Suposto treinamento de civis por militares em Odessa, segundo Washington; Ucrânia repeliu a fake news

Até o governo da Ucrânia reagiu à escalada de desinformação na mídia norte-americana deste final de semana sobre a “invasão russa iminente” e chamou no domingo (6) a desconfiar de “previsões apocalípticas”, assinalando ainda que as possibilidades de uma “solução diplomática” com a Rússia são “muito superiores” às de uma “escalada” militar.

Segundo o Washington Post, os preparativos russos para a invasão já estariam “praticamente prontos”, com Kiev “tomada em 48 horas”, “50 mil civis mortos” e “cinco milhões de refugiados”.

“Não confie em previsões apocalípticas”, disse o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmitro Kuleba, em uma rede social.

“As chances de encontrar uma solução diplomática para uma desescalada são consideravelmente maiores que a ameaça de uma nova escalada”, declarou Myhailo Podoliak, conselheiro-chefe do governo ucraniano.

Por sua vez, o vice-representante russo na ONU, Dmitry Polyansky classificou de “loucura” as elocubrações da mídia ocidental sobre o tempo que levaria para as tropas russas tomarem Kiev em uma suposta invasão à Ucrânia.

“A loucura e o alarmismo continuam. O que aconteceria se disséssemos que os EUA poderiam tomar Londres em uma semana e causar 300.000 mortes de civis?”, escreveu Polyansky ao comentar um artigo do jornal Washington Post, publicado no sábado (5), que assevera que a Rússia poderia tomar Kiev em dois dias, deixando 50 mil mortes de civis.

“Rússia invade”, diz Bloomberg 

A escalada de alarmismo incluiu, até mesmo, uma “barriga” da Bloomberg, que durante 30 minutos manteve nas redes a desinformação de que a Rússia já invadiu. Um vexame, com a Bloomberg explicando depois que era uma matéria pronta, e que vai investigar como foi ao ar.

A notícia falsa também repercutiu na ONU, com o porta-voz adjunto do secretário-geral Guterres, Farhan Haq, enfatizando que todas as partes envolvidas na situação em torno da Ucrânia devem “abster-se de ações e retórica” que possam agravar as tensões atuais.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que a peça enganosa de Bloomberg mostra “tensões extremamente elevadas, estimuladas pela postura agressiva do Ocidente sobre a Rússia” e demonstra que tais relatórios provocativos podem levar a “consequências irreparáveis”, advertindo que “qualquer faísca é extraordinariamente perigosa”.

Quem deu a senha para a escalada das fake news foi o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, com a mentira sobre um “vídeo russo” que seria usado para justificar a ‘invasão da Ucrânia, foi contestado por um jornalista honesto, Matt Lee, da Associated Press, que exigiu que ele apresentasse qualquer prova do que dizia, lembrando as ‘armas de destruição em massa no Iraque’ e, mais recentemente, a que “Cabul não vai cair”.

Price ficou desmoralizado na frente de todos, apesar de ter tentado intimidar o jornalista por duvidar das “informações da inteligência americana e da britânica”, e até insinuando que ele era um “amigo de Putin”.

Quanto à veracidade das “informações da inteligência americana” ou “da britânica”, desde que o então secretário de Estado Colin Powell se prestou a mentir diante do Conselho de Segurança da ONU sobre as inexistentes armas de destruição em massa do Iraque, exibindo um tubinho com sabão em pó e dizendo que era ‘antraz’, não gozam de credibilidade entre as pessoas de bom senso.

Aliás, o adjetivo “iminente”, de tanto ser usado e abusado por essa mídia cevada pelo complexo militar-industrial ianque, que até uma das mais esforçadas gritadoras de ‘pega ladrão’ enquanto se dedica a justificar o assalto à soberania alheia, a porta-voz da Casa Branca, Jen Psalki, prometeu não usar mais o termo.

New York Times

Na sexta-feira, na maratona da desinformação, a vez foi o New York Times, que citou um “alto oficial militar ucraniano” – sob anonimato – que asseverou que “Moscou recentemente enviou mais 10.000 soldados para a região”, “várias unidades” na península da Crimeia foram colocadas “no mais alto estado de prontidão militar dos militares russos” e outras, estacionadas em “outros locais” não especificados, foram supostamente colocadas no “segundo nível mais alto de alerta”.

Segundo o militar ucraniano, a movimentação de tropas russas seria parte de seu “verdadeiro jogo de pôquer”, destinado a assustar Kiev e o Ocidente, em vez de um sinal de uma incursão iminente.

No dia seguinte, consertando o sinal insuficiente, o Post carregou nas tintas, previu queda de Kiev em 48 horas, “50 mil civis mortos” e “cinco milhões de refugiados”.

Com base em “avaliações militares e de inteligência dos EUA”, o Post asseverou que a Rússia supostamente está “prestes a terminar os preparativos” para uma invasão da Ucrânia e já concentra nas fronteiras da Ucrânia, “cerca de 70%” das forças e das capacidades necessárias para uma invasão em grande escala.

“83 grupos táticos de batalhões russos de aproximadamente 750 efetivos cada um” estão próximos das fronteiras ucranianas, contra 60 de há duas semanas.

Na semana passada, a Ucrânia pela primeira vez tinha discordado em público de Washington quanto à “iminência de uma invasão russa”, e com o presidente Volodymyr Zelensky alertando que esse alarmismo estava desestabilizando a economia ucraniana e causando uma fuga maciça de dólares.

A Rússia reiteradamente afirmou que não há planos de invadir a Ucrânia, que Kiev precisa negociar diretamente com os revoltosos do Donbass e colocar na constituição os direitos e garantias que lhe foram dados pelos acordos de Minsk, endossados pelo Conselho de Segurança da ONU, e que “no que depender da Rússia não haverá guerra”.

O que Moscou quer é que seja restaurado na Europa o princípio da segurança coletiva e indivisível, sem qualquer expansão da Otan a leste e sem Ucrânia anexada pela Otan, com garantias legais vinculantes; retirada das fronteiras russas dos sistemas de ataque da Otan e sua volta à linha que existia em 1997, ano de assinatura do Ato Fundador Rússia-Otan; retirada pelos EUA das armas nucleares posicionadas ilegalmente em países da Otan não-nucleares; e negociações para restaurar acordos antiguerra nuclear existentes e dos quais os EUA se retiraram unilateralmente.

Nos EUA, 105 entidades antiguerra exigiram que o governo Biden pare com a loucura de insuflar uma guerra contra a Rússia. Com o governo Biden em queda de popularidade, sob inflação alta e 900 mil mortos pela Covid, com seu principal plano, o BBB (Build Back Better, Reconstrua Melhor), empacado no Congresso, e diante de eleições intermediárias em novembro cujas perspectivas não parecem alvissareiras, parece que a Casa Branca, no momento, está apostando na ‘carta externa’ – desviar a atenção do distinto público para longe das questões domésticas, de que os presidentes norte-americanos são useiros e vezeiros -, berrando ‘olha a Rússia, olha a China’ a todo o momento para fugir de suas atuais responsabilidades.