Por Alexandre Santini*

 

O tema da cultura vem tendo uma importância crescente no debate político e partidário do PCdoB nos últimos anos. O conceito de cultura é bastante amplo e se relaciona com diversos aspectos da vida humana, seja em sua dimensão simbólica, que envolve a criação artística, a formação de valores e do imaginário social;  na produção de significados e na disputa de narrativas, que se relaciona também aos universos da educação e da comunicação; seja na dimensão mais estrita da cidadania cultural, que guarda relação com as políticas públicas e com os Direitos Culturais.  Há, ainda, a sua dimensão econômica, que envolve a produção de conteúdos que alimentam toda uma indústria cultural altamente potente e estratégica para se pensar uma plataforma de reconstrução nacional.

Interessa aqui, no marco dos debates do 15o Congresso, mobilizar o conjunto do partido para que perceba a importância do tema na construção de uma nova hegemonia na sociedade, bem como para a ampliação da influência e da expressão pública do PCdoB e de seu projeto emancipador para o estado e o país.

A Cultura no projeto de resolução do 15º Congresso do PCdoB

 O termo “Cultura” ou “Cultural” aparece 12 vezes ao longo das 22 páginas do projeto de resolução apresentado ao debate partidário do 15o Congresso. Na maior parte das menções, o termo se refere ao contexto de “Guerra Cultural”, ressaltando o crescimento da ideologia de extrema-direita, o papel das fake news e a construção da engrenagem de desinformação empreendida pelo bolsonarismo.

A “máquina de guerra cultural” do bolsonarismo, apoiada em uma rede horizontal e altamente capilarizada, turbinada por aparatos internacionais e financiamento público e privado, é uma engrenagem estruturada de maneira não-linear, que consegue penetrar em diversos setores e segmentos da sociedade, na maior parte das vezes através dos círculos de vinculação familiar e comunitária mais estreita, como os grupos de WhatsApp da família, da rua, do condomínio, etc.

Qual(is) aparato(s) culturais, ideológicos e comunicacionais estamos construindo para fazer frente a esta onda avassaladora da guerra cultural bolsonarista?

 Uma eventual derrota de Bolsonaro em 2022 não significará automaticamente a derrota da ideologia de extrema-direita que cresceu e se instalou como um fenômeno de massas em nosso país. Esta tem raízes mais profundas, ramificações em setores corporativos importantes e forte penetração nas classes populares.

 O PCdoB e as Políticas Culturais

Ao abordar a cultura em diversas dimensões, no entanto, o Projeto de Resolução não aborda de maneira mais específica a importante dimensão das políticas culturais, e sobre o papel destacado que teve e tem o PCdoB na formulação e implementação de algumas das principais políticas públicas para o setor cultural desenvolvidas no Brasil nas últimas décadas, tanto em nível nacional, no executivo e legislativo, como em experiências de gestão local.

O Brasil, ao longo das 2 primeiras décadas do século XXI, foi importante referência mundial na gestão e desenvolvimento de políticas culturais, a partir do governo Lula e da gestão do ex-Ministro Gilberto Gil.   O desenvolvimento, abrangência e alcance destas experiências não só posicionou o Brasil como vértice e referência para processos e políticas públicas em diversos países da América Latina e outras regiões do mundo, como logrou constituir um arcabouço institucional importante, expresso em marcos legais que consolidaram políticas de Estado, na criação e fortalecimento de conselhos, conferências e mecanismos de participação social; na construção de um campo de pesquisa e desenvolvimento teórico e conceitual em torno do tema; e na mobilização de atores sociais diversos, articulação e mobilização de redes sociais e culturais.

Vale ressaltar a atuação do PCdoB na formulação e implementação de políticas públicas como o Programa Cultura Viva e os Pontos de Cultura; a política de audiovisual implementada através da Ancine, sob a direção de quadros do partido, que contribuíram decisivamente para a estruturação do setor; bem como programas relacionados à área de cultura e educação. No legislativo, além da criação da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, criada pela liderança da deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) e atualmente presidida pela deputada federal Alice Portugal (PCdoB-BA), o PCdoB esteve à frente de batalhas importantes como a criação do marco civil da internet e a Lei Cultura Viva.

No contexto adverso do governo Bolsonaro, que declara guerra às instituições culturais a partir da extinção do Ministério da Cultura, o Congresso Nacional tem ocupado um papel importante na resistência às investidas da extrema direita contra os avanços culturais obtidos nas últimas décadas.  Nesta quadra, o PCdoB vem ampliando o seu diálogo e interlocução junto ao setor cultural, protagonizando importantes batalhas que foram travadas e vencidas pela cultura brasileira no âmbito do legislativo.

A Lei 14017/2020, conhecida como Lei Aldir Blanc (LAB), representou uma grande vitória da cultura brasileira em meio à pandemia.  Uma conquista histórica protagonizada pelo nosso partido, através da relatoria da deputada federal Jandira Feghali e a participação ativa de quadros do PCdoB no processo de mobilização, aprovação e implementação da Lei.  Com a mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras da cultura de todo o país, e o apoio decisivo do Congresso Nacional, foram destinados ao setor cultural R$ 3 Bilhões de reais, o maior investimento público já realizado na história das políticas culturais no Brasil. Os recursos chegaram a todos os estados brasileiros e a 4176 municípios em todo o território nacional.

A LAB apoiou diretamente milhares de projetos, espaços, iniciativas, coletivos e ações culturais, chegando a lugares onde até então não havia política pública de cultura. Nas capitais e grandes cidades, criou e ampliou mecanismos de fomento já existentes e fortaleceu os sistemas municipais e estaduais de cultura.

Reconhecer, defender, difundir e se apropriar deste legado e da importância da atuação do PCdoB na construção das políticas culturais no Brasil é tarefa que se coloca para o conjunto do partido, e que precisa estar refletida em uma plataforma de reconstrução nacional, considerando a importância da contribuição dos comunistas a este debate no país nas últimas 2 décadas.

 

*Gestor cultural, comunicador e escritor. Mestre em Cultura e Territorialidades pela UFF. Docente e fundador da Escola de Políticas Culturais (EPCult) e professor convidado em programas de pós-graduação em gestão cultural da FLACSO (Argentina) e Universidade Andina Simón Bolívar (Equador). Foi Diretor de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura (2015/2016). Diretor Geral do Teatro Popular Oscar Niemeyer (2017-2021) e atualmente é Subsecretário das Culturas de Niterói (RJ). Membro do Comitê Estadual eleito do PCdoB/RJ e Secretário de Cultura do Comitê Municipal do PCdoB em Niterói (RJ).