Os funcionários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) denunciaram que os cortes feitos pelo governo no instituto para este ano podem colocar em risco a realização no Censo de 2020, que pode não ser realizado pela primeira vez desde o governo Collor (1990)
De acordo com a Associação dos Trabalhadores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ASSIBGE), que entrou com uma reclamação no Congresso Nacional, dos R$ 3,1 bilhões solicitados para a tarefa, foram destinados apenas R$ 1,4 bilhão conforme o Orçamento Geral da União. Outros R$ 830 milhões dependem de autorização do Congresso para serem liberados, o que levaria ao montante de R$ 2,3 bilhões.
“O Orçamento fechou com dotação que é muito inferior [ao necessário]. Impossível de fazer o Censo com o que foi alocado para isso. […] Nós estamos trabalhando para o Censo acontecer e não repetir o que houve com o ex-presidente Fernando Collor em 1990, quando não houve o Censo”, Dione Oliveira, diretora do Sindicato.
O Censo é a única pesquisa que visita todos os domicílios brasileiros (cerca de 58 milhões espalhados por 8.514.876,599 km²) para conhecer a situação de vida da população em cada um dos 5.565 municípios do país. Um trabalho gigantesco, que envolve cerca de 230 mil pessoas, bem diferente da pesquisa amostral, que, como o próprio nome indica, investiga uma amostra da população e, a partir de modelos estatísticos, generaliza os dados coletados para o conjunto da população. Em 2020 ele está marcado para ter início no dia 1 de agosto.
Através do Censo, o poder público pode identificar áreas de investimentos prioritárias em saúde, educação, habitação, saneamento básico, transporte, energia, programas de assistência à infância e à velhice, além de poder elaborar programas de estímulo ao crescimento econômico e desenvolvimento social.
Os cortes feitos pelo governo Bolsonaro no orçamento do Censo jogam foram anos de trabalho e pesquisa para a elaboração da metodologia a ser implantada na coleta dos dados. Segundo Dione, desde 2015 estudos foram feitos para se chegar ao formulário de perguntas do Censo. Muitas delas foram retiradas por ordem do governo na última hora por causa da “intervenção política” no corpo técnico do IBGE.
Algumas questões socioeconômicas foram censuradas impedindo um maior aprofundamento nas contradições sociais. Por exemplo as questões se o imóvel do recenseado é próprio ou alugado, se os alunos são da rede pública ou privada, qual a renda do lar, permanecendo somente a do chamado “responsável pelo domicílio”.
Segundo o Sindicato não haverá ainda questionamentos sobre a emigração internacional, horas trabalhadas e os bens de consumo do domicílio. Tais mudanças afetaram negativamente a elaboração de políticas públicas nas áreas de moradia, emprego e educação, afirma Dione.
“Não é exagero dizer que o que teremos, caso seja possível fazer o Censo, será um Censo capenga, inclusive com problema de perder comparação com 2010 devido a mudanças na metodologia”, diz a sindicalista.
Outro problema apontado pela sindicalista é o número de funcionários para a pesquisa a ser realizada em 2020, no caso, 180 mil. O sindicato esperava um número que ultrapassasse os 203 mil, além de uma remuneração maior para os recenseadores que trabalham em fins de semana e feriados.
Dione destacou que uma das justificativas do governo para os cortes, tanto nas perguntas quanto no Orçamento, é a de que o Censo seria feito em grande escala pela internet. “Em testes que fizemos esperava-se que 20% respondesse ao Censo pela internet. Dados internos nos mostraram, até agora, que esse número ficou em 2,3%”, alertou.
Devido ao quadro considerado preocupante pelo Sindicato, a entidade ingressou com um pedido na Câmara dos Deputados para que um estudo, juntamente com o Tribunal de Contas da União (TCU), seja feito para tratar tanto da questão orçamentária quanto da interferência política no corpo técnico do órgão.