Por todo o país, movimentos de evangélicos progressistas e de esquerda têm surgido buscando se contrapor à concepção — em geral deturpada do Evangelho — que se tornou hegemônica nos últimos anos, principalmente no ramo pentecostal, e que serviu de base para o alinhamento de muitos desses setores ao bolsonarismo. Nesse amplo movimento, estão também os comunistas do PCdoB.

Os militantes evangélicos do partido vêm trabalhando para construir uma rede de diálogo com o objetivo de fortalecer, junto à sociedade e no âmbito das congregações, o outro lado dos evangélicos, daqueles que não compactuam com pautas identificadas com a extrema-direita e, assim, buscar uma alternativa política para o país, baseada na igualdade, no respeito, na tolerância e no Estado laico.

Neste sentido, o PCdoB-RJ está realizando, na noite desta segunda-feira (10) um debate aberto aos militantes evangélicos comunistas e simpatizantes (saiba mais abaixo), com o objetivo de discutir a situação do Rio no que diz respeito especialmente à violência do Estado, aos processos de privatização e à corrupção, entre outras questões.

O evento on line terá as participações de João Batista Lemos, presidente do PCdoB no Rio de Janeiro, e de Priscilla Ribeiro, uma das coordenadoras do núcleo RJ da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, movimento que reúne cerca de 30 mil lideranças no Brasil.

“Comunista vem de comum, comum a todos. Somos seguidores de Cristo porque pregamos o compartilhar. E todo o conceito bíblico fala sobre isso. Você não tem mérito de nada; tudo o que você tem é de Deus e, por consequência, é de todos”, explica Cláudio Nunes, secretário de Finanças do PCdoB de Macaé, um dos coordenadores do núcleo do Rio da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito e um dos organizadores do debate.

Ele diz que a meritocracia, tão em voga no país e que também faz parte do discurso de parte das lideranças evangélicas à direita, “é a base do capitalismo, do conceito de discriminação. E isso não está na Bíblia”. Ele destaca que os evangélicos progressistas valorizam o conceito de Estado laico porque “entendemos que é desta forma que tem de ser feito; vivendo num Estado laico, temos a garantia da liberdade religiosa.

Instrumentalização do capitalismo

Samuel Oliveira, militante do PCdoB em São Paulo, estudante de Teologia e de Filosofia, membro do movimento pela Bancada Evangélica Popular e da Comunidade Cristã na Zona Leste, explica que “a participação política evangélica atualmente é resultado de um longo processo de instrumentalização do capitalismo e suas expressões sobre igrejas e a fé cristã, assim como em outras instituições da sociedade”. Ele avalia que “a introdução de pseudo-teologias no movimento evangélico, como a Teologia da Prosperidade, tem prestado um papel de distorção dos verdadeiros valores do Evangelho de Cristo, a saber, que prega a justiça social à classe oprimida e contra estrutura de dominação classista. Com essa manipulação a massa de fiéis que, sem criar dimensão e consciência de fé e de classe, diabolicamente cegados por uma estrutura de abuso de poder eclesiástico, seguem e dão base política e popular de sustentação de projetos elitistas e até com tendências fascistas, vide esse apoio à Bolsonaro”.

O militante comunista aponta que “não diferente ao conjunto da população, a classe trabalhadora, é preciso ofertar a essa base que tem verdadeiro poder político (mesmo que não saiba), consciência de sua classe e o contexto de luta em que vivem. Os evangélicos precisam saber que os princípios que movem nossa fé e que estão nas Sagradas Escrituras, são valores que rompem com a proposta de desigualdade e trazem uma mensagem de libertação revolucionária do povo oprimido para viver de forma comum, em comunhão com toda a criação”.

Samuel lembra que “nós comunistas temos um projeto de vida em sociedade que mais representa essa vontade divina de vida em comunidade, de justiça, de paz, de fraternidade, de compartilhamento e igualdade”.

De acordo com Samuel, “nosso movimento de evangélicos progressistas, de esquerda, tem sido imprescindível para o cenário político brasileiro. Ora, se há uma base de projetos neoliberais no Brasil que os sustenta há anos e tem cada vez mais se fidelizado, é necessário que haja um contraponto. Ninguém melhor que nós próprios, evangélicos, para falar ao nosso setor algo que destoe dessa visão homogeneizada de nossa fé”.

O estudante não acredita que “Jesus foi precursor do comunismo, e nem que Marx traduziu politicamente o cristianismo”, mas avalia que “ambos convergiram, sem diferença, em apresentar a seu público e em seu tempo um proposta de sociedade que superasse a sociedade de classes”.

Samuel conclui que “quando olho o Evangelho e também o Manifesto do Partido Comunista, não consigo ver divergência. Ambos valorizam a humanidade e a criação. Caminham para um mesmo objetivo de uma sociedade liberta do julgo da escravidão à classe dominante. São uma mensagem para o povo pobre e trabalhador galgar uma sociedade livre das estruturas de classe e viver uma experiência de vida comum para todos e todas. Livres de opressões, pobreza, injustiças, mortes, guerras e classes”.

 

Para participar do evento do PCdoB-RJ, a partir das 19h, inscreva-se aqui

 

Por Priscila Lobregatte