos de crescimento econômico e, certamente, tem o direito de protegê-los, de manter a soberania nacional”, prosseguiu o presidente russo.

As “loucas e impensadas” sanções contra a Rússia, tomadas com o objetivo de esmagar sua economia com um golpe de caneta, não funcionaram. A “blitzkrieg [guerra-relâmpago] econômica” contra a Rússia desde o início não tem chances de sucesso.

“A UE perdeu sua soberania política”

O presidente russo também alertou que a União Europeia perdeu sua soberania política com elites burocráticas que seguem os ditames alheios, causando danos à sua própria população. A atual liderança em Bruxelas, observou ele, não consegue esconder sua submissão com toda essa narrativa dos supostos custos admissíveis da “pseudo-unidade”.

Os políticos europeus já infligiram um duro golpe em sua própria economia, agravando os problemas econômicos em seus países e elevando os preços dos alimentos, eletricidade e gasolina, constatou, frisando que, como consequência, a União Europeia está perdendo competitividade devido às sanções impostas.

“Por avaliações dos especialistas, neste ano só as perdas das contas da União Europeia por causa da febre de sanções podem ultrapassar US$ 400 bilhões [R$ 2,052 trilhões]. Esse é o custo das decisões afastadas da realidade e tomadas a despeito do senso comum. Esses custos diretamente caem nos ombros da população e empresas da UE”, apontou.

Sobre a inflação nos países da União Europeia, Putin disse que em alguns deles esse indicador já ultrapassa os 20%, enquanto na Rússia se situa nos 16,7% em termos anuais, valor que, segundo o presidente, é bastante elevado e deve ser reduzido. Neste contexto, salientou que o aumento dos preços, em particular, se deve “à política energética falida” do ocidente puxada pelos EUA.

“Ocidente usa a Ucrânia”

Durante seu discurso no fórum, o presidente russo também falou sobre a operação militar que Moscou lançou na Ucrânia em 24 de fevereiro. Segundo ele, “o Ocidente recusou-se fortemente a cumprir suas obrigações anteriores” e era “simplesmente impossível chegar a novos acordos”.

“Para eles [países ocidentais] o início de nossa operação militar especial no Donbass se tornou uma tábua de salvação que lhes permite culpar os outros por seus próprios erros, neste caso, a Rússia”, expressou.

Putin informou que, devido ao “aumento dos riscos e ameaças”, a Rússia foi obrigada a tomar a decisão da operação, que foi “difícil”, mas “necessária”.

“Esta é a decisão de um país soberano, que tem o direito incondicional, baseado, aliás, na Carta da ONU, de defender sua segurança. Uma decisão que visa proteger nossos cidadãos, residentes das repúblicas populares do Donbass, que por oito anos foram submetidos ao genocídio pelo regime de Kiev e neonazistas que receberam a proteção total do Ocidente”, denunciou.

O dirigente russo mencionou que, no caso da separação do Kosovo da Sérvia, que foi realizada “sob pressão dos países ocidentais”, o Tribunal Internacional de Justiça decidiu que, quando um território é separado, por decisão dos cidadãos locais, não é necessário pedir autorização às autoridades centrais.

Levando em conta este fator, as repúblicas do Donbass também não precisam solicitar um “vá em frente” para sua independência, reconhecida pela Rússia, disse ele, acrescentando que Moscou lhes fornece assistência militar de acordo com o artigo da Carta da ONU. “Eles próprios abriram o precedente. Nossas ações são absolutamente legais”, disse Putin. O líder russo também afirmou que Moscou respeitará qualquer escolha de pessoas que vivem em “territórios liberados” da Ucrânia e que atacar áreas fortificadas ucranianas perto de Donetsk, onde atingem áreas residenciais, não tem propósito.

Enquanto isso, a Rússia estará aberta à cooperação em igualdade de condições, declarou o presidente russo. “A primeira coisa é a abertura. Um estado verdadeiramente soberano está sempre determinado a ter uma parceria igualitária, a contribuir para o desenvolvimento global”, disse.

O presidente assegurou que Moscou vai cooperar com as empresas ocidentais que continuam trabalhando com sucesso no mercado russo, e lembrou que todos aqueles que continuam colaborando com a Rússia estão sob pressão dos Estados Unidos e da Europa.

“Às vezes, chega-se até a ameaças diretas. No entanto, essas chantagens pouco significam quando se trata de países liderados por verdadeiros líderes que entendem claramente onde estão os interesses dos outros e onde estão os nacionais, os seus e os de seu povo”, enfatizou o chefe de Estado.

Além disso, ressaltou que a Rússia buscará liderança nas esferas humanitária, cultural e esportiva, e garantiu que nunca seguirá o caminho do auto-isolamento.

No que se refere às entregas de produtos alimentícios aos mercados globais, Putin assegurou que a Rússia não faz obstáculos a isso: “Não fomos nós quem minou os portos ucranianos no Mar Negro. Deixem desminar e retirar [os grãos], e nós garantiremos a segurança de passagem desses navios civis”. Conforme o presidente, há cinco ou seis variantes da retirada dos grãos ucranianos, mas são as autoridades de Kiev que devem decidir como efetuá-la. A pior variante é se a Ucrânia enviasse grãos em troca de armas, disse o presidente.

Sobre a decisão favorável da Comissão Europeia, no último dia 17, para que a Ucrânia se torne candidata a entrar no bloco europeu, Putin afirmou que a Rússia não tem nada contra o movimento, uma vez que a UE não é um bloco militar.

“Sempre fomos contra a exploração militar do território ucraniano, porque isso ameaça nossa segurança, é isso que rejeitamos, mas quando se trata de integração econômica, pelo amor de Deus, a escolha é deles”, disse.

Em relação à Criméia, o presidente declarou que a questão não surgiria se Rússia e Ucrânia tivessem uma parceria.

“Se tivéssemos alianças, apenas boas parcerias, pelo menos relações, bem, isso não teria ocorrido a ninguém, e não haveria problema nem na Criméia”, declarou.

Sobre problemas na economia, o mandatário disse que eles vão aumentar, e que as autoridades sabem disso.

“Sim, entendemos que há dificuldades com cadeias de suprimentos, com componentes, e esperamos que surjam mais problemas. Estamos esperando, eles vão aumentar, estamos cientes disso, mas devemos trabalhar para superar os problemas”, afirmou.

*O SPIEF (St. Petersburg International Economic Forum) é um evento anual que acontece desde 1997 e reúne chefes de organizações internacionais, figuras públicas de renome, acadêmicos de destaque, especialistas e meios de comunicação.