Encerrado o prazo para a realização das convenções partidárias que definiram as candidaturas às câmaras de vereadores e às prefeituras dos municípios brasileiros – e com a divulgação dos dados dessas candidaturas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – já temos condições de iniciar uma análise do perfil dessas candidaturas.

Por Vanessa Grazziotin*

Eu quero hoje destacar a presença das mulheres nessas eleições de 2020. Quanto à isso, desde o último final de semana, a imprensa brasileira, grandes jornais, revistas, televisão, rádios, as mídias sociais, têm divulgado que houve um crescimento significativo da presença das mulheres como candidatas. Divulgam até que houve um recorde de participação de mulheres, assim como de negros, neste processo eleitoral.

Eu entendo que nós precisamos analisar com muito cuidado estes dados para que a realidade não seja destorcida. O que aconteceu, de fato, essa é a primeira observação que faço, é que essas eleições de 2020 estão sob a égide de uma mudança na legislação brasileira, uma mudança que proibiu a realização de coligações partidárias para os cargos proporcionais, mantendo somente para os cargos majoritários.

Ou seja, os partidos políticos que querem concorrer às vagas das câmaras de vereadores, são obrigados a lançar chapas próprias e isso levou ao aumento significativo no número total de candidaturas no Brasil.

E no Brasil nós temos também uma legislação que define a obrigatoriedade da cota de gênero. Ou seja, 30% das candidaturas tem que ser de mulheres. Então, óbvio que o número de candidatas mulheres aumentou, porque aumentou o número de candidaturas de forma geral.

Para que tenhamos uma ideia, em 2016, 32% dos candidatos eram mulheres. Nessas eleições de 2020, 34% são mulheres. Ou seja, não houve uma mudança significativa. Em relação à disputa pelas prefeituras, aí a realidade é bastante diferente.

Dos candidatos que concorrem, 2.495 são mulheres, contra 16.628 homens. Ou seja, há uma participação de candidaturas femininas nas prefeituras de somente 13%, muito próximo ao que foi as candidaturas em 2016.

Ou seja, isso mostra claramente que a legislação determina uma condição muito importante para as mulheres. A legislação pode ser favorável ou contrária ao avanço e à presença das mulheres nos espaços de poder. A legislação que determina a cota e a reserva de vagas é de 1995. Mas de lá para cá a presença de mulheres no parlamento aumentou muito pouco. Porque não basta cota para concorrer, é preciso condições iguais, efetivas.

Em 2018 nós já conseguimos estabelecer o critério de que os recursos do financiamento eleitoral e o acesso á propaganda eleitoral devem ser distribuídos de igual forma entre homens e mulheres. E isso fez a diferença em 2018. E eu não tenho dúvida que fará a diferença agora em 2020.

Entretanto, ainda será um avanço muito pequeno em relação às necessidades. Hoje no Brasil só 15% das cadeiras da Câmara de Deputados são ocupadas por mulheres. 13% nas câmaras de vereadores. 11% nas prefeituras municipais. Ou seja, é essa a realidade que nós temos que modificar.

E essa realidade só será modificada com muita luta das mulheres e com o apoio e a participação fundamental dos homens também. De todos e todas que entendem que democracia só é possível quando todos os segmentos da sociedade estão inseridos nos espaços de poder.

Um país, onde mais da metade da população é excluída dos espaços de poder, não pode ser classificado como um país democrático.

As formas para ampliar essa participação existem e já foram praticadas em vários países que saíram de percentuais de 10% para 30 ou 40%. E é isso que nós precisamos fazer aqui, uma reforma política radical. E não essas reformas políticas de faz de conta que o parlamento machista e misógino tem aprovado nos últimos anos. Portanto, a luta continua.

 

 

(PL)