Wadson Ribeiro: A dor sem fim de um luto (que parece) interminável
Há mais de um ano o Brasil vive uma dor que parece não ter fim. A população brasileira, reconhecida em todos os cantos pelo calor humano, pela alegria estampada no rosto, pelo astral elevado e por uma inabalável fé no futuro, parece agora cansada. Não somos apenas um país mergulhado em um luto que insiste em não acabar, mas também, uma Nação que parece fadada a não reencontrar seu destino. A pandemia, as mais de 410 mil mortes, o desgoverno Bolsonaro e o momento obscuro que o Brasil atravessa parecem fazer parte de um metabolismo de nossa própria história.
A morte precoce do ator Paulo Gustavo comoveu todo o Brasil e fez explodir um sentimento de dor e ao mesmo tempo de indignação em relação à situação em que o Brasil se encontra. Paulo Gustavo é mais um entre as centenas de milhares de brasileiras e brasileiros vitimados pela Covid-19, mas sua morte, ativa uma espécie de consciente coletivo em todo o país. Uma pessoa jovem, com boa saúde, com condição financeira privilegiada, que teve acesso aos tratamentos mais modernos disponíveis, não resistiu ao vírus e partiu no auge de sua carreira de artista. Imaginem o risco de vida de milhões de brasileiros que foram infectados e as condições que levaram as mais de 400 mil mortes no Brasil. A pandemia veio nos mostrar que o capitalismo não consegue dar respostas quando se necessita de saídas coletivas, planejadas e que não busquem apenas o lucro.
A morte de um ator global consagrado, assim como a morte de todos os brasileiros pela pandemia, tem um forte ingrediente de irresponsabilidade do governo do presidente Jair Bolsonaro. As demissões de dois ministros da Saúde por discordância das orientações palacianas em relação ao uso da hidroxicloroquina, os ataques ao uso de máscara promovidos pelo presidente, as desinformações relacionadas ao distanciamento social e a sabotagem sistemática do governo federal e do ministério da Saúde para a aquisição de vacinas somam-se a um conjunto de maus exemplos advindos da maior autoridade pública do país.
O governo federal tem grande parcela de culpa pelas mortes de Paulo Gustavo, de Dona Maria, do Seu João e de cada brasileiro que perdeu a vida. O governo não é responsável pelo surgimento da pandemia, mas é culpado pela forma irresponsável como tem enfrentado a crise sanitária.
A dor que sentimos agora, não é apenas pelas mortes, mas também por infâncias impossibilitadas de frequentar a escola, de estudar e de brincar. É pelos adolescentes isolados em suas casas, sem poderem ocupar as ruas, os parques e encontrar os amigos. É pelos idosos que, na melhor idade, tiveram que se trancar em casa e foram os primeiros a morrer. A dor é pela maioria de brasileiros que se tornaram mais pobres e não têm moradia descente para cumprirem o isolamento. É pela fome que voltou a assombrar um número cada vez maior de lares. É porque não há empregos e as ruas das cidades têm se transformado em um acampamento a céu aberto, onde as barracas dos sem teto ocupam cada vez mais espaços em uma luta cotidiana pela sobrevivência. A pandemia desarticulou a vida social e tentará impor um novo padrão de relações sociais e de produção, já anunciadas com a nova revolução tecnológica e aceleradas agora com a pandemia.
É preciso devolver ao Brasil o direito de sonhar, transformando o luto de agora em luta por um outro país. É preciso transformar a dor sentida pelos brasileiros em compromissos com o futuro da Nação. Como diria o próprio Paulo Gustavo, “Rir é um ato de resistência”. Que possamos, em breve, transformar lágrimas em risos e reencontrar o caminho da prosperidade.
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Wadson Ribeiro* é presidente do PCdoB -MG, foi presidente da UNE, da UJS, deputado federal e secretário de Estado de Minas Gerais.
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