A Organização Mundial da Saúde (OMS) advertiu que a tentativa de suspender as medidas de quarentena contra a Covid-19 “muito rapidamente” poderá causar um impacto econômico “ainda mais grave e prolongado”, na medida em que o vírus “poderá ressurgir”.

O alerta do diretor-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus, durante a conferência de imprensa do dia 3, foi reforçado pela convocação, do diretor do programa de emergências da OMS, Michael J. Ryan, a respeitar as medidas de quarentena.

“O confinamento nos dá um tempo precioso para implementar melhorias na saúde – os testes, a educação da comunidade. Esse é o desafio. Se o fizermos, teremos a oportunidade de voltar à vida normal”, enfatizou.

Ele acrescentou que “não queremos quebrar o confinamento para ter de nos limitarmos repetidamente”. “Precisamos de uma estratégia de transição, controlar o vírus e, se o fizermos, podemos controlar a economia”.

Embora a OMS não tenha se referido diretamente a isso, a quebra da quarentena é ainda mais absurda se o país sequer tiver controlado a pandemia, para a qual não há vacina nem tratamento.

A insistência nisso pode repetir as cenas mais dramáticas dos mortos nas ruas em Guayaquil, Equador, ou do comboio de caminhões militares saindo de Bérgamo, apinhados de caixões lacrados, devido ao colapso dos hospitais e cemitérios da martirizada cidade italiana.

A estratégia da quarentena visa, essencialmente, em alongar a curva de contágios, evitando que o colapso do sistema hospitalar acarrete mais e mais mortos, e torne ainda mais descontrolada a disseminação da doença.

No mundo inteiro, são mais de 1,3 milhão de contágios, com mais de 72 mil mortes. Cinco países já têm mais contágios do que a China, onde a covid-19 foi primeiro detectada: EUA, Espanha, Itália, Alemanha e França. Seis já têm mais mortos do que a China: Itália, Espanha, Estados Unidos, França, Grã Bretanha e Irã.

RISCO DE “SEGUNDA ONDA”

Como os infectologistas têm advertido, sem a adequada contenção da propagação do vírus, esta pode ser retomada numa segunda, ou terceira onda, com ainda mais mortes e mais devastação da economia e da sociedade.

A China, que logrou conter a pandemia, agora age com extremo rigor para evitar que os chamados “casos importados” – cidadãos chineses ou estrangeiros que voltam ao país e estão contagiados – desencadeiem uma segunda onda da Covid-19.

Países que pensavam que poderiam deixar de lado medidas mais duras de quarentena, como Singapura, já deixaram de lado essa ilusão e estabeleceram as medidas de confinamento necessárias a deter a aceleração de contágios. Mesmo caso da Turquia e Japão – só para citar alguns dos mais recalcitrantes.

Trump, que já chamou a Covid-19 de ‘gripe comum’, que garantiu que a pandemia iria sumir com o ‘calor da primavera’ e até se dispunha a revogar a frouxa quarentena que decretara a contragosto ‘até à Páscoa’, e perdeu um tempo precioso ganho pelo povo chinês na luta contra a pandemia, agora alerta os norte-americanos de que terão “uma semana muito dura”, com o epicentro da pandemia transferido para os EUA, mais de 300 mil casos e 10 mil mortos.

Na coletiva diária da OMS sobre a pandemia, o diretor-geral Gebreyesus assinalou que “todos sabemos que isso é mais do que uma crise de saúde”. Ele acrescentou que todos os países estão “em uma luta compartilhada para proteger vidas e meios de subsistência”.

“Todos estamos cientes das profundas conseqüências sociais e econômicas da pandemia e que as restrições impostas por muitos países para proteger a saúde estão afetando fortemente a renda de indivíduos e famílias e as economias de comunidades e nações”, enfatizou Tedros Adhanom Ghreyesus.

Como ele destacou, no curto prazo, programas de assistência social que garantam que as pessoas tenham comida e outros itens essenciais da vida “podem aliviar o fardo de suas populações”.

Ghreyesus lembrou que o alívio da dívida – para muitos países – “é essencial para permitir que eles cuidem de seu povo e evitem o colapso econômico”. Questão para a qual pediu a colaboração do FMI e do Banco Mundial.

Para o diretor-geral da OMS, “a melhor maneira de os países encerrarem as restrições e aliviarem seus efeitos econômicos é atacar o vírus, com o pacote agressivo e abrangente de medidas sobre as quais já falamos várias vezes antes: encontrar, testar, isolar e tratar todos os casos, e rastrear todos os contatos”.

O que torna – como apontou – o financiamento da resposta à saúde “um investimento essencial, não apenas para salvar vidas, mas na recuperação social e econômica a longo prazo”.

Ele não falou nisso, mas a verdade é que os anos e mais anos de cortes neoliberais da saúde e privatizações a rodo só tornaram mais fácil para o coronavírus se tornar a ameaça que está sendo.