Militantes, dirigentes e simpatizantes do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) participaram da primeira mesa do ciclo de debates preparatórios para o 16º Congresso, marcado para outubro. O evento, mediado por Rosanita Campos, jornalista e membro do Comitê Central do PCdoB, foi promovido pela Fundação Maurício Grabois, presidida por Walter Sorrentino, e transmitido ao vivo pela TV Grabois.

Com o objetivo de aprofundar o tema “Crise do Capitalismo e da Globalização Neoliberal: Financeirização, Concentração de Poder, Big Techs e os Impactos das Transformações Tecnológicas”, participaram como debatedores Ergon Cugler, pesquisador do CNPq; Davidson Magalhães, economista, professor da Uneb e dirigente nacional do PCdoB; Sergio Cruz, jornalista; e Luiz Gonzaga Belluzzo, economista e professor da Unicamp.

Logo na abertura, Walter Sorrentino destacou a relevância do congresso do partido em um contexto de guerra híbrida e assimétrica movida pelos Estados Unidos contra o Brasil. Seu objetivo, explicou, é enfraquecer os BRICS, impedir a regulamentação das Big Techs e minar a soberania nacional. “Essa é uma guerra para arrancar o Brasil dos BRICS, que representam uma ameaça à hegemonia norte-americana, sobretudo em nosso continente, onde a América Latina é vista como o quintal dos Estados Unidos.” O debate, que contou com o pesquisador Ergon Cugler, Davidson Magalhães, Sergio Cruz e Luiz Gonzaga Belluzzo, trouxe reflexões profundas sobre a financeirização, a concentração de poder, o impacto das Big Techs e a necessidade urgente de um novo paradigma de desenvolvimento soberano.

Organização do Ciclo de Debates e mobilização partidária

A abertura da mesa, conduzida pela jornalista e membro do Comitê Central do PCdoB, Rosanita Campos, sublinhou a importância do ciclo de debates como um espaço vital de reflexão interna para o partido. Ela anunciou que este evento é o primeiro de uma série de cinco, com mesas presenciais programadas para São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre e Recife, todas com transmissão ao vivo pela TV Grabois. Campos frisou que as gravações serão amplamente compartilhadas com militantes, membros do Comitê Central, comitês estaduais, membros da Fundação Maurício Grabois e simpatizantes, visando assim aprofundar a discussão sobre os temas do 16º Congresso. Ela expressou gratidão ao presidente do Sindicato dos Engenheiros, Murilo Pinheiro, e à presença de figuras proeminentes como Nádia Campeão (secretária nacional de organização), Nilson Araújo (diretor da Fundação Maurício Grabois), Nivaldo Santana (presidente do conselho curador da fundação) e Renan Alencar (secretário geral da fundação). Campos reforçou o objetivo central de mobilizar a militância para enfrentar os desafios impostos pelo capitalismo e, a partir disso, pavimentar o caminho rumo ao socialismo, considerando o complexo legado do governo de extrema direita no Brasil.

As Big Techs como a nova face do imperialismo

Uma análise preocupante sobre o papel das Big Techs foi apresentada pelo pesquisador do CNPq e autor do livro IA-cracia: Como Enfrentar a Ditadura das Big Techs, Ergon Cugler. Ele descreveu as empresas de tecnologia como a face mais explícita do imperialismo contemporâneo, identificando cinco dimensões de poder exercidas por essas empresas. O poder econômico se manifesta em uma capitalização de US$ 13 trilhões, valor seis vezes superior ao PIB brasileiro. O poder político é exercido por meio da influência em legislações, como o lobby feito contra o PL 2630 (das Fake News). O poder cognitivo reside na manipulação via algoritmos que promovem a desinformação. O poder burocrático se traduz na dependência de governos em relação a empresas como Google e Microsoft. Por fim, o poder militar é evidenciado pelos contratos bilionários com tecnologias bélicas, como o projeto Lavender em Israel. Cugler desmistificou o “mito da garagem”, revelando como bilionários como Bill Gates e Steve Jobs se beneficiaram de recursos públicos e práticas questionáveis. Ele alertou que o Brasil destinou R$ 23 bilhões em contratos com Big Techs, um montante que poderia financiar 250 mil bolsas de mestrado ou cobrir quatro anos e meio do orçamento da UnB. O pesquisador também destacou a manipulação cognitiva, revelando que 2,5 milhões de brasileiros estão engajados em comunidades de teorias da conspiração, impulsionadas por algoritmos que priorizam o lucro.

Crise sistêmica e desigualdades do capitalismo

A crise sistêmica do capitalismo, marcada pela financeirização e concentração de capital, foi detalhada pelo economista, professor da Uneb e dirigente nacional do PCdoB, Davidson Magalhães. Ele ressaltou que 1% da população global detém alarmantes 45% da riqueza, enquanto 2,8 bilhões de pessoas sobrevivem com menos de US$ 8 por dia. O economista apontou um dado ainda mais gritante: os cinco homens mais ricos do mundo dobraram suas fortunas desde 2020, enquanto 5 bilhões de pessoas empobreceram. Magalhães analisou a transição geopolítica do Ocidente para a Ásia, liderada pela China socialista, como um desafio direto à hegemonia norte-americana. Ele criticou a precarização do trabalho e o desmonte sindical, que intensificam a exploração, e defendeu a reorganização da classe trabalhadora para enfrentar o capital. Magalhães também alertou para a ofensiva dos EUA contra o Brasil, intensificada após a cúpula dos BRICS, visando subordinar o país a um papel subalterno na acumulação capitalista global.

Imperialismo em declínio e a mobilização contra o bolsonarismo

O jornalista Sergio Cruz contextualizou o debate em uma conjuntura aguda, marcada pela contradição entre o imperialismo em declínio, liderado pelos EUA, e o fortalecimento do campo anti-imperialista, encabeçado pela China. Ele destacou a perda de dinamismo econômico dos EUA, que dependem do petrodólar e da especulação financeira para manter a hegemonia global. Cruz alertou que a ofensiva norte-americana contra o Brasil, intensificada após a cúpula dos BRICS, tem como objetivo desestabilizar o país, visto como o “elo mais fraco” do bloco, por meio de medidas como tarifas comerciais. Ele defendeu uma ofensiva ideológica e política do PCdoB para desmascarar o bolsonarismo como “traidor da pátria” e mobilizar a sociedade em defesa da soberania e das empresas nacionais. Cruz também observou que, enquanto nos EUA a tecnologia é frequentemente usada para especulação e controle político, na China ela impulsiona o desenvolvimento produtivo.

A Financeirização como Essência do Capitalismo

Uma perspectiva marxista foi trazida pelo professor titular da Unicamp, Luiz Gonzaga Belluzzo, que enfatizou a financeirização como algo intrínseco ao capitalismo, conforme descrito por Marx no conceito de capital fictício. Ele criticou a visão de que a especulação seria uma anomalia, afirmando que ela é, na verdade, constitutiva do sistema, como se pôde observar nas crises de 1929 e 2008. Belluzzo destacou a lógica de Karl Marx, que elucida a concentração e centralização do capital e o impacto do “general intellect” (tecnologia e ciência) na desvalorização do trabalho. O professor alertou para a privatização do governo norte-americano por Donald Trump, que integra as Big Techs ao poder estatal, intensificando a dominação financeira. Belluzzo concluiu que o capitalismo enfrenta contradições que podem levar a um cenário de “socialismo ou barbárie”, reforçando a necessidade urgente de um novo paradigma de desenvolvimento.