O Distrito Federal começou a vacinar pessoas com 49 anos a partir de hoje. A vacinação contra a Covid-19 começou no dia 19 de janeiro e o DF já recebeu 1.455.070 doses de imunizantes.

O aumento no número de casos de Covid e a descoberta de novas subvariantes da Ômicron, acendeu um alerta em todo o país nas últimas semanas sobre a possibilidade de uma “nova onda da pandemia”.

Diante da situação, médicos, infectologistas e entidades voltaram a recomendar o uso de máscaras de proteção além de pedir à população que complete o ciclo vacinal com as doses disponíveis – incluindo os reforços recomendados – enquanto o país aguarda liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para compra da vacina bivalente* da Pfizer. Nesta quarta-feira (16) a agência informou que a análise das bivalentes está em “fase final”, mas não deu data para liberação do uso dos imunizantes.

Com esse cenário e com tantas novas variações do vírus SARS-CoV-2 muitas pessoas já questionam se as vacinas disponíveis para combater a Covid não estariam “desatualizadas”. Para falar sobre isso,  conversamos com o médico sanitarista e especialista em Medicina Preventiva e Social, Nésio Fernandes, que também é presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).

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Nésio Fernandes

Nésio falou sobre temas que tratam a importância das doses de reforço da vacina e sua eficácia, bem como evitar aglomerações em um período de avanço da doença. O especialista ainda explanou acerca da “vacina variante-específica” (vacinas atualizadas) e sobre medicamentos utilizados pelo SUS para tratar pacientes com Covid. Confira.

Com tantas novas variações do vírus SARS-CoV-2, desde agosto fala-se na grande mídia sobre a “vacina variante-específica”. Do que se trata? Seria uma atualização contra as novas variantes virais?

As vacinas podem ser produzidas com informação de antígenos de mais de um subtipo ou variante do vírus. Um exemplo é a atualização anual das vacinas contra a influenza, incorporando à vacina os subtipos do vírus influenza circulando com mais frequência a cada ano. Cabe aos produtores de vacina demonstrar que estas vacinas sejam equivalentes ou mais efetivas quando comparadas com as vacinas produzidas com a “cepa selvagem” ou original do vírus.

A imunidade produzida pela infecção pelas diferentes linhagens da Omicron não tem gerado imunidade protetora de qualidade contra infecções futuras por subvariantes da própria variante Omicron. A “imunidade de rebanho” não é possível e nem esperada para a Covid, assim como para outras infecções respiratórias virais como a influenza. Nosso sistema imune não gera imunidade duradoura após a exposição ao vírus, independente da variante em questão.

Considerando que novas variantes já circulam e ganham predomínio da transmissão comunitária, temos um desafio grande na definição de estratégias de vacinação contra a Covid-19.

Neste sentido, vacinas variante-específicas, contendo antígenos específicos da variante Ômicron, foram desenvolvidas para uso como doses de reforço.

Sabemos que, no cenário pós-omicron, a resposta gerada pela vacinação com esquema completo (incluindo reforços recomendados) utilizando as vacinas disponíveis, e mesmo com as de segunda geração, resultam em proteção especial contra hospitalizações e óbitos – o que por si já é um resultado extraordinário. Temos um cenário onde não se espera uma resposta imunológica capaz de controlar infecções, mas sim o controle do adoecimento grave e dos óbitos.

E para controlar a hospitalização e óbitos, além da vacinação, é preciso garantir acesso a medicamentos eficazes como o Paxlovid e o Baricitinibe, ambos já incorporados ao SUS para tratar Covid-19 e com indicações específicas.

Existe uma previsão para que “vacinas atualizadas” (variante-específicas) estejam disponíveis? O que falta para sua liberação no Brasil?

Temos um pedido da Pfizer tramitando na Anvisa, cabe a Agência avaliar os dados e decidir com base neles. A ANVISA deve decidir com autonomia e critérios técnicos. Se for comprovada a vantagem, a vacina deve ser autorizada e precisa ser incorporada ao SUS com ampla disponibilidade. Estas vacinas já estão sendo utilizadas como reforços em alguns países do mundo. No Brasil a ampla disponibilidade delas só deve acontecer em 2023.

Prefiro o uso do termo vacinas adaptadas. O conceito de “atualizada” pode levar a ideia de que as atuais estão desatualizadas, que “não servem”, o que seria um entendimento errôneo e sem base nos dados disponíveis.

