Os impactos sucessivos do golpe – considerando os anos desde a sua gestação e até o presente momento – foram brutais e a nossa derrota em âmbito nacional e seus desdobramentos municipais/regionais nos trariam dificuldades e colocariam a esquerda e o nosso Partido na defensiva. Afinal, parte significativa do povo está imobilizado, neutralizado, sem ação política efetiva, tamanha foi a pancada, construída com uma avalanche de desinformação muito bem elaborada pela grande mídia, sócia majoritária no golpe. Claro que tudo isso atingiria também ao menos parte da nossa militância. Seria impossível mantermos a mesma pujança e vigor de alguns anos diante de tamanho furacão. Mas poderíamos ter trabalhado muito mais para reduzir danos. Se não há uma defecção em larga escala nas nossas fileiras, com desfiliações ou rachas orgânicos dignos de monta, é evidente que há por outro lado uma razoável inércia, imobilização, de parte das nossas bases e desânimo em vários dos nossos quadros, especialmente quadros intermediários.

Por Altair Freitas*

Várias foram as nossas limitações no trabalho de estruturação partidária já identificadas ao longo dos anos. No presente projeto de resolução o Comitê Central faz um conjunto de indicações, apontamentos e reflexões sobre nossos problemas orgânicos e ideológicos, inclusive apontando para uma baixa assimilação do nosso Programa Socialista.  Me atenho, portanto, a uma questão que considero central: a subestimação de parte das direções partidárias com o trabalho de formação teórica. Se é verdade que somos um partido para a luta política, é verdade também que só pela política não construímos um partido revolucionário.

Considerando os últimos quatro anos de trabalho estruturado da formação teórica de militantes e quadros, tendo em vista a conjugação dos níveis I, II, III e Estudos Avançados da Escola Nacional, cerca de 28 mil camaradas participaram dos cursos organizados pelos comitês municipais, estaduais e pela própria Escola. Menos de um terço dos mais de cem mil reunidos em todo o país no 13º Congresso. É claro que há um conjunto de camaradas que já fizeram os diversos cursos da Escola nos anos que antecedem 2013, mas somando todo o período desde a reorganização do trabalho de formação em 2003, não chegamos à metade do contingente reunido no congresso anterior. Chama ainda a atenção, de modo muito intenso, que há uma defasagem muito forte no trabalho junto aos quadros intermediários, que deveriam ter participado do Nível II da Escola.

Como educador, professor, com quase trinta anos de magistério e militando na frente de formação e propaganda do PCdoB há uma década, não desconsidero as dificuldades reais e concretas para o processo de construção de militantes e quadros marxistas, com sólida compreensão teórica sobre o capitalismo, a realidade brasileira, as injunções dos fluxos e refluxos da luta política para o país e para o partido. Esse trabalho é de fato duro, requer decisão política firme, recursos materiais específicos, quadros consistentes que coordenem cursos e atividades diversas. Boa parte da nossa militância é profundamente popular e carrega consigo uma imensa defasagem estrutural na sua formação escolar/acadêmica, resultante das imensas distorções nesse campo no Brasil, um país continental, o que coloca outros elementos que dificultam nosso trabalho.

Porém, com tudo isso, é preciso estabelecermos uma profunda autocrítica sobre a subestimação que temos com o trabalho de formação de militantes e quadros e a partir dela, estabelecermos uma repactuação interna sobre o papel dos cursos e atividades de formação para a construção de um partido mais sólido organicamente e mais preparado para os embates cruéis da luta de classes no nosso tempo. Precisamos de militantes que consigam assimilar os elementos basilares do marxismo-leninismo, do programa partidário, da tática e da estratégia do PCdoB, tendo como base o estudo dos clássicos e das novas obras produzidas bem como pelo conhecimento da própria história do movimento comunista. Militantes e quadros que sejam não apenas ativistas dos movimentos sociais nos quais estão inseridos mas que se tornem dirigentes comunistas, eles (as) próprios (as) professores/educadores (as) populares, propagandistas das nossas ideias, intelectuais marxistas. Militantes que não caiam na prostração diante das tempestades nem se acomodem em confortáveis cargos que ocupam em parlamentos, executivos, direções sindicais e entidades diversas por delegação do Partido. Militantes que compreendam que a própria sustentação material do Partido precisa ser garantida pelo coletivo partidário a partir da contribuição financeira individual, diminuindo a nossa atual dependência de recursos oriundos do Estado burguês.

O trabalho de formação e propaganda se não for uma das prioridades do coletivo dirigente, notadamente nos comitês estaduais e municipais prioritários, fica restrito à ação quase heroica da “turma da formação”. Ora camaradas! Cursos de formação são momentos especiais para reunir a militância, debater as ideias de modo concentrado, qualificado, são atividades vivas de estruturação partidária. Material didático-pedagógico não falta. A Escola Nacional tem um currículo primoroso e todos os cursos são disponibilizados a todos os comitês estaduais sem exceção. Qualquer pessoa pode fazer todo o Nível I – composto pelo Curso do Programa Socialista e pelo Curso de Iniciação ao Marxismo-Leninismo – na plataforma de ensino a distância criada em 2012.

É necessário ter presente que a formação militante requer a conjugação do estudo coletivo e individual e isso requer planeamento. A formação precisa ser parte indissociável do projeto geral de estruturação do partido em cada comitê do país e para isso é necessário um elevado grau de assertividade dos comitês estaduais para um novo impulso de formação e propaganda, para dentro e para fora das fronteiras partidárias. O PCdoB precisa ser como a sequoia, a árvore vermelha com raízes profundas e que não perde as folhas nos mais rigorosos outonos. Mas para isso, o PCdoB precisa formar mais e melhor seus militantes e quadros. Esse compromisso coletivo precisa ser firmado no 14º Congresso, mirando o centenário da nossa legenda revolucionária e as duras lutas que temos hoje e no futuro próximo.

*Historiador, professor, secretário Executivo da Escola Nacional João Amazonas e secretário de Formação do PCdoB paulistano