Por José Vieira Loguercio*

É impossível entender a realidade mundial e nacional, sem partir da análise marxista do capital. Parafraseando o compositor: “tudo é uma questão de manter a mente aberta, a espinha ereta e o coração tranquilo”. E para a mente continuar aberta, é decisivo, no exame da realidade, partir da análise de Marx, em O Capital, que veio à luz com a contribuição imprescindível de Engels.

Só nessa obra, foi estudado cientificamente, a essência do capital, seu surgimento e desenvolvimento histórico, e porque suas contradições serão superadas no socialismo. Dito de outra maneira: o socialismo não é uma alternativa ao capitalismo, e sim, uma necessidade engendrada pelas próprias contradições do capitalismo. O socialismo é a superação do capitalismo.

Burgueses e proletários

Como explicou Marx, o capital não é uma coisa e sim uma relação entre pessoas através de coisas. Na relação entre os proprietários dos meios e instrumentos de produção (burguesia) e os proprietários tão somente da força de trabalho (proletariado) é que é extraído o mais-valor. Portanto, não existe capital sem burgueses e proletários.

Essa relação existiu esporádica e marginalmente em modos de produção anteriores, no capitalismo ela é sua própria essência. O objetivo do capital é generalizar, globalizar, cada vez mais essa relação.

Historicamente ela surgiu nos burgos da idade média por volta do século XI, e foi se generalizando na Europa medieval até chegar ao predomínio da manufatura capitalista nos séculos XV ao XVII, quando começaram a serem superadas pela industrialização. De lá para cá, tivemos três revoluções industriais e estamos entrando na quarta.

Dois instrumentos decisivos o capitalismo se utilizou para se expandir sobre o planeta e colocar todos os modos de produção que encontrava pela frente em sua retorta geral: economicamente, a globalização da relação entre burgueses e proletários, politicamente, o Estado Nacional.

O capitalismo afirmou ser a extração do mais-valor o fim único e último da humanidade. O proletário cede ao burguês que o emprega, o lucro, o juro e a renda fundiária. Com o advento da indústria surge também o capital portador de juros, o chamado sistema de crédito. Esse sistema tem duas características: por um lado desenvolve a mola propulsora da produção capitalista, o enriquecimento mediante a exploração do trabalho alheio, até convertê-los no mais puro e colossal sistema de jogo e fraude e limitar cada vez mais o número dos poucos indivíduos que exploram a riqueza social; por outro lado, estabelece a forma de transição para um novo modo de produção.

Para dar um exemplo atual das corretas conclusões científica de Marx ditas acima, basta comparar o sistema de crédito nos EUA e Inglaterra com a China e Vietnam, que teremos as duas características bem delineadas.

É bom lembrar que é uma falsa abstração considerar que uma nação cujo modo de produção se baseia no valor seja um corpo coletivo que trabalha apenas para satisfazer as necessidades nacionais. Portanto, o mais valor é extraído do proletariado mundial, independentemente de sua nacionalidade. Posteriormente a abolição do modo de produção capitalista, a produção social será mantida, então continuará a predominar a determinação do valor no sentido de que a regulação do tempo de serviço e a distribuição do trabalho social entre os diferentes grupos de produção – e, por último, a contabilidade relativa a isso – se tornarão mais essenciais do que nunca. Também essas assertivas científicas de Marx estão se comprovando por inteiro.

A economia política clássica, como indicou Engels, “jamais foi além das noções correntes de lucro e renda, jamais examinou essa parte não paga do produto (que Marx chama de mais-produto) em sua integridade, como um todo, e, por isso, jamais atingiu uma compreensão clara, seja de sua origem e, seja das leis que regulam a distribuição subsequente de seu valor”. Acrescento que desde então, a economia política em geral continua sem examinar o mais produto na sua integridade. Aliás, o exame do mais-produto como um todo, é uma tarefa inadiável para os marxistas.

Nos países socialistas, a maior parte desse mais produto, retorna para o povo. Isso porque, o operário já não cede mais o lucro inteiro ao capitalista que o emprega. Lembremos que o operário cede ao capitalista o lucro, os juros e a renda fundiária. No neoliberalismo, os juros e a renda da propriedade do solo, crescem exponencialmente.

Parte deste mais trabalho, deste mais-produto, retorna ao povo através do seu Estado Socialista. O crédito é estatal e a propriedade do solo também. Esse fato, aliado ao acréscimo vertiginoso da produtividade do trabalho é que permitiu a China tirar da miséria mais de 850 milhões de compatriotas. De todo modo, o mais-produto é arrancado do proletariado internacional. Nesse sentido a divisão em campos (campo capitalista e campo socialista) é anticientífica, antimarxista.

A contradição fundamental entre burguesia e proletariado acompanha toda a história do capitalismo. E quando a livre concorrência capitalista engendra os monopólios, e estes se tornam hegemônicos por volta de 1900, o capitalismo entra em uma etapa superior, imperialista. Mas estes monopólios amadurecem também as condições para a superação do capitalismo pelo socialismo.

A essência política do imperialismo é a reação em toda linha e a intensificação da opressão nacional. Com essa base os comunistas sob a liderança de Lênin, passam a lutar pela autodeterminação dos povos como parte integrante da luta contra o capitalismo. A vitoriosa revolução russa e as orientações para as lutas dos povos encorajam as lutas de libertação das nações da Ásia e da África, que conquistam um grau de soberania muito superior aos das nações latino-americanas. Essa orientação é mantida até 1952, quando o congresso do PCUS, manifesta, através de Stalin, que os Partidos comunistas, operários e democratas do mundo tinham que levantar as bandeiras da democracia e da soberania nacional.

Um ensaio mais amplo sobre o tema está disponível aqui.

 

*Técnico Judiciário, aposentado na Justiça do Trabalho. Membro do Comitê Estadual do PCdoB no Rio Grande do Sul.