“Perder votação não é problema. No entanto, essa votação teve um significado diferente. Ela expressa bem o momento que estamos vivendo. Um momento em que os valores estão muito rebaixados. O que se vivenciou naquele Ministério foi a demonstração mais aguda da arrogância de um ministro contra uma instituição eleita. O que aconteceu hoje foi a submissão ideológica a um governo e não a expressão da altivez de uma comissão neste Parlamento.” Com esta declaração, a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) lamentou a rejeição do requerimento de sua autoria para convocar o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, para prestar esclarecimentos sobre o fim da pandemia na Comissão de Seguridade Social da Câmara.

Por 24 votos contrários e 13 favoráveis, a base governista blindou Queiroga e impediu sua convocação ao colegiado, mesmo assumindo que a atitude do gestor da Saúde era “indefensável”. Com isso, ficou mantida a data sugerida pelos aliados do governo para que o ministro vá à comissão no dia 15 de junho. No entanto, sem convocação, Queiroga não é obrigado a responder aos questionamentos dos parlamentares.

Desta vez, a praxe da conversão do pedido de convocação em convite foi repelida pela autora do requerimento. Isso porque, no dia 18 de maio, numa reunião no Ministério da Saúde, Queiroga desrespeitou parlamentares da Comissão de Seguridade, bateu boca, afirmou que estava de “saco cheio” de críticas pela pandemia que já vitimou mais de 660 mil brasileiros e ainda trucou os parlamentares a convoca-lo.

“Após o ministro se negar a vir à Comissão, fomos num grupo de 20 deputados ao Ministério da Saúde, pois queríamos abordar os impactos técnicos do fim da pandemia. Queríamos saber se não haveria a possibilidade de aumentar o prazo, pois isso impacta estados e municípios para contratações e compras, por exemplo, a vacinação havia estagnado, era preciso retomar campanhas. Mas o destempero do ministro foi abrupto. Disse que não tinha que pactuar nada com estados e municípios, que especialistas e cientistas eram um bando de fajutos e que se a comissão quisesse que o convocasse; e que se o Congresso não estivesse satisfeito que aprovasse um PDL para rever o fim da pandemia. Isso tudo num elevado tom. Não nos deixava mais falar. Foi uma situação muito desagradável e desrespeitosa com toda a comissão”, explicou Jandira Feghali ao rejeitar a tentativa de transformação do pedido de convocação em convite.

O deputado Luiz Lima (PL-RJ), que havia feito a sugestão, voltou atrás após ouvir a explicação da parlamentar comunista. “Embora estejamos de lados opostos, acredito que todas as pessoas que ocupam o Executivo têm que ter respeito à Câmara e à divergência política. Peço até desculpa pelo pedido de conversão em convite”, afirmou.

A solidariedade se estendeu a parlamentares de diferentes legendas. A vice-líder do governo, deputada Carla Dickson (União-RN), chegou a afirmar que “não tinha como defender o indefensável”, mas não abdicou do seu papel de base para defender a altivez do colegiado.

“Eu gostaria de estar com um discurso diferente, mas eu estava nessa reunião e eu não tenho o que retirar ou acrescentar no que foi falado por Jandira. Mas faço meu papel como vice-líder do governo e insisto na data do dia 15. Mas fico triste. Gostaria que a reunião tivesse tomado outro rumo, termos saído com respostas. Eu tenho um senso de responsabilidade e de consciência do que aconteceu ali e não tenho como defender o indefensável”, pontuou Dickson.

Apesar da fala, a parlamentar orientou pela rejeição do requerimento e solicitou a verificação nominal da votação que havia sido simbólica e sem manifestações contrárias, além da dela. Com a verificação dos votos, deputados da base endossaram a postura de Queiroga.

“A maioria já decidiu que não há necessidade de se convocar o ministro. Eu não me senti desrespeitado. Mas se houve alguma grosseria, certamente o ministro se retratará”, disse o governista Hiran Gonçalves (PP-PR), após negar a convocação de Queiroga.

Para Jandira, a decisão do colegiado colocou a comissão “de joelho ao desrespeito do ministro”. “Não há argumento técnico que justifique a retirada do estado de emergência diante, inclusive, do aumento dos casos de Covid que estamos vivendo. Não podemos nos submeter ao destempero e ao desrespeito aos cientistas; abaixar a cabeça ao ouvi-lo dizer que não fará pactuação com os entes federados; muitos menos sermos tratados aos gritos. Lamento que esta comissão tenha perdido a oportunidade de cumprir seu papel e convocar o ministro para prestar os devidos esclarecimentos”, disse a deputada.

Caso Queiroga não compareça ao colegiado no dia 15, partidos da base de Bolsonaro se comprometeram a aprovar a convocação do chefe da Saúde.
Por Christiane Peres

 

(PL)