O presidente da CTB, Adilson Araújo, criticou o legado de rendição de Paulo Skaf, que levou a indústria a seus piores resultados em décadas. Para ele, Josué Gomes da Silva precisa se aliar a projeto nacional de desenvolvimento econômico e não a nomes e partidos.

Após quase duas décadas de presidência de Paulo Skaf, a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) terá novo comando a partir de 2022. Quem ocupa a cadeira é Josué Gomes da Silva, empresário da Coteminas e filho do ex-vice-presidente José Alencar (1931-2011) nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (de 2003 a 2010).

O sindicalista Adilson Araújo, presidente da Central de Trabalhadores e Trabalhadores do Brasil (CTB), avaliou em entrevista o legado de Skaf e a perspectiva diante da nova gestão da entidade patronal. “À luz da tragédia vigente, que a gente possa abrir um diálogo entre classe trabalhadora e setor produtivo, numa perspectiva de construirmos juntos um pacto da produção com o trabalho”, afirmou o dirigente sindical.

O silêncio dos culpados

Ele lembrou o modo como Skaf conduziu a entidade de forma equivocada, que levou à derrota da indústria nacional. A entidade teve papel político importante no impeachment de Dilma Rousseff (PT), e Skaf é tido como aliado do presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL). A mudança de comando abre espaço para especulações sobre possíveis mudanças de posicionamento na Fiesp.

Durante a gestão de Skaf, a Fiesp declarou apoio formal ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. O pato da Fiesp, originalmente pensado para manifestações contra a carga de impostos, acabou se tornando um dos mascotes do movimento pelo impedimento da presidente. Além disso, Skaf tem carreira política própria: ele já concorreu ao governo de São Paulo pelo PSB e pelo MDB.

“O Skaf arrotava que nós não íamos pagar o pato, e nós estamos pagando o pato, o marreco e o diabo”, resumiu Araújo, considerando a campanha do pato um desserviço para a população, que agora paga com fome e desemprego recorde. Para ele, o dirigente patronal se rendeu à mediocridade política “ao admitir que, um governo genocida que ele patrocinou, foi o grande algoz do derretimento da indústria nacional”.

“Não conseguimos dar atenção, na gestão Skaf, à política de conteúdo local, à engenharia nacional, à produção industrial… A maior prova disso, é que a pandemia decantou as insuficiências com falta de máscaras, álcool gel, medicamentos e equipamento hospitalar. O Skaf se calou diante disso!”

Tudo que o sindicalismo espera de uma nova gestão da Fiesp, de acordo com Araújo, é que ela não seja tão omissa, como foi a gestão de Paulo Skaf. “Que esse novo presidente sinalize para a busca de uma melhor interpretação do Brasil, que recupere o tempo perdido e dê atenção à potencialização de um ambiente vocacionado a desenvolver a força produtiva, para superar a crise e indicar um novo curso para a indústria nacional no pós-pandemia. Se essa for a disposição do empresariado brasileiro, sobretudo da indústria de transformação”, recomendou.

Rendição neocolonial

Skaf sai da Fiesp demonstrando total incapacidade, inoperância e descompromisso com o projeto nacional de desenvolvimento. Esta é a opinião enfática de Araújo, ao analisar o legado negativo do dirigente empresarial. “O próprio empresariado começou a perceber que, com Skaf não dava mais, assim como o povo brasileiro sente que, com Bolsonaro não dá mais”, disse.

Ele não está sendo apenas retórico quando diz isso, pois o próprio Josué, em discurso após a eleição insinuou isso. “Isso aumenta a responsabilidade, pois suceder Paulo Skaf é um desafio enorme, especialmente neste momento em que, pela primeira vez em décadas, a indústria de transformação apresentou participação no PIB um pouco inferior a do setor agropecuário”, pontuou o novo dirigente.

