Gilmar Mendes e Sergio Moro

Pela primeira vez desde o início da Operação Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou uma sentença do ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça do governo Bolsonaro. Nesta terça-feira (27), a 2ª Turma da Corte suspendeu a condenação à prisão de Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil. Em 2018, no âmbito da Lava jato, Moro sentenciou Bendine a 11 anos de prisão em regime fechado pelos supostos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O caso já havia chegado à segunda instância e dependia apenas do julgamento de um embargo para que Bendine começasse a cumprir pena em regime semiaberto. No Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), a sentença foi reduzida para 7 anos e 9 meses de prisão.

Nesta terça, porém, a maioria dos ministros da 2ª Turma do STF entendeu que Bendine, na condição de réu delatado, deveria ter apresentado as alegações finais após os réus delatores – e não ao mesmo tempo, conforme determinou Moro. Votaram nesse sentido os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia, e ficou vencido o relator da Lava-Jato na Corte, Edson Fachin. O decano, Celso de Mello, estava ausente por motivos de saúde.

Na prática, o processo contra Bendine volta à primeira instância para a apresentação das alegações finais, agora conforme a decisão do Supremo: delatores se manifestam antes; delatados, por último.

A decisão desta terça-feira poderá impactar casos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Há pelo menos uma ação penal contra Lula em que a defesa requereu a Moro a apresentação das alegações finais depois dos corréus delatores.

Segundo o Valor Econômico, o precedente aberto pelo STF deverá fazer os advogados de Lula acionarem a Corte em busca de decisão semelhante. A defesa pensa em levar um ou mais processos contra o ex-presidente de volta à primeira instância.

Além da defesa de Lula, a decisão da 2ª Turma do STF surpreendeu até entusiastas de um freio de arrumação nos métodos da Lava Jato, conforme registra a Folha de S.Paulo. Em temperatura e pressão normais, analisa um ministro do Supremo, a argumentação do habeas corpus teria dificuldade de prosperar. O veredito, portanto, deve ser lido como o sinal mais enfático de que o ambiente na corte mudou sob impacto da chamada Vaza Jato.

O voto de Cármen Lúcia a favor de Bendine causou impacto entre integrantes do STF. Como o caso foi apreciado na ausência de Celso de Mello, a aposta era a de que, se o réu conseguisse a anulação da sentença, seria por benefício de um empate por dois a dois, com a ministra votando contra, alinhada a Edson Fachin. Colegas de Cármen Lúcia, porém, dizem que ela anda “reflexiva” e que parece ter se convencido de que, de fato, em alguns momentos, a omissão do Supremo abriu brechas para abusos.

Essa narrativa foi fartamente explorada pelo ministro Gilmar Mendes durante o julgamento de Bendine. O caso foi à Turma no mesmo dia em que UOL e The Intercept Brasil relataram que procuradores reagiram com ironia e teorias da conspiração às mortes da mulher e do irmão de Lula. Na sessão, Mendes criticou duramente o conteúdo dos diálogos obtidos pelo Intercept. Disse que eram reveladores de “gente sem sensibilidade moral, com uma mente muito obscura, soturna”.

O colunista do jornal O Globo Merval Pereira, pró-Lava Jato, reconheceu que a decisão “foi de certo modo surpreendente, pois não há na legislação exigência desse tipo, porque o instituto da delação premiada ainda é novo na nossa legislação penal”. Mas fez uma aposta em defesa de Moro: “Justamente por ser uma decisão sem precedentes, o caso deve ser levado ao plenário do Supremo Tribunal Federal”.

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Da redação, com informações

Edição: André Cintra