Ricardo Salles participa de audiência pública na Câmara

O delegado da Polícia Federal, Alexandre Saraiva, que foi afastado da superintendência do órgão no Amazonas por ter denunciado o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por favorecimento a madeireiros que atuam ilegalmente na região, afirmou que nunca havia presenciado algo assim durante seus quase 18 anos de atividade na corporação.

Em entrevista ao jornal O Globo, o delegado fez críticas à postura adotada por Ricardo Salles na área onde uma carga gigantesca de madeira ilegal foi apreendida.

“Em relação a isso, a conduta dele nós descrevemos na notícia-crime que enviamos ao STF. Num primeiro momento, ele colocou em dúvida o trabalho da PF. Em um segundo momento, foi uma conduta que patrocinava justamente a ação dos criminosos. Nos pareceu que a conduta toda favorecia os criminosos. Quando recebemos os documentos dos madeireiros e analisamos, verificamos ainda mais fraudes. Foi quando nós começamos a redigir o documento para o STF. Isso não era uma opção para mim. É um poder-dever. Era uma obrigação. Se fosse uma pessoa sem foro, instauraríamos o inquérito. Como tinha foro privilegiado, comunicamos ao Supremo”, comentou.

“Ele estava atuando e favorecendo os madeireiros e isso foi feito de uma forma muito explícita. Tem vídeo dele apontando para a placa de uma empresa investigada que segundo ele ‘estava tudo certinho’ e que, na verdade, em relação a esta empresa, já existia até laudo pericial apontando as ilegalidades cometidas”, disse Saraiva.

Alexandre Saraiva enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF), na semana passada, uma notícia-crime contra o ministro e o senador Telmário Mota (PROS-RR), afirmando que ambos estavam praticando advocacia administrativa em favor dos madeireiros e tentando atrapalhar a atuação da PF.

“Comunicamos a prática de obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do poder público, o embaraço à investigação de organização criminosa e a advocacia administrativa”, observou o delegado.

A intervenção do ministro do Meio Ambiente para obstruir as investigações ocorreu após a maior apreensão de madeira ilegal da história, na divisa do Pará com o Amazonas, durante a operação Handroanthus, no final do ano passado.

A operação apreendeu mais de 200 mil metros cúbicos de madeira, avaliados em cerca de R$ 130 milhões, no fim de 2020.

Salles foi até a área onde estava a madeira apreendida e tentou desqualificar as autoridades responsáveis pela operação.

Saraiva reforça a denúncia contra Salles e classificou como “desnecessária” a proposta do ministro de criar uma espécie de “patrulha armada” para realizar operações de combate ao desmatamento.

“Essa proposta é desnecessária para dizer o mínimo. Nós já temos a PF, Ibama e ICMBio para fazer isso. São instituições que têm uma ampla experiência e não haveria necessidade de mais uma força para realizar esse trabalho”, afirmou.

Indagado sobre se, após 11 anos trabalhando na Amazônia, algum outro ministro do Meio Ambiente fez ingerência ou criticou o trabalho realizado pela Polícia Federal no combate ao desmatamento, Saraiva disse que tal coisa jamais ocorreu.

“Nenhum outro ministro fez o que foi feito agora. Veja… o braço do MMA é o Ibama e ICMBio. Nas operações da PF, a gente prefere fazê-las junto com o Ibama, porque as ações administrativas e punitivas do Ibama complementavam o trabalho nosso. E, nos últimos anos, isso deixou de acontecer. E faz muita falta não ter o Ibama em campo”, explicou.

Ricardo Salles é um ministro que Bolsonaro prestigia e o mantém no cargo porque aplica a política que ele quer implementar no meio ambiente.

A notícia-crime contra Salles no STF tem a relatoria da ministra Cármen Lúcia.