Perseguição de Trump ao aplicativo TikTok visa manter o monopólio das empresas dos EUA na web | Foto: VCG

TikTok, o aplicativo de compartilhamento de vídeo de propriedade da ByteDance com sede na China, disse na segunda-feira (24) que está entrando com um processo questionando a ordem do governo Trump de banimento da empresa nos EUA, no qual rechaça a alegação da Casa Branca de que seja ameaça à segurança norte-americana e aponta tais decisões como “fortemente politizadas”.

Com 100 milhões de usuários norte-americanos, em grande parte jovens, a TikTok tem um quadro de 1.500 funcionários nos EUA, que está em procedimento de ampliação. A TikTok não armazena dados dos EUA na China e seus executivos-seniores da operação norte-americana do aplicativo são norte-americanos baseados nos EUA.

Conforme a ação judicial, a TikTok afirma que o governo Trump não demonstrou “uma ameaça incomum e extraordinária” como a Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional exige, ou forneceu evidências para apoiar seus supostos temores quanto à segurança nacional.

Como registrou a TikTok, “mais de 100 milhões de americanos compartilham e assistem a vídeos curtos por meio do aplicativo, incluindo criadores que dependem do TikTok para sua renda”. A proibição de Trump está “prejudicando irreparavelmente” a comunidade digital que a TikTok construiu.

“Agora é a hora de agirmos”, enfatizou a empresa. “Não julgamos o governo [dos EUA] levianamente, mas sentimos que não temos escolha a não ser tomar medidas para proteger nossos direitos e os direitos de nossa comunidade e funcionários”.

A empresa também argumentou que o governo Trump ignorou os seus extensos esforços para resolver tais preocupações, que – reiterou – conduziu “totalmente de boa fé”, mesmo quando discordava de tais questionamentos.

Em menos de dez dias, Trump emitiu duas ordens executivas contra a TikTok. Em 6 de agosto, a Casa Branca proibiu qualquer transação nos EUA com a ByteDance [a empresa-mãe chinesa], a entrar em vigor em 45 dias.

O pretexto alegado pela Casa Branca foi de que o TikTok coletaria dados pessoais de cidadãos americanos, que seriam compartilhados com o governo chinês e usados para espionagem ou chantagem, sem apresentar qualquer prova. Conforme a ordem presidencial, seria uma ameaça “à segurança nacional, à política externa e à economia dos EUA”.

Em 14 de agosto, Trump assinou outra ordem executiva, exigindo que a ByteDance vendesse sua participação nos Estados Unidos em 90 dias para uma empresa norte-americana e ainda, em público, disse que o Departamento do Tesouro deveria ficar com uma polpuda comissão sobre a transação, que ele próprio admitia, só existiria em função da pressão dele mesmo.

A única vez que a TikTok fora citada por alguma coisa remotamente ligada à política foi quando a garotada que adora o aplicativo, o usou para fazer um tipo de trote, uma campanha de reserva de lugar naquele comício de Tulsa de Trump, levando a arena a ficar bem esvaziada, quando a crença da campanha do bilionário era que ia bombar.

Segundo o New York Times, em reportagem do dia 9 de agosto, até mesmo a CIA desmentiu Trump sobre a “espionagem via TikTok”. “Sim, os analistas da agência disseram à Casa Branca de que é possível que as autoridades de inteligência chinesa possam interceptar ou usar o aplicativo para ter acesso a telefones móveis. Porém, não há nenhuma evidência de que o tenham feito”.

Com esse processo, a TikTok se torna a primeira corporação chinesa a lutar nos tribunais dos Estados Unidos contra a política de Trump de perseguição às mídias sociais chinesas e às empresas chinesas de alta tecnologia, em meio a uma escalada da guerra tecnológica, comercial e tarifária.

Caso um tribunal federal decida a favor da TikTok, o governo Trump pode ainda apelar para a Suprema Corte dos EUA. Uma decisão favorável ao TikTok levaria qualquer resolução para o próximo governo.

A Casa Branca também emitiu uma ordem executiva neste mês proibindo efetivamente o aplicativo de mensagens chinês WeChat, e já havia procurado conter a expansão global das empresas de telecomunicações chinesas Huawei e ZTE, entre outras, sempre por supostas questões de segurança nacional.

Pretextos à parte, as ordens executivas de Trump são vistas como uma tentativa de Washington de barrar o avanço das plataformas chinesas, que estão deixando para trás, em funcionalidade e criatividade, as gigantes norte-americanas, como Facebook, Amazon e Google.

TikTok tem 800 milhões de usuários. A plataforma multipropósitos WeChat, de propriedade da TenCent, tem 1 bilhão de usuários no mundo inteiro e nos EUA é utilizada diariamente por 19 milhões de pessoas.

Ao anunciar a ida aos tribunais na semana passada, a Byte Dance classificou o ataque que vem sofrendo de “pirataria dos tempos modernos”.

Analistas advertem ainda que essa política de Trump ameaça dividir e balcanizar a internet.

Já quanto ao ‘risco de ser espionado pelo chineses’, o que ainda não foi provado, é mínimo diante do comprovado, desde Edward Snowden, de que são os EUA que grampeiam o planeta inteiro, dia e noite, com a colaboração dos monopólios norte-americanos de telecomunicações e web e da rede “Five Eyes”, o sistema de monitoramento global que inclui, além de Washington, a Inglaterra, Canadá, Austrália e Nova Zelândia.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, na entrevista regular das segundas-feiras, disse que Pequim apoia as empresas que usam meios legais para salvaguardar seus direitos e interesses legítimos e continuará a tomar todas as medidas necessárias para salvaguardar resolutamente os direitos e interesses legítimos das empresas chinesas.

Por sua vez a porta-voz da chancelaria russa, Maria Zakharova, chamou os éditos de Trump contra o TikTok de “outro exemplo flagrante de concorrência desleal”. Ela disse que não passavam de uma “manobra descarada” para forçar uma empresa chinesa “a ser absorvida por um concorrente dos EUA”.

Zakharova questionou, ainda, se tais métodos assumidos abertamente por Trump “para manter o monopólio dos gigantes da web americanos” poderiam ser considerados de acordo com “o direito internacional e os valores democráticos”.