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Se um ex-tenente reformado como capitão, bronco, rude e despreparado se elegeu presidente da República, por que um cidadão sem eira nem beira não pode conquistar uma cadeira de vereador?

Eis a questão posta por muitos candidatos às Câmara Municipais que recorrem a todo tipo de artificialismo e disparam mensagens mentirosas aos milhares endereçadas a possíveis eleitores.

Não importa o que se diz nem as imagens supostamente atraentes veiculadas em vídeos e cards, vale a busca mecânica do voto.

No segundo turno do último pleito presidencial, dentre os milhares de vídeos mentirosos circulou um em que o então candidato Fernando Haddad aparecia queimando um exemplar da Bíblia e em seguida pondo numa lata de lixo o que restou do livro. Falso, mas tecnicamente tão bem feito que parecia autêntico.

Leio hoje na Folha de S. Paulo que candidatos a vereador replicam histórias de vida e propostas compradas na internet a empresas de marketing, que comercializam pacotes prontos com mensagens de WhatsApp e santinhos virtuais.

É a massificação da mentira pessoal, do perfil falso e do artifício enganoso para atrair eleitores ingênuos e desavisados.

A matéria cita uma empresa que teria investido cerca de 100 mil reais no Facebook para se tornar conhecida e pontificar como uma das agências que oferecem ebooks com “táticas para engajar internautas, santinhos virtuais editáveis, mensagens prontas para publicação e até listas de slogans e frases motivacionais, que vão de Aristóteles a Steve Jobs, para animar o público cobiçado.”

Como já passei de sete décadas de vida e participo da luta política desde a adolescência, posso dizer que já vi muita coisa estranha.

Não são poucos os mecanismos de “compra” do voto praticados até hoje, mesmo sob legislação restritiva, por candidatos de muita ambição e nenhum escrúpulo.

Mas essa do kit mentira para uso digital me surpreende, assim usado pela “base”.

De fato, a onda conservadora que sataniza a política e ao mesmo tempo a pratica das formas as mais enganosas contamina (temporariamente, espero) uma parcela considerável da população.

Bolsonaro e seus mentores norte-americanos fazem escola.

Que os meios digitais devam ser usados, tudo bem. Sobretudo numa campanha sob constrangimentos decorrentes da pandemia do novo coronavírus. Mas que se faça o trabalho político corpo a corpo e que se conquiste a consciência, a confiança e apoio ativo do eleitor. Para que a verdade a desfaçatez.

 

*Luciano Siqueira é médico, vice-prefeito do Recife e membro do Comitê Central do PCdoB

 

(PL)