Zakharova: frenesi de sanções é desespero diante de êxitos da economia
Não obstante o chanceler russo ter considerado “proveitosa” sua primeira reunião cara a cara com o secretário de Estado Antony Blinken, na véspera Washington anunciou que estava recuando de aplicar sanções diretamente contra a empresa Nord Stream 2 mas iria manter sanções contra 13 embarcações russas que estão perto de finalizar o gasoduto russo-alemão.
Sobre a questão das sanções, em recente entrevista ao portal RT, a porta-voz da diplomacia russa, Maria Zakharova, havia dito que essas medidas unilaterais e politicamente motivadas são “um gesto de desespero” e uma demonstração da incapacidade de “reconhecer o direito da Rússia de determinar independentemente seu caminho de desenvolvimento e construir relacionamentos com os seus parceiros”.
Na mesma entrevista, a porta-voz asseverou que a resposta da Rússia tem sido utilizar esses desafios externos como estímulos adicionais para “aumentar a estabilidade da sua economia, mobilizar a criatividade das empresas nacionais, modernizar a produção e diversificar os laços econômicos”.
“Conseguimos em grande medida adaptar-nos aos desafios externos e virar a situação a nosso favor, bem como lançar programas de substituição de importações e de desenvolvimento de indústrias internas avançadas e competitivas”, afirmou.
Zakharova destacou ainda que o frenesi de sanções de Washington – não só contra a Rússia – está tornando “ainda mais duvidosa” a fiabilidade das transações em dólares e se referiu à desdolarização.
“O abandono gradual da configuração do sistema monetário mundial centrado nos EUA é uma resposta objetiva a uma combinação de fatores”, assinalou.
Nessa direção, apontou, Rússia tem propugnado passos consistentes com os parceiros comerciais para “fortalecer o uso das moedas nacionais” e criar sistemas de pagamento não submetidos a Washington.
“Dado o fato óbvio de que as sanções anti-Rússia são uma arma de dois gumes que não inflige menos danos aos que a empunham, esperamos que o bom senso prevaleça e que os nossos parceiros voltem a construir laços conosco, confiando nos princípios da justiça e igualdade e renunciando ao ‘direito do mais forte’ e à ingerência nos assuntos soberanos de outros Estados”, afirmou Zakharova.
Na capital dos EUA, a porta-voz do governo Biden, Jen Psaki, admitiu que o gasoduto Nord Stream 2 está “95% pronto” e que Washington não tem mais como impedi-lo.
Frenesi de sanções
Zakharova afirmou que o frenesi de sanções “infelizmente se tornou uma realidade do nosso tempo”, que atribuiu ao inconformismo desses círculos ocidentais diante dos “êxitos óbvios da economia russa, que está se tornando mais competitiva, internacionalmente, e a maior presença de bens e serviços russos de alta qualidade nos mercados mundiais”.
Zakharova salientou que “a prática viciosa de impor restrições políticas e econômicas unilaterais, especialmente a aplicação extraterritorial de tais medidas, é uma infração à soberania dos Estados e uma interferência em seus assuntos internos destinada a manter, a qualquer custo, sua posição dominante na economia global e na política internacional, que estão perdendo gradualmente”.
A diplomacia – acrescentou – está sendo “substituída por sanções”, que servem para “mascarar protecionismo” a monopólios desses países e também para “desviar atenção de problemas internos”.
Em outras ocasiões, a diplomacia russa foi, inclusive, mais explícita: Washington quer barrar o gasoduto russo-alemão para impor aos europeus a compra de seu gás de fracking muito mais caro e de logística mais complicada.
Zakharova assinalou também que o ocidente “ignorou os apelos do secretário-geral da ONU e do Alto-Comissário das Nações Unidas para Direitos Humanos para suspender sanções unilaterais ilegítimas sobre o fornecimento de remédios, alimentos e equipamentos necessários para combater o coronavírus durante a pandemia”.
Espiral de retaliações
“As sanções minam a confiança mútua e a perspectiva de normalização de relações”, afirmou Zakharova, acrescentando que, embora a Rússia não deseje entrar numa espiral de sanções e contra-sanções, tem respondido “prontamente e de forma direcionada”.
“Deixamos claro reiteradamente que não começamos esta guerra de sanções, mas estamos prontos, a qualquer momento, a fazer a nossa parte para pôr fim a esta confrontação inútil, no qual não haverá e não poderá haver quaisquer vencedores”, sublinhou a porta-voz russa.
