A inflação em disparada, que tornou o preço das carnes proibitivos no Brasil, está mudando radicalmente o que os brasileiros põem na mesa. Pé de frango, pescoço e moela. Para as famílias mais pobres, restos e ossos.

Com preço da carne bovina nas alturas, as famílias estão buscando as opções viáveis para as rendas, que estão cada vez mais incompatíveis com o custo de vida. Ainda que mais barata que a carne vermelha – os cortes de segunda estão custando, em média, R$ 30,30 o quilo – o frango também subiu: no ano, a alta acumulada é de 43% segundo pesquisa do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Universidade de São Paulo. Em janeiro, o frango inteiro estava R$ 5,90 o quilo. Hoje, não se encontra por menos de R$ 8,40.

A parte mais barata do frango, o pé, subiu 100% no período, passando de R$ 2,50 o quilo para R$ 5 no atacado. Comparada às outras opções, é o que cabe atualmente no bolso.

“O preço do frango aumentou mais que o de outras carnes, mas o consumidor vê que ainda está mais em conta que a bovina e a suína”, explica o pesquisador Luiz Gustavo Susumu, da USP.

Reportagem do Estadão ouviu o vendedor de carne Henrique Laureano, que afirma que a disparada do preço do frango se dá em função do aumento não regulado das exportações, dos custos de produção (energia e ração) da queda do poder aquisitivo da população – uma vez que não dá pra comprar carne, mais gente passa a procurar frango, insuflando uma demanda que não acompanha a capacidade de produção.

“Outros cortes mais baratos, como o pescoço e a moela, também estão tendo maior procura”, disse.

Ele explica que cortes mais nobres do frango também subiram porque passaram a ser opção para quem consumia carne bovina. O peito com osso subiu de R$ 6,60 para R$ 10,80 no atacado – alta de 63% – e o filezinho de R$ 8,50 para R$ 14 – aumento de 65%.

“Houve um aumento de 40% a 50% nos cortes do frango de janeiro até agora, mas só foi possível porque as outras carnes também estão caras. O preço do frango está sendo puxado pelo aumento nos insumos, como milho, soja, combustível e energia”, explicou.

O granjeiro Elton Luis de Miranda contou que a água e energia elétrica são o principal problema da sua criação de aves. Para reduzir o gasto com energia, ele instalou um sistema de caldeira a lenha no aviário. “Mas a lenha também subiu, pois custava R$ 50 o metro cúbico no início do ano, hoje está a mais de R$ 100.”

O criador Alcides Pavan, da Granja Roseira, cita o preço dos grãos, especialmente o milho e o farelo de soja, que representam 70% do custo de produção.

Carestia

A inflação oficial do país medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumula alta de 9,68% em 12 meses, muito distante do teto da meta estipulada pelo governo, que além de acabar com os estoques reguladores só faz aumentar os juros que não derrubam a inflação, penalizando ainda mais os investimentos e o consumo da população.

Para os mais pobres, a inflação chega em percentual maior: segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), as famílias de baixa renda sentem variação nos preços de 10,63% em 12 meses até agosto, já que a maior parte da sua cesta de consumo é de produtos de primeira necessidade, como alimentos, energia elétrica residencial e gás de botijão.

Nesse período, o maior impacto foi na inflação de alimentos em domicílio, cujo avanço foi de 16,6%; a energia elétrica residencial, que teve aumento de 21,1% em 12 meses; o gás de botijão, com 31,7% de aumento; além do avanço dos preços nos medicamentos, de 5,6%.