Wadson Ribeiro: Ouvidoria sabia das denúncias e governo Zema não agiu
Em meio ao pior período da pandemia no Brasil e na semana em que a política de isolamento social completa um ano, o estado de Minas encontra-se num quadro preocupante pelo avanço da doença por um lado e, por outro, por uma crise política que se avizinha com a criação da CPI que vai apurar os “fura filas” da Secretaria Estadual de Saúde. Na semana em que inicia em todo o estado a Onda Roxa, o parlamento mineiro se debruça sobre esse absurdo produzido pelos políticos do partido Novo, um ato que revolta os mineiros e merece uma dura investigação e a responsabilização dos culpados.
Por Wadson Ribeiro*
Contrariando o que disse publicamente o governador Romeu Zema, ao afirmar que tomou conhecimento das denúncias somente pela imprensa, o portal da Ouvidoria Geral do Estado (OGE) aponta o registro de uma denúncia de “fura-filas” datada do dia 24 de janeiro, dias antes do escândalo ser noticiado pela mídia. Fui ouvidor-geral do Estado entre 2017 e início de 2018 e sei da competência, da honestidade e do compromisso com o bom serviço público que os servidores da Ouvidoria têm. Contribuí para o aperfeiçoamento dos canais de denúncias da OGE e sei que os servidores jamais “fechariam os olhos” para uma denúncia como essa. A CPI precisa investigar se houve interferência do comando da Ouvidoria na obstrução do prosseguimento das investigações. Caso contrário, terá sido o próprio governo que tomou conhecimento pela Ouvidoria e não tomou as medidas necessárias, o que pode configurar crime.
O ex-candidato a deputado federal pelo partido Novo e ex-secretário de Saúde demitido por Zema, o doutor Carlos Eduardo, comandou um verdadeiro “bonde da vacina ilegal”. Mais de 828 funcionários da Secretaria Estadual de Saúde entre efetivos, comissionados e terceirizados, a amplíssima maioria fora dos critérios definidos no Plano Nacional de Imunização, tomaram a vacina passando por cima das prioridades definidas. Apenas no gabinete do secretário foram vacinados 27 servidores, a maioria trabalhadores internos, que não têm relação com o público e áreas de maior risco como hospitais e unidades de saúde. Do total de vacinados, 120 nomes não constam nem como servidores nem como terceirizados. Mais da metade dos que tomaram a vacina irregularmente não têm seus nomes no Portal da Transparência. Isso em um momento em que Minas vacinou apenas 4,11% de sua população, com 765.338 mil pessoas tendo tomado a primeira dose e menos de 350 mil a segunda.
Em meio ao cenário caótico e de completo descontrole da pandemia, o governador Romeu Zema tenta, tardiamente, tomar a dianteira em certos debates, como a decretação da Onda Roxa do Minas Consciente para todo o estado. Mas o fato concreto é que sua conduta ao longo dos últimos doze meses foi, de modo geral, vacilante. O governador flertou com Bolsonaro em vários momentos, criticou veladamente o isolamento social e Minas foi um dos estados que menos testou contra a Covid-19. Até as articulações para a obtenção da vacina pelo estado ficaram paralisadas por tratativas atrapalhadas com outros países. Sua tentativa de reposicionamento nesse momento, se dá em função da proximidade com as eleições do próximo ano e do desgaste que o desleixo em relação a pandemia provoca no capital político dos governantes.
A CPI da vacinação irregular em Minas precisa cumprir o papel esperado por toda a sociedade mineira que exige a apuração dos fatos, a transparência na gestão pública e o fortalecimento do SUS e das ações em saúde. A Assembleia Legislativa cumpre seu papel em fiscalizar o Executivo. O governador Romeu Zema e o partido Novo têm que ter a humildade de reconhecerem que estão cometendo as mesmas práticas que um dia prometeram combater. É uma espécie de novo que já nasceu velho.
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Wadson Ribeiro* é presidente do PCdoB -MG, foi presidente da UNE, da UJS, deputado federal e secretário de Estado de Minas Gerais.
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