Sobre o impacto das sanções do ponto de vista da economia, Zakharova destacou que tal escalada das sanções recíprocas tem uma influência negativa generalizada “tanto sobre a economia russa como sobre a ocidental”, com as perdas recíprocas avaliadas “na ordem das centenas de bilhões de dólares”.
“Sob estas circunstâncias, continuamos a responder às restrições de uma maneira equilibrada e adequada, guiados pelos interesses do desenvolvimento econômico nacional e dos agentes econômicos internos, sob o princípio de ‘não causarmos danos a nós próprios’”.
“Tomamos medidas para diversificar os nossos laços econômicos externos e estamos consolidando nosso sistema financeiro nacional”, ao lado dos programas de desenvolvimento de novos ramos da economia e substituição de importações.
“Ao mesmo tempo, mantemos as nossas medidas econômicas especiais recíprocas, ou seja, restrições à importação de certos produtos dos países que introduziram sanções anti-Rússia”, destacou a porta-voz russa. “Elaboramos legislações para contra-arrestar novas potenciais medidas unilaterais por parte dos Estados Unidos e de outros países”.
Zakharova também se manifestou sobre os passos que a Rússia está tomando para reduzir a sua dependência dos sistemas financeiros ocidentais, isto é, a chamada ‘desdolarização’.
“A discussão sobre a necessidade de reduzir a dependência do dólar como principal divisa mundial tem decorrido desde há pelo menos uma década. As anteriores convulsões no mercado financeiro dos EUA e a subsequente crise financeira e econômica global exacerbaram a vulnerabilidade da economia mundial ao domínio do dólar e puseram em dúvida a sustentabilidade do sistema monetário mundial baseado na supremacia de uma unidade monetária nacional”, sublinhou.
A porta-voz destacou que escalada de sanções de Washington está tornando “ainda mais duvidosa” a fiabilidade das transações em dólares. “Nestas condições, a tarefa de consolidar a independência e a sustentabilidade do sistema financeiro face às ameaças externas está se tornando cada vez mais uma prioridade para qualquer Estado”.
Nessa direção, apontou a porta-voz, a Rússia tem propugnado passos consistentes com os parceiros comerciais para “fortalecer as moedas nacionais, bem como a minimizar os potenciais danos econômicos decorrentes de novas medidas restritivas que os países ocidentais possam introduzir”.
Uso das divisas nacionais
Nesse sentido, Zakharova se referiu aos recentes acordos para “expandir a utilização de divisas nacionais em pagamentos mútuos com a China e a Turquia” e aos acertos semelhantes existentes no âmbito dos BRICS. A mesma tendência “vem se desenvolvendo na União Econômica da Eurásia, com uma fatia crescente de moedas nacionais nos pagamentos mútuos”, bem como na cooperação comercial e econômica entre a Rússia e os países da região Ásia-Pacífico e da América Latina.
A porta-voz disse que a desconexão da Rússia do SWIFT [o sistema de efetuação de transações financeiras encabeçado pelo Ocidente] “é até agora considerada um cenário hipotético” , mas está em curso uma ação para minimizar danos decorrentes do acesso restrito aos mecanismos de pagamento internacionais habituais”.
O Sistema de Mensagens Financeiras do Banco Central foi citado pela porta-voz como um exemplo de “instrumentos alternativos”. Está também em discussão o estabelecimento de interfaces do sistema russo com os seus homólogos estrangeiros, tais como o SEPA europeu, o SEPAM iraniano e os CUP e CIPS chineses.
Diversificação
“Não vamos excluir o mundo exterior, o que é algo que os iniciadores das sanções nos pressionam persistentemente a fazer”, afirmou Zakharova, que acrescentou que é um grupo reduzido de países que vem tendo essa prática hostil contra a Rússia.
“Ao contrário, estamos sempre abertos ao diálogo sobre todos os problemas ou preocupações e estamos prontos para uma cooperação igual e mutuamente benéfica com todos os países, mas só com base nos princípios da igualdade e da consideração mútua de interesses. É assim que vemos realmente relações internacionais estáveis”, ressaltou.
Zakharova chamou a uma “ampla discussão internacional” sobre meios para “contrarrestar as medidas unilaterais ilegítimas”. “Estamos confiantes de que um diálogo sistemático deverá ajudar a reduzir as preocupações da comunidade empresarial relativamente à incerteza e instabilidade nos assuntos globais, que são provocadas pela política unilateral e inconsistente do Ocidente. Para a porta-voz, ainda que lentamente os iniciadores das sanções começam a perceber que medidas unilaterais causam danos inaceitáveis a quem as toma e são “inúteis e contraproducentes”.