O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta quinta-feira (27) dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua que indicam uma taxa de desemprego de 14,7% no primeiro trimestre de 2021, a maior para todos os trimestres desde o início da série histórica da pesquisa em 2012. Em números absolutos, são 14,8 milhões de pessoas desocupadas. No entanto, o contingente de desempregados pode ser ainda maior.

É o que afirma o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, consultor do Fórum das Centrais Sindicais, que estima a taxa real de desemprego em até 25%. Para o cálculo, ele levou em conta números da própria Pnad, que mediu a força de trabalho em potencial.

O IBGE considera como força de trabalho em potencial os desalentados, que desistiram de procurar emprego por acreditarem que não vão encontrar, e os indisponíveis, que gostariam de trabalhar mas são impedidos por alguma razão. Na segunda categoria se enquadram, por exemplo, mulheres que cuidam de algum membro da família em casa. Segundo a Pnad Contínua, 11 milhões de brasileiros e brasileiras estavam em alguma das duas situações no primeiro trimestre de 2021.

“Os 14,7% [de taxa de desemprego] não revelam, mas está presente o que é chamado de desemprego oculto. São todas as pessoas que foram para a inatividade, que precisam de um emprego, mas não estão procurando. Se considerássemos essas pessoas, é possível que a taxa estivesse próxima de 23%, 25%”, afirma o sociólogo.

Ele chama a atenção, ainda, para a grande quantidade de subutilizados – categoria que envolve os desalentados, os indisponíveis e os subocupados. Os subocupados são as pessoas que não conseguem trabalhar uma quantidade de horas suficiente para garantir a renda (menos de 40 horas semanais, segundo o critério do IBGE).

No primeiro trimestre, 33,2 milhões de pessoas se enquadravam em alguma das categorias, maior número da série segundo o IBGE. O crescimento deste grupo foi recorde, com 1,2 milhão de pessoas a mais, ou 3,7%. “É um contingente elevadíssimo”, comenta Clemente.

Para ele, as perspectivas para a retomada do emprego não são boas, em especial porque a ação do governo federal não é suficiente. O sociólogo destaca que, até o momento, a única iniciativa no sentido de preservar empregos foi a reedição do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, que permite às empresas adotar medidas como redução de jornada e trabalho. Contudo, ressalta que não há investimento público para criar vagas.

“Investimento público é fundamental. O investimento privado também, mas ele só vem se houver segurança sobre o crescimento. É o investimento público que materializa essa segurança”, afirma.

Vulneráveis

O economista Marco Rocha, professor da Unicamp, destaca a alta recorde na quantidade de pessoas no grupo de subutilizados. “Você está falando de um terço da população que não se insere de forma adequada no mercado de trabalho. Aí temos um retrato melhor, mais realístico do que está acontecendo. A subutilização é um dado importante quando você pensa na estrutura da economia atual. Muitas das pessoas que perdem o emprego não partem para o desemprego aberto, acabam se acomodando em alguma forma de subocupação”, diz.

Ele chama a atenção, ainda, para a vulnerabilidade das mulheres. Segundo o recorte de gênero, a taxa de desemprego chegou a 17,9% para elas, enquanto ficou em 12,2% entre os homens. Além disso, com a pandemia, foram principalmente as mulheres que foram forçadas a deixar o mercado de trabalho para cuidar de familiares idosos ou de crianças impedidas de ir à creche ou à escola presencialmente. Segundo dados do IBGE, entre os trabalhadores subutilizados no primeiro trimestre deste ano 56,4% eram mulheres e 43,2% eram homens.

Incerteza econômica

O diretor-adjunto do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), José Silvestre, afirma que a taxa de desemprego recorde chama a atenção, embora o primeiro trimestre tradicionalmente seja um período de alta no desemprego.

“É óbvio que a pandemia tem agravado a situação no mercado de trabalho. Muito embora seja preciso relativizar, pois também há uma dimensão sazonal. Neste período do ano a taxa tende a aumentar. As pessoas contratadas no fim do ano anterior começam a ser dispensadas”, diz ele, que destacou ainda os 34 milhões de pessoas vivendo na informalidade segundo a Pnad.

Silvestre falou também sobre o que é possível esperar para o resto do ano. Segundo ele, embora a economia mostre alguns sinais de retomada, a pandemia torna o cenário muito incerto. Além da lentidão na vacinação, destaca, há a ameaça de uma terceira onda de contágio e a descoberta da nova cepa indiana no Brasil.

“Mesmo que a economia crescesse 3% ou 3,5%, que é mais ou menos a projeção do mercado, o mercado de trabalho não responde na mesma velocidade. Ainda que você tenha um crescimento em 2021, o desemprego vai continuar elevado. [O desemprego] pode até não aumentar, mas não vai ter redução da taxa”, avalia.