John Shipton, pai de Assange, afirma que seu filho e o WikiLeaks “expuseram a extensão da criminalidade cometida pelos EUA e aliados”

Em entrevista na RT ao laureado jornalista Chris Hedges, o pai de Julian Assange, John Shipton, afirmou que seu filho e o WikiLeaks “expuseram a todos nós a extensão da criminalidade e corrupção cometidas pelos EUA e seus aliados” e chamou de “espelho” dessa ignomínia à perseguição brutal contra o jornalista ao longo de 11 anos, desde que publicou os crimes de guerra e tortura no Iraque, Afeganistão e Guantánamo.

Shipton, que tem se dedicado a salvar a vida de Julian Assange e impedir sua extradição para os EUA, destacou o significado da luta pela verdade de seu filho, seu efeito profundo. Lembrando o peso que as suas revelações tiveram, ele observou que as guerras do Iraque e Afeganistão, que já foram consideradas “sem fim”, terminaram. “Esses são os presentes de Julian [Assange], de Chelsea [Manning] e do WikiLeaks para o povo dos Estados Unidos e para os povos do Reino Unido e da Austrália.”

As revelações deles “levaram um tempo para chegar ao público” e em especial ao povo dos EUA, “que inventou por si próprio a expressão ‘guerras sem fim’. Essa expressão não veio de cima para baixo, ela se ergueu de baixo para cima”.

As revelações criaram no povo norte-americano “uma compreensão que levou as guerras a acabarem. A guerra do Iraque acabou. A guerra do Afeganistão acabou”. Guantánamo – acrescentou – “está a ponto de ser fechado”.

Em 10 de dezembro, o Tribunal Superior de Justiça do Reino Unido decidiu que Assange poderia ser extraditado para os Estados Unidos, sob a lei de espionagem norte-americana e ameaçado por até 175 anos de cárcere, anulando decisão anterior de um tribunal inferior. A defesa de Assange entrou com uma apelação contra a nova decisão.

Para Shipton, na avaliação da perseguição e tortura a Julian Assange não se deve subestimar “o papel inglês, suas instituições de governo, seu judiciário”, como não havia limite para o suborno, a violação da lei, a infâmia.

Perseguição cometida por gente “que vai trabalhar, assina outro instrumento de tortura de Julian Assange, volta para casa e toma uma taça de vinho. É chocante”.

“Gente insignificante que sobe sobre cadáveres para parecer importante. É nauseante de ver”.

Perseguição de que é prova “o contínuo declínio” das condições de saúde e de estabilidade de Assange, ele registrou, denunciando a incessante difamação contra seu filho realizada “pelas bocas mais selvagens, as mais viciosas e odientas, as mais inescrupulosas”, que cercaram Assange “como um tornado”.

Livro de Nils Melzer

Ao abrir o programa, Hedges, vencedor do Prêmio Pulitzer de jornalismo, denunciou a “execução de Julian Assange em câmara lenta” e se referiu ao livro do Relator Especial da ONU para Tortura, Nils Melzer, sobre a operação de ‘assassinato de caráter’ a que o jornalista foi submetido, até ser arrancado da embaixada em que se asilara, encarcerado em uma penitenciária de segurança máxima e levado a julgamento para extradição.

Em que Melzer adverte que quanto mais o processo judicial se arrastar e mais se deteriorar a saúde e estabilidade de Assange, ou caso ele morra na prisão, do ponto de vista dos EUA “mais forte será o efeito de intimidação sobre outros jornalistas denunciantes”.

Shipton disse ter ficado sabendo pelo livro de detalhes sórdidos, como as autoridades inglesas terem tirado o kit de barba de Julian Assange para que ele chegasse com má aparência à audiência.

Em setembro, Julian Assange e seus advogados pediram à juíza Vanessa Baraitser que ele pudesse ficar fora da jaula de vidro [usada em julgamentos de terroristas] na audiência, e pudesse sentar junto aos seus defensores como é normal, mas ela disse não.

Julian Assange tinha de ficar de joelhos para poder se comunicar com o advogado por uma pequena fresta, enquanto este tinha que ficar na ponta dos pés para poder falar. Esse era o nível de desrespeito aos mais elementares princípios de tratamento de réus.

“Isso foi feito continuamente por três semanas”, relatou Shipton.

Ele assinalou que Baraitser foi promovida depois do julgamento. “Promovida por tratar gente da forma mais chocante”. O entrevistador lembrou que, de forma análoga, o juiz norte-americano que condenou Chelsea Manning foi promovido “depois de fazer o trabalho sujo”.

Shipton também falou sobre a situação de Julian Assange na Guantánamo britânica e seu confinamento na ala de enfermaria. Onde outros presos eram loucos, alguns não tinham perna ou braço, havia um doente terminal de câncer que gritava dia e noite.

Para tirar Assange dali, foram precisas não uma, mas três petições dos prisioneiros de Belmarsh, até ser atendida. “Os presos tinham mais humanidade do que os responsáveis pela prisão”.

Shipton agradeceu ao imenso apoio que seu filho Assange tem recebido, lembrando as manifestações por sua libertação de parlamentares brasileiros, franceses, gregos, australianos e de outras partes do mundo, o abraço que recebeu o ex-presidente brasileiro Lula, a indignação de personalidades como Roger Waters (do Pink Floyd). “É o que me dá energias para prosseguir”, completou.

Quanto ao fato de que os jornais que publicaram as denúncias do WikiLeaks – New York Times, Washington Post, Le Monde, The Guardian, El País, Der Spiegel – tenham “virado as costas a Assange”, ele se disse desapontado “mas não surpreso”. Assange publicou “exatamente o que todos eles publicaram”, sublinhou.