“O que gera segurança não é cada cidadão ter sua arma em casa, mas sim uma política preventiva que combata o crime organizado, as milícias, o contrabando de armas pesadas e o narcotráfico”.

Por Wadson Ribeiro*

 

O primeiro ato formal de Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto não foi para anunciar medidas para combater o enorme problema do desemprego. Muito menos ações para melhorar a saúde pública, que sofre com a falta de verbas. Seu ato inaugural foi assinar o Decreto 9.685, que facilita a posse de armas de fogo em todo o território nacional. Este gesto contraria a opinião da maioria da população e fará do Brasil um país ainda mais violento.

Atualmente, 61% dos brasileiros são contra a posse de armas, segundo pesquisa do instituto Datafolha divulgada nesta semana. O resultado mostra que não precisa ser nenhum especialista para entender que quanto mais armas entre a população, maior será o índice de violência, sobretudo no país que é recordista mundial em homicídios.

Dados do Atlas da Violência, publicados em 2018, demonstram que 71% dos homicídios praticados em 2016 no Brasil foram cometidos com armas de fogo. O relatório atesta que desde 1980 aumenta o número de mortes causadas por este tipo de arma e que sua proliferação tornará este quadro de violência ainda mais grave para as famílias e brasileiras.

Para os radicais da chamada “Bancada da Bala”, e para as empresas que produzem armas, o decreto frustrou expectativas, pois limitou calibres, o número de armas por pessoa e sequer trata do porte, que, segundo eles, será o próximo passo dado pelo Congresso Nacional com o apoio do governo federal. A frustação se fez sentir nas ações da empresa de armas Taurus na Bolsa de Valores, que despencaram 22% após a assinatura do decreto.

Um país com 100 milhões de pessoas no mercado de consumo é um grande nicho para a indústria bélica norte-americana e mundial. Mesmo com as restrições no decreto, na visão dos radicais armamentistas, o Brasil é um grande mercado para a indústria de armas. Na ótica das empresas, e dos parlamentares que representam seus interesses, o que realmente importa é vender armas e não salvar vidas. Ignoram todas as estatísticas e estudos sobre a violência gerada por armas de fogo e, em nome do lucro e da expansão de seus mercados, não importam se o Brasil será ainda mais banhado pelo sangue da insensatez produzido pelos tiros.

O que gera segurança não é cada cidadão ter sua arma em casa, mas sim uma política preventiva que combata o crime organizado, as milícias, o contrabando de armas pesadas e o narcotráfico. Muitos destes crimes têm tentáculos no aparelho de Estado para se proliferarem e garantirem com segurança seus negócios, mas sobre isso o governo não fala, nem ataca. É como se a segurança pública passasse a ser, após o decreto, responsabilidade individual de cada cidadão no salve-se quem puder.

A combinação de cortes em programas sociais, desemprego elevado e facilidades para obtenção de armas de fogo, podem fazer do Brasil uma terra sem lei. Serão novamente os mais pobres, os jovens e os negros das periferias que pagarão a conta do aumento da violência, da insegurança e dos sonhos contidos na bala.

*Wadson Ribeiro é presidente do PCdoB-MG, foi presidente da UNE e secretário de Estado do governo de Minas Gerais.

Fonte: Hoje em Dia