Pontos nos iis. Não existiu a questão “ameaça à Ucrânia”, o que houve foi a questão “OTAN em cerco à Rússia”. Quem ameaçou a paz foi a OTAN. O que se vê foi fruto de gigantesca operação da mídia ocidental.

Por Walter Sorrentino*

A viagem de Bolsonaro à Rússia tem aquelas ligações da família com as ideias do místico obscurantista do “tradicionalismo”, apóstolo da extrema direita mundial (como Bannon, Viktor Orbán e tantos outros), no caso Aleksandr Dugin. Liga-se à tentativa de dar curso à tendência de a extrema-direita se firmar na onda de ascenso que se verifica nos EUA, Europa e mesmo entre nós.

Sim, Bolsonaro tem uma estratégia política fascistizante e golpista, vai perseguir seu objetivo a que preço for, ou seja, golpeando as instituições. Precisa ser barrado e derrotado por todos os democratas. O modo de barrá-lo é por amplas forças de oposição democrática, união para salvar a democracia.

Mas no plano geopolítico o principal crítico à viagem de Bolsonaro à Rússia foi os EUA de Biden, porque contraria sua estratégia perante a crise que criou e em que vem fracassando, também porque em detrimento dos interesses da própria Europa (Alemanha e França que o digam).

A estratégia dos EUA se volta predominantemente para a Eurásia, como terreno por excelência da guerra contínua e multidimensional, por todos os meios e armas, dos EUA para conter o ascenso da China e sua aliança estratégica com a Rússia – recentemente reforçada.
Convenhamos que nós não temos nenhum motivo, como nação, para fazer parte dessa estratégia, nem em nome de um suposto modelo universal de democracia (do liberalismo, aliás em crise) ou de algum “ocidentalismo” (que nos poria no outro lado do balcão das “guerras culturais“ pregadas por Bolsonaro), nem somos tributários de uma suposta guerra entre atlantistas liberais e eurasianos opositores (como prega Dugin).

O que precisamos pensar é em função dos interesses que tem o Brasil na tendência à multipolaridade que se acelera no mundo, da qual são maiores (mas não únicos) protagonistas os EUA, a China e Rússia, a qual abre oportunidades para que tenhamos maior margem estratégica de manobra para perseguirmos com autonomia nossos próprios interesses nacionais.

Nós não precisamos de “modelos” ou alinhamentos caninos, precisamos saber o que queremos como nação e construir um projeto nacional com realismo – que, no caso, implica interesses de desenvolvimento “contra-hegemônicos”, objetivamente, face ao tacão dos EUA no subcontinente latino-americanos e caribenho. Não é a Rússia, nem a China, nosso problema.

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*vice-presidente nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)

 

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