Desenhos de crianças imigrantes mostram centros de detenção

Advogados que visitaram um posto de Patrulha da Fronteira dos Estados Unidos em Clint, próximo a El Paso, no Texas, comprovaram que as 300 crianças, adolescentes e bebês que superlotavam o local – com capacidade para 100 – se apresentavam “gravemente descuidadas”, fruto da campanha anti-imigração desencadeada pelo governo Trump.

O grupo de advogados descreveu ter presenciado crianças de sete e oito anos assumindo a responsabilidade de cuidar de bebês separados de seus pais, frisando que se encontravam “passando fome”, com “piolhos e gripe”, sem escova de dentes, sabão ou acesso a banheiros. Pior, vestindo a mesma roupa de quando atravessaram a fronteira, alguns há um mês quando a legislação obriga a que sejam entregues ao serviço social no máximo em três dias.

Foram entrevistadas 60 crianças, que relataram em detalhes a alimentação completamente inadequada, a falta de água e saneamento, em meio a tantas outras negligências com as necessidades básicas de qualquer idade, mas que são ainda maiores com pequenos que choravam desconsolados pedindo por seus pais.

Uma inspeção do próprio departamento realizada no mês de maio passado havia alertado para uma “superpopulação perigosa” em um centro de processamento de imigrantes em El Paso. Com capacidade para 125 pessoas, ali se encontravam 900. Numa cela para 35 havia 155, uma situação que impedia que as pessoas dormissem no chão ou sequer se aproximassem do único banheiro do local.

“CELAS HORRÍVEIS”

No caso específico de Clint, entre outros absurdos, “as crianças foram encerradas em celas horríveis onde há uma privada exposta no meio da habitação”, no mesmo lugar em que comiam e dormiam. O centro de detenção incluiu seis crianças de três anos de idade ou menos, sendo três bebês. Havia muitos exemplos de crianças cuidando de crianças. Uma garota explicou: “Um agente da Patrulha da Fronteira entrou em nosso quarto com um menino de dois anos e nos perguntou: ‘Quem quer cuidar desse garotinho?’” Com dois pequenos no colo, uma menina guatemalteca de 14 anos disse aos advogados que também precisava de atenção. “Eu sou maior do que eles, mas também sou criança”, declarou.

Como pôde ser comprovado, as crianças do acampamento de Clint vinham sendo alimentadas à base de farinha de aveia, biscoito e bebida adoçada no café da manhã, macarrão instantâneo no almoço e um burrito [comida mexicana] no jantar. Os pequenos não recebiam frutas ou legumes, não tiveram acesso a roupas limpas e nem mesmo a oportunidade de tomar banho por semanas.

“Nos meus 22 anos fazendo visitas a crianças detidas eu nunca ouvi falar desse nível de desumanidade”, relatou Holly Cooper, diretora da Universidade da Califórnia. De acordo com Warren Binford, diretora do Programa de Lei Clínica da Williamette University, em Oregon, há crianças “tão cansadas que estão dormindo nas cadeiras e na mesa de reuniões”. “Não havia ninguém cuidando destas crianças nem as estavam banhando regularmente. Centenas de crianças estavam sendo retidas em um armazém que havia sido anexado recentemente ao centro. As celas estavam transbordando, há um surto de piolhos e gripe. Os pequenos foram confinados em lugares isolados sem a supervisão de adultos. Os encontramos muito, mas muito doentes e encostados sobre os colchonetes no solo”, acrescentou.

Para Gilbert Kliman, psicanalista de San Francisco, “esse cuidado das crianças por crianças constitui uma traição à responsabilidade do adulto, pois é uma responsabilidade governamental”. Na sua avaliação, as atuais condições terão impacto negativo duradouro e danos psicológicos às crianças.

Enquanto isso, em um tribunal de San Francisco, o governo Trump argumentou que as condições “seguras e sanitárias” exigidas para as crianças migrantes por uma ação coletiva de 1985 – arquivada durante a presidência de Reagan – não exigem que sabão e escovas sejam fornecidos. Também o fato de crianças dormirem em pisos de concreto frio em celas com baixas temperaturas foi qualificado como “seguro e sanitário”. A audiência, relatada pela Newsweek, fazia parte de uma apelação federal de uma decisão de primeira instância contra o governo Trump.

Na terça-feira (25), após terem sido retiradas de Clint para albergues de Reassentamento de Refugiados, cerca de 100 crianças foram levadas de volta ao campo. Diante dos reiterados atropelos e ao flagrante desrespeito às condições humanitárias, o mais alto funcionário do escritório de Aduanas e Proteção Fronteiriça dos EUA, John Sanders, apresentou sua renúncia.