Tribunal espanhol chama Pompeo para depor sobre plano de matar Assange
O Supremo Tribunal Nacional da Espanha convocou o ex-diretor da CIA e ex-secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, para testemunhar sobre uma enorme operação que ele supostamente orquestrou contra Julian Assange e um plano relacionado do governo Trump para sequestrar ou assassinar o editor do WikiLeaks, quando este estava asilado na embaixada do Equador em Londres.
A intimação, revelada pela ABC Espanha na sexta-feira passada, foi emitida pelo juiz do Tribunal Superior Nacional Santiago Pedraz. Ele pretende que Pompeo, juntamente com o ex-diretor do Centro Nacional de Contra-inteligência e Segurança dos EUA, William Evanina, testemunhem perante um tribunal espanhol, pessoalmente ou por link de vídeo, no final deste mês.
Pompeo e Evanina foram intimados como parte do processo criminal contra Davis Morales, um ex-fuzileiro naval espanhol que chefiava a empresa de segurança privada UC Global, que prestou serviços de segurança a embaixada do Equador em Londres, onde Assange vivia como refugiado político.
De acordo com os denunciantes da UC Global, que forneceram evidências, Morales foi cooptado pela CIA em 2016 para vigiar extensivamente o fundador do WikiLeaks. Os ex-funcionários também afirmaram que houve discussões sobre a possibilidade de seqüestrar Assange ou envenená-lo no ano seguinte.
Em setembro do ano passado, o portal Yahoo!News revelou que em 2017 houve discussões nos níveis mais altos do governo Trump sobre medidas extraordinárias contra Assange, incluindo sequestro ou assassinato.
O relatório, baseado em discussões com 30 ex-funcionários dos EUA, alegou que Pompeo, então diretor da CIA, foi figura central na conspiração, tendo dito na campanha contra Assange “nada está fora dos limites”.
Segundo o Business Insider, Pompeo não respondeu à intimação espanhola, embora tenha sido chamado apenas para depor e o tribunal espanhol tenha deixado claro que ele está fora de sua jurisdição de acusação.
Pompeo esteve intimamente associado aos ataques do governo Trump aos direitos democráticos e violações abertas do direito internacional, como o assassinato do general iraniano Qasem Soleimani, em janeiro de 2020, no Iraque.
Quanto ao que fez quando no comando da CIA, Pompeo, não se escusou em 2019: “Quando eu era cadete, qual é o lema do cadete em West Point? Você não vai mentir, enganar, roubar ou tolerar aqueles que o fazem. Eu era o diretor da CIA. Mentimos, trapaceamos, roubamos. Tivemos cursos de formação inteiros. Isso lembra a glória do experimento americano.”
Pompeo reagiu à reportagem da Yahoo!News pedindo que suas fontes fossem processadas sob as leis de segurança nacional, praticamente confirmando a veracidade do relatório.
Por sua vez o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, em relação ao processo espanhol, bloqueou todos os pedidos do juiz espanhol Santiago Pedraz para assistência no processo contra Morales, numa admissão tácita de culpa.
O governo dos EUA se recusou a fornecer qualquer informação sobre endereços IP de computadores americanos que tivessem acesso à vigilância ilegal de Assange coletada pela UC Global e ainda tentou obter do juiz espanhol as identidades dos denunciantes da UC Global.
Documentos dos advogados de Assange ao tribunal espanhol, afirmam que Evanina “confessou” que “a Inteligência dos Estados Unidos teve acesso às câmeras da Embaixada do Equador em Londres, às gravações de conversas dentro da missão, aos dispositivos das visitas e os documentos de viagem de todos eles, tendo inclusive planejado o assassinato ou sequestro do asilado”.
Evanina foi o único ex-funcionário do governo Trump identificado na reportagem do Yahoo!News que detalhava a trama para sequestrar ou assassinar Assange. Enquanto denunciava repetidamente o fundador do WikiLeaks, Evanina afirmou que os EUA “tinham uma coleção primorosa de seus planos e intenções”. Ele falou sobre a escalada da vigilância eletrônica e humana contra Assange.
Quer Pompeo compareça ao tribunal espanhol ou não, a intimação espanhola novamente expõe a tentativa dos EUA de extraditar Assange da Grã-Bretanha como fachada para uma operação de entrega criminal, envolvendo a violação do direito internacional e da legislação doméstica em várias jurisdições.
A reportagem do Yahoo!News deixou claro que a intensificação da campanha dos EUA contra Assange foi uma resposta à exposição do WikiLeaks, no início de 2017, de operações ilegais de espionagem da CIA.
Assange esteve sob implacável perseguição dos EUA desde que expôs, em 2010, junto com os principais jornais do mundo, os arquivos do Pentágono dos crimes de guerra no Iraque e no Afeganistão, bem como de Guantánamo.
Assange teve sua extradição aprovada por alta corte britânica, que havia sido recusada em instância inferior, sob a alegação de que garantias acrescidas por Washington a posteriori não tinham porque serem recusadas. Isso, apesar das ‘garantias’ serem explicitamente condicionais aos desejos e entendimento das ‘autoridades penitenciárias norte-americanas’, isto é, da CIA.
A defesa de Assange havia expressamente assinalado à Suprema Corte Britânica que “Esta é a primeira vez, da qual estamos cientes, que os EUA buscaram a assistência de um tribunal do Reino Unido para obter jurisdição sobre alguém onde as evidências sugerem que ele contemplou, se não planejou, o assassinato, sequestro, rendição, envenenamento dessa pessoa.”
Agora, a decisão final está em mãos da secretária do Interior britânica, Priti Patel, restando à defesa outras vias de recurso, o que significa, ou uma rápida entrega aos EUA, ou mais tempo ainda no presídio de segurança máxima de Belmarsh, tristemente conhecida como a ‘Guantánamo britânica’.
A perseguição a Assange iniciada sob o governo Obama, foi intensificada por Trump e continuada por Biden e, como denunciam entidades de jornalistas do mundo inteiro e de órgãos de defesa da liberdade de expressão, o que está em jogo em última instância é se Washington poderá perseguir, em qualquer lugar do mundo, qualquer jornalista que ouse denunciar os crimes de guerra do Império.
Como Assange fez com o “Assassinato Colateral”: o vídeo (do próprio Pentágono), que registra a interação entre um helicóptero de guerra e o comando, até o metralhamento e morte de civis desarmados em Bagdá – inclusive dois jornalistas da agência Reuters.
Amplamente visto no planeta inteiro, até hoje os executores in loco do assassinato de civis desarmados e aqueles que deram a ordem de atirar – além dos líderes militares e políticos norte-americanos responsáveis pela invasão -, jamais foram levados às barras dos tribunais e, sequer, identificados publicamente. Já o denunciante, Assange, é acusado sob a ‘lei de espionagem’ norte-americana e ameaçado de 175 anos de cárcere.