Áñez é também acusada de ordenar massacres após auto proclamar-se presidenta

A ex-presidente auto-proclamada da Bolívia, Jeanine Áñez, foi detida no sábado (13) acusada de “terrorismo, conspiração e sedição” por conta dos eventos que sucederam à renúncia sob pressão do ex-presidente boliviano Evo Morales, em novembro de 2019.

O mandado de prisão partiu do Ministério Público da Bolívia. Segundo esclarece o órgão, “ela (Áñez) poderia ter vindo desde dezembro dar seu depoimento e trazer sua opinião… não o fez e o que assinala o Código de Procedimento Penal é que se deve ativar as instituições processuais. Uma pessoa que não quer atuar de acordo com a Justiça, que não quer responder aos tribunais, tem que ser submetida ao curso da institucionalidade. O Ministério Público atuou e assim a polícia”.

O ministro do Governo, Eduardo del Castillo, garantiu na manhã deste sábado que as prisões realizadas de Jeanine Áñez e dois de seus ex-ministros buscam justiça diante dos fatos que cercaram a auto-proclamação de seu governo.

“É preciso deixar claro que este governo democraticamente eleito não persegue ninguém politicamente, o que faz é garantir que haja justiça em nosso país”, disse em breve entrevista coletiva na Força Especial de Combate ao Crime (FELCC) de La Paz, para onde Áñez foi levada para prestar depoimento sobre os delitos cometidos após ser detida na cidade de Trinidad, no departamento [equivalente a nosso estado] de Beni.

Na véspera, os ex-ministros Álvaro Coimbra, da Justiça, e Rodrigo Guzmán, de Energia, também foram detidos no âmbito das investigações sobre o caso instaurado pela ex-deputada do Movimento Ao Socialismo (MAS), Lidia Patty, em dezembro de 2020.

Evo Morales renunciou ao governo após acusações de fraude eleitoral contra sua reeleição para um terceiro mandato em novembro de 2019. As correntes de extrema direita se aproveitaram da fresta aberta por Evo pelo desrespeito ao resultado do Referendo de 2016 que lhe negara mais uma reeleição.

À época, a Organização dos Estados Americanos (OEA) publicou um suspeito relatório preliminar argumentando supostas irregularidades no processo, e o chefe da organização, Luis Almagro, pediu a anulação das eleições, no que resultou em um movimento orquestrado envolvendo a Polícia Nacional e setores das Forças Armadas.

Foi dessa forma estabelecido um governo de fato presidido por Áñez, que reprimiu duramente as manifestações a favor de Morales e contra a usurpação do poder por ela e seu entorno. Os atos de repressão registrados, nos quais 37 bolivianos perderam a vida e mais de 800 ficaram feridos, incluem os massacres de Senkata e Sacaba.

Morales exilou-se no México e Áñez, que na época era a segunda vice-presidente do Senado boliviano, se autoproclamou presidente interina do país, em sessão legislativa sem quorum.

O presidente da Câmara Boliviana de Senadores, Andrónico Rodríguez Ledezma, também negou a suposta perseguição política denunciada por Áñez, afirmando que se trata de “justiça”.

“Aqueles que hoje se dizem vítimas de perseguições políticas deveriam ter pensado mil vezes antes de violar a ordem constitucional em novembro de 2019”, disse Rodríguez Ledezma, segundo nota divulgada pelo Senado.

SACABA E SENKATA

A Ouvidoria Pública da Bolívia publicou um relatório sobre os massacres de Sacaba e Senkata no qual conclui que o Governo de Jeanine Áñez cometeu crimes contra a humanidade ao encabeçar a execução de “assassinatos sistemáticos contra a população civil”.

O relatório “Crise de Violação do Estado de Direitos Humanos na Bolívia Outubro-Dezembro 2019”, descreve a violação de direitos nos acontecimentos violentos que deixaram 37 mortos, 27 deles durante a intervenção conjunta da Polícia e das Forças Armadas em Sacaba, Senkata e em bairros do Sul de La Paz.

De acordo com o mandado de prisão, existem elementos suficientes de condenação quanto à provável participação dos acusados nos crimes e estabelece o risco processual de fuga pelo fato de os acusados possuírem fluxo migratório ativo, conforme estabelecido na certidão migratória, o que “comprova a facilidade que possuem para sair do país, o que torna esse risco processual ”.

O presidente Luis Arce, que assumiu o cargo em novembro de 2020, afirmou que ao chegar ao poder, além de se deparar com um desastre na economia e nas condições de vida da população, teve que tomar medidas lutando contra o tempo para enfrentar a pandemia mundial, que na Bolívia já infectou 258.324 pessoas, deixando 13.930 mortos, em uma população de 11 milhões de habitantes.

Legenda: Áñez é também acusada de ordenar massacres após auto-proclamar-se presidenta (El Tiempo)