Por Ronald Ferreira dos Santos*

Como vem comprovando a CPI do Senado, respaldada por amplo apoio popular, essa tragédia é resultado da conduta criminosa e irresponsável do presidente. O governo brasileiro se omitiu de socorrer as pessoas, revelou a mais absoluta negação da ciência, estabeleceu uma guerra cultural através de potente comunicação, levou as pessoas ao encontro do vírus sem as devidas medidas sanitárias, promovendo o falso sentimento de proteção, com propaganda mentirosa da eficácia de medicamentos. O estratégico complexo econômico industrial da saúde, para a produção nacional e integrada de vacinas, foi vitimado com o corte de investimentos em ciência e inovação. A cada depoimento, novos indícios de que, por razões de cálculo político, foi sabotada uma estratégia nacional integrada, com bases científicas e em defesa da vida, para o combate ao SARS-CoV-2, ao custo de milhares de vidas. São muitos os crimes sanitários e contra a vida.

Atualmente os desafios para a defesa dos Direitos se avolumaram para dimensões colossais, e no caso da saúde estamos falando de vida e morte. Na saúde, dois pilares são fundamentais. O primeiro diz respeito à resistência aos mais violentos ataques à saúde como direito e aos princípios e diretrizes do SUS, realizados por forças que buscam uma contratação social para essa atividade aos moldes anteriores a 1988. O outro pilar de desafios trata da formulação de políticas que possam desenvolver o SUS, na direção da superação de seus gargalos, que não são poucos. Portanto, nossos desafios são muito grandes: o debate da saúde como direito, que considere a soberania nacional e os interesses do nosso povo e da nossa Nação, precisa transformar-se em soluções para que o Direito à Saúde seja materializado na garantia do acesso às ações e aos serviços de saúde.

Os grandes desafios do SUS de hoje são na verdade os desafios de sempre, de ontem e de amanhã:  promover a atenção primária (Estratégia da Saúde da Família), a vigilância em saúde, a assistência farmacêutica, a estruturação hospitalar em todos os níveis de atenção, a descentralização regional e municipal, garantindo acesso universal e resolutividade. Valorizar o Trabalho em Saúde, que com os insumos estratégicos é quem produz de fato do direito à saúde, constituir e investir na Carreira do SUS, no trabalho em equipe multiprofissional, na educação permanente, no aperfeiçoamento, na especialização e formação em saúde em serviço e comunidade para garantir o vínculo entre a população, as equipes de saúde e o SUS. Fortalecer a comunicação em saúde para as comunidades, garantindo amplo acesso à internet nos territórios, efetivar ações de promoção e cuidados integrais em saúde mental, nas famílias, empresas e comunidades, promover a proteção aos vulneráveis e a equidade em saúde, apoiar a Saúde da Mulher e redobrar os cuidados materno-infantil, garantir a Saúde Bucal, fortalecer atenção integral à saúde dos trabalhadores/as e garantir a participação da comunidade no controle social do SUS.

Além disso, para garantir a eficácia e eficiência do SUS, é necessário promover os investimentos estratégicos no desenvolvimento e ampliação do complexo econômico industrial da saúde, destinados a garantir a produção de Imunobiológicos, vacinas, equipamentos, medicamentos, ingredientes farmacêuticos ativos, intermediários de síntese, além da construção de plataformas tecnológicas, baseadas no domínio da biotecnologia moderna, na engenharia genética e na bioprospecção da flora e fauna de forma sustentável, garantindo às indústrias nacionais, farmacêuticas, farmoquímicas, biotecnológicas e de equipamentos, sejam públicas ou privadas, as condições necessárias para a produção nacional dos insumos estratégicos para a saúde, economizando divisas e garantindo a verticalização da produção interna e a nossa autossuficiência nacional neste setor vital da economia e da vida. Superar a dependência internacional e vulnerabilidade nacional. Integrar saúde, economia, meio ambiente inovação e produção é uma necessidade do século XXI.

A Emenda (In)Constitucional 95 que que afasta o Estado Brasileiro de suas obrigações, que impôs o teto de gastos, precisa ser revogada para que a União aplique, no mínimo, 10% das suas receitas correntes brutas, rompendo com o crônico subfinanciamento e o recente desfinanciamento.

O Sistema Único de Saúde (SUS), com mais de 31 anos de implantação, tem sido uma alternativa presente para a maioria da população no enfrentamento à pandemia, com um esforço notável de seus trabalhadores, gestores e equipes que atuam com dificuldades de coordenação e grandes desafios para cumprir a sua missão constitucional da universalidade, integralidade e equidade. Mais do que nunca, lutar pela saúde significa lutar pelo Brasil.

Fortalecer o SUS se impõe como uma necessidade imperativa ao povo. Segundo o IB-GE, 75% da população brasileira dependem exclusivamente das ações assistenciais do SUS, e em algumas regiões do país este percentual chega a 90%. Já as ações de proteção, de vigilância em saúde, muitas vezes invisíveis, sobre algumas das quais a pandemia colocou luz, são 100% atribuições do SUS.

A Constituição Federal de 1988 vem sendo atacada desde sua promulgação, o que impôs barreiras para efetivação de políticas públicas que dessem materialidade aos seus apontamentos, como o Direito à Saúde e ao Bem-Estar Social. Todavia, os mais duros destes ataques foram feitos justamente ao caráter Democrático e de Direito do Estado. Os graves ataques à democracia e aos direitos do povo brasileiro que caracterizam a atual conjuntura exigem mobilização que aponte para a construção de uma ampla frente política e social para o enfrentamento das forças do atraso, ultraliberais, conservadoras e autoritárias. O SUS tem sido impactado direta e indiretamente por essas nefastas forças, fazendo da sua defesa a própria defesa do Estado Democrático de Direito.

 

*Farmacêutico. Coordenador da Comissão Nacional de Saúde do PCdoB. Membro da Direção Estadual do PCdoB de SC. Membro do Comitê Municipal do PCdoB de Florianópolis