As vacinas atuais e disponíveis têm resposta importante contra hospitalização e óbitos. O desafio está na atualização do esquema vacinal e na plena cobertura (95%) de esquema completo (incluindo os reforços recomendados). Não teríamos tido 70 mil óbitos pela Covid-19 em 2022 se tivéssemos alcançado plena cobertura vacinal da população com esquema completo.

O que está “desatualizada” é a vacinação da população que perdeu adesão ao longo de 2022 e não a vacina que se aplica na população. O tempo de distância da última dose tem grande influência na resposta imune e no risco de adoecimento grave, por isso a importância da vacinação atualizada. É preciso tratar do percentual da população que não voltou para tomar a vacina em 2022 e dos que nem iniciaram o esquema vacinal.

Por que é importante completar o esquema vacinal com as vacinas atualmente disponíveis? Quantas doses são necessárias?

A vacinação com o esquema vacinal completo (2 doses + reforços recomendados para cada grupo) utilizando as vacinas atualmente disponíveis protege contra as diversas variantes e sub-variantes. No entanto, temos ainda uma grande parcela da população que não recebeu as doses de reforço, e, portanto, não estão adequadamente protegidos. Ainda, a infeção pelo vírus e a imunidade promovida pelas vacinas possuem diferentes tempos de resposta dependendo do tipo de resposta imune. Já sabemos que a imunidade cai entre 4-6 meses após a última doses de vacina ou infecção, mas a imunidade celular que tem papel importante para proteger contra doença grave tem duração maior.

As vacinas já aplicadas protegem contra essa nova variante?

Sim, desde que estejam com esquema vacinal atualizado, incluindo as doses de reforço recomendadas para cada grupo.

Estamos vendo um aumento expressivo de casos de Covid, hospitalizações por Covid e, em alguns casos, óbitos por Covid – ainda que em quantidade infinitamente menor do que foi um dia. Existe a possibilidade de vermos uma situação semelhante ao que já vivemos aqui no Brasil ou em outros países nos últimos anos?

As primeiras ondas em termos de magnitude e gravidade da doença ocorreram em um contexto de ausência ou baixa cobertura vacinal. Atualmente, considerando a disponibilidade de vacinas e altas coberturas vacinais, apesar do aumento de casos pela nova sub-variante Ômicron, não teremos uma situação tão grave quanto já tivemos nos últimos anos de pandemia. No entanto, é inaceitável que 100 pessoas morram por dia no Brasil por doença imunoprevenível. Portanto, medidas de proteção e aumento da cobertura com doses de reforço são essenciais para redução da gravidade e mortalidade resultante por esta nova onda de infecções causadas pela nova sub-variante Ômicron.

Estamos há poucos dias do início da Copa do Mundo, logo depois vem Natal, Ano Novo e, pouco depois, o Carnaval. São muitos eventos de aglomeração daqui até março do próximo ano. Qual a recomendação para os dias que estão por vir?

Nos momentos de expansão das curvas de casos devemos obrigatoriamente usar máscaras e evitar aglomerações e ter o esquema vacinal completo incluindo os reforços recomendados. O comportamento das ondas, e o possível padrão de sazonalidade que vai se desenhando para a Covid-19, acontecerá independente destes grandes eventos, no entanto, eles podem potencializar a dimensão e o alcance. Por isso é importante que as autoridades públicas tenham compromisso com a vida e adotem todas as medidas possíveis reduzir o impacto de novas ondas.

As informações e evidências científicas  precisam ser comunicadas com clareza e as decisões dos gestores devem estar orientadas pelo conteúdo ético que colocam nas suas convicções. Quanto vale uma vida? Qual o padrão de “convívio” que vamos escolher ter com o vírus? Qual será o modelo de enfrentamento que adotaremos nacionalmente? O Ministério da Saúde não poderá seguir enfrentando a Covid-19 com base em Nota Técnica do Ministério da Saúde que só repete “máscara, vacina  e que as decisões devem ser tomadas pelos gestores locais com base na realidade de cada território” . Precisamos de liderança e coordenação nacional nas decisões tripartite. Precisamos de um novo rumo.

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*termo usado para designar vacinas consideradas ‘atualizadas’ ou de ‘segunda geração’ que oferecem proteção extra contra a Ômicron e suas subvariantes BA.1, BA.4 e BA.5.