Em 1996 houve um relançamento da UJS e uma reformulação para o Partido do trato com a frente juvenil e a UJS. As ideias daquele momento referiam-se muito mais a uma normatização, e em alguns aspectos reorganização, que a um rompimento de uma prática para adoção de algo efetivamente novo. A compreensão da relação entre partido e juventude já tinha sua teorização e as práticas postas desde 1984. Mas agora, efetivamente, o partido remetia à UJS toda a sua ação nos movimentos de juventude.

Por Gustavo Raft*

Nos 33 anos da atuação do PCdoB na UJS tivemos alguns debates sobre a concepção dessa organização, que vão desde uma juventude comunista passando pela ideia de corrente do movimento estudantil, à entidade de massas que temos hoje. Essa discussão sobre o formato apenas perpassa a problemática da elaboração teórica sobre juventude, pois não a trata como principal objeto de análise. O problema que o Partido se deteve a encontrar solução foi, em certa medida, do acesso e do aproveitamento de uma considerada “característica revolucionária da juventude”.

Do mesmo jeito, apenas perpassamos em nossas análises o motivo de nos dedicarmos tanto às frentes de juventude e o que esperamos delas. É mais fácil, é mais numerosa, é mais revolucionária, tem mais força, é mais dedicada, é por ter mais vida a ser vivida, é por ser mais oprimida e excluída, é pela tradição, é por um conjunto de fatores? Sem um posicionamento crítico, temos nos dedicado à juventude porque ela demanda bastante, porque precisa de uma organização revolucionária e porque sempre fizemos isso. São motivações que mantém a máquina funcionando, mas insuficientes para um partido que pretende rompimentos e transformações sociais estruturantes.

Ainda assim, a ação dos comunistas na juventude encontra na UJS uma ferramenta imprescindível à organização de Partido. Ali o jovem encontra um terreno fértil para o amadurecimento de sua consciência de classe, manifestação da perspectiva revolucionária, relação confortável entre pares, e catalisador das demandas sociais de juventude. Contudo a elaboração teórica não consegue ser satisfeita na UJS, justamente por seu ciclo tão curto de formação e renovação de quadros, por sua baixa formação teórica, quando comparada ao Partido, e principalmente pelo atropelo do dia a dia – a UJS é local principalmente de prática.

Para o PCdoB a UJS tem apenas autonomia orgânica, ou seja, a elaboração política cabe ao Partido fazer. Deliberações do Comitê Central em 1999 são bastante específicas, elas chegam ao ponto de atribuir a escolha de dirigentes comunistas na UJS, aos organismos partidários em nível correspondente. Mas o específico da organização não tem equivalente na política. Onde e quando o PCdoB elabora sobre frente de juventude, políticas públicas de juventude, e sua atuação nas entidades? Seria nos encontros de partido e juventude ou pela sensibilidade dos dirigentes comunistas em priorizar as pautas da nossa principal frente de atuação? A juventude disputa a pauta interna com outras frentes, mandatos, problemas organizativos, financeiros e eleições? É um tema transversal a todo e qualquer debate do PCdoB? Seja o que for, isso não está dito, não está claro.

No miúdo diário quem debate juventude é a UJS, ela carrega o piano, escolhe a música, monta e rege a orquestra. Quando, e nem sempre, ela se vê incapaz de resolver seus problemas, o Partido se mete, e a cada dois anos vamos lá fazer a colheita de novos quadros. Nós terceirizamos tudo sobre juventude para a UJS.

Tratamos aqui da UJS no assunto juventude exclusivamente por conta do dispositivo estatutário que lhe direciona a militância da juventude comunista, porém, há controversas sobre essa deliberação visto que cada vez mais, outros espaços para a organização e militância juvenil demandam, se formam, e se consolidam fora desse escopo. O assunto é ainda mais controverso quando “autonomia orgânica” da UJS passa a ser entendida como “independência da UJS”, conforme temos visto militantes e quadros estaduais e nacionais reivindicar. Parece estranho que após três décadas, a autonomia orgânica da UJS e os métodos para tal não estejam assimilados, mas quando os documentos que tratam disso não são renovados, reiterados, e além disso, foram retirados das páginas do partido na internet, vemos que a permanência dessa incompreensão é absolutamente normal.

Seria a hora de rever esse monopólio da UJS sobre os jovens comunistas? Diante da aparente grandiloquência dos resultados obtidos no movimento estudantil nos últimos 30 anos, a pergunta anterior pode parecer absurda. Mas se detivermos um tempinho sobre as intervenções especiais nos congressos e conferências nacionais do Partido, de 1988 a 2015, veremos que UJS, entre idas e vindas, parece no geral manter-se principalmente como corrente do movimento estudantil. Isso é suficiente para direcionarmos para a UJS toda a energia de juventude do PCdoB?

Mesmo como corrente do movimento estudantil pouco se fala do nosso desempenho, as avaliações são subjetivas e se quisermos uma perspectiva mais questionadora temos que confiar na autocrítica dos responsáveis pelo trabalho. Quantas entidades dirigimos, quantas pessoas representamos, quais nossos números reais e sua evolução nesses 30 anos? Em termos de massa a entidade era em 2013 quase a mesma de quatro anos após sua fundação, só que espalhada em quase o dobro de municípios. Como esses números são interpretados?

Precisamos olhar com cuidado para esse trabalho que é de grande orgulho para o PCdoB, para suas limitações, detectar os problemas e atémudar a forma de atuação. Entender por que para jovens de diferentes origens, idades e ocupações esse formato não atende. Cabe ao Partido reformular sua política de juventude, desonerar a UJS da responsabilidade de elaboração teórica, criar no PCdoB espaços, instâncias, e métodos internos que o responsabilize mais por essa frente. Um espaço interno de partido de acúmulo de experiência, e até mesmo o guardião da memória, com quadros perenes que se dediquem à juventude.

*Militante do Espírito Santo