Quando se fala de africanos na Europa, encaminhamos o assunto via tráfico de escravos através das colônias europeias. Na verdade, a Europa nunca escravizou negros em seus territórios, pois não achavam isto de bom tom. Preferiam fazê-lo através de suas colônias nas Américas. Ficavam menos expostos à execração pública e à condenação da igreja. No entanto a presença de negros na Europa é muito antiga. Pessoas do continente africano estiveram presentes no continente europeu desde a antiguidade, no Império Romano, como na época do Imperados Septmio Severo que governou Roma de 145 a 211 antes de Cristo.

A presença deles continuou ao longo dos séculos, como com Frederico II, rei da Sicília e imperador do Sacro Império Romano no período de 1220 a 1250,  que acolheu os africanos em sua corte e os empregou em seus serviços. Chegou a fazer de um deles, João, “o Mouro”, seu camareiro.

“Até o final do século XV, os muçulmanos árabes e do Norte da África governaram a maior parte da Península Ibérica. E, a partir de meados do século XV, famílias ricas no centro e no norte da Itália começaram a empregar criados vindos da África. Muitas pinturas renascentistas dão testemunho disso”, segundo   artigo de Agnès Bardon da Unesco.

Foi a partir também do século XV que Portugueses e Espanhóis, principalmente, deram início à captura de negros na África a fim de transformá-los em escravos na suas colônias no Novo Mundo. A partir daí, e com a divisão crescente entre cristãos e muçulmanos, teorias sobre a inferioridade racial dos africanos foram então desenvolvidas pelos europeus a fim de justificar o tráfico de escravos.

Tanto nas colônias portuguesas e espanholas, quanto nas 13 colonias do Império Britânico, que depois se tornaram os EUA, a escravidão era tida como uma instituição legal. Inclusive há uma grande controvérsia na história da Guerra Civil nos EUA, com alguns historiadores a associando à libertação dos escravos que o norte estava propenso a fazer. Na verdade, há um fator preponderante para a Guerra da Secessão estadunidense ligado intimamente   ao desenvolvimento internacional do capitalismo, com dois modelos econômicos existentes na época: as colônias do norte em grande expansão econômica graças à industrialização crescente, à proteção do seu mercado interno, e à mão de obra livre e assalariada; enquanto o sul se firmava numa economia baseada na plantação (principalmente do algodão) e no escravismo. Apesar da abolição da escravatura nos EUA ter sido feita em 1863, permanece até hoje um arraigado racismo naquele país, onde até meados dos anos 1960, havia nítida divisão entre espaços para brancos e outros para pretos. Nos estados do Sul dos EUA foi inclusive criada uma instituição secreta, aos moldes medievais, a fim de perseguir afrodescendentes, intimidá-los e segregá-los, afastados dos brancos, a Ku Klux Klan. Essa segregação deu algum resultado na medida em que guetos foram criados, como o bairro do Soho em Nova Iorque. Acredito que seja exatamente por conta dessa segregação abusiva e desumana que os negros daquele país resistem arrojadamente à discriminação que ainda sofrem. O que não acontece por aqui nos países latinos. Nossa comunidade negra sofre calada o preconceito que lhe é imposto em todas as camadas da sociedade. Tem analista social aqui no Brasil que tem a coragem de dizer que existem macacos com mais inteligência que os povos da África.

 Não é só no mundo do futebol que os brasileiros afrodescendentes sofrem preconceito brutal. Por exemplo, eu pergunto, quantos pretos ocupam cadeiras na Câmara Federal? Que se declaram pretos são apenas 27 e aqueles que se dizem pardos são pouco mais de 100. Num universo de 513 Deputaos e Deputadas, apenas 5% são pretos, num país onde mais de 50% são considerados pretos e pardos.

A escravidão de hoje não foi extinta, apenas a camuflaram, mudaram o cenário, dissimularam-na. Ainda não democratizaram a democracia. Ela realmente é relativa, como bem o disse o Presidente Lula, pois, por exemplo, a polícia não invade casas em áreas nobres, como o faz em comunidades e favelas. E a justiça é rígida com os pobres e pretos e leniente com os brancos ricos.

Enfim, “Não temamos nos homens o vício, que os faz escravos, mas a virtude, que os faz senhores.” , como também bem o disse Diego de Saavedra Fajardo, Diplomata Espanhol, no início do século 17.

*Jeferson Malaguti Soares é presidente do Comitê Municipal do PCdoB em Ribeirão das Neves/MG