Para o sindicalista, esse sentimento é sintomático de uma rendição que vigorou na gestão Skaf. Ele citou o modo como o Brasil abriu mão de sua autonomia energética, ao importar petróleo refinado, em vez de refinar, o que também afeta os custos e a competitividade da indústria nacional.

Ele mencionou o processo de fortalecimento das cadeias produtivas, a partir do governo Lula, que foi interrompido com o golpe de 2016. “Agora, o governo aponta para um neocolonialismo com a complacência do Paulo Skaf e sua propaganda. A indústria precisa recuperar seu protagonismo, que vem perdendo espaço internacional, segue patinando diante de uma pandemia à qual não conseguiu dar resposta adequada”.

Apoio presidencial

Para o dirigente sindical, além de pura especulação, todo o debate em torno de um eventual apoio eleitoral do novo presidente da Fiesp, é inútil. Em sua opinião, Josué precisa demonstrar a que veio, ou seja, que é o verdadeiro defensor da indústria, diferente de Skaf.

“A centralidade da reindustrialização está ligada a um projeto político. Bolsonaro não tem projeto de recuperação da indústria, mas Lula tem empatia com esse projeto. Assim, Josué tem que ter compromisso com o projeto”, explicou.

Para ele, deveria ser indiferente para a Fiesp quem disputa a eleição, mas quem apoia um projeto de desenvolvimento nacional para o País. “O fato de apoiar um presidente da República não é suficiente para resolver os problemas estruturais e macroeconômicos do país. O governo Lula ficou devendo muita coisa, mas o Bolsonaro está devendo tudo”, diz ele, sobre eventuais candidaturas progressistas em 2022, na disputa com Bolsonaro.

Araújo observa como a China e os EUA, tanto de Biden, quando de Trump, estão alertas para a necessidade de aumentar a produção industrial, como estratégia para recuperar empregos qualificados. “Se o mundo todo passou a enxergar a necessidade de recuperar a produção da indústria em alta escala, como fator decisivo e estratégico para a retomada de um novo curso na economia, o Brasil não pode se render ao compromisso de arar terra para o neocolonialismo”, analisou.

Conforme defende o sindicalista, a Fiesp precisa seguir uma nova orientação, de dar voz a um curso de solução aos problemas estruturais do Brasil. “Um país industrializado é capaz de desenvolver suas forças produtivas, gerar emprego, qualificar mão-de-obra, introduzir tecnologia etc. A gente forma milhares de jovens, todo ano, que não têm oportunidade de trabalho porque não tem indústria operando”, lamentou.

Josué Gomes da Silva

O presidente eleito da Fiesp, além de ser filho de José Alencar, também já tentou carreira política. Em 2014, Josué concorreu ao Senado por Minas Gerais pelo então PMDB, perdendo para Antonio Anastasia (PSD-MG).

Josué chegou a ser apontado na imprensa como possível vice de Lula nas eleições de 2022, mas negou. Sua trajetória familiar sugeriria uma facilidade para a aproximação de candidaturas de esquerda com os empresários. Na entidade, no entanto, nada disso é dito, pois as manifestações internas insistem numa retórica de apartidarismo, autonomia política e continuidade, embora se omita o apoio explícito da Fiesp ao impeachment de Dilma.

A chapa de Josué, que concorreu sozinha à presidência da Fiesp, foi apoiada por Skaf. Seu mandato se iniciará em 1º. de janeiro de 2022 e irá até 31 de dezembro de 2025. A nova diretoria da Fiesp é composta pelos empresários Rafael Cervone, 1º vice-presidente, Dan Ioschpe, 2º vice-presidente e Marcelo Campos Ometto, 3º vice-presidente.

Em relação ao momento atual, Skaf lembrou que seu trabalho continua até o dia 31 de dezembro, que trabalhará até o último dia e afirmou que está mobilizando outros setores produtivos para impedir que a Reforma Tributária que está em discussão traga aumento de impostos, temas que Josué reafirmou em seu discurso. “Quando há dinheiro sobrando, se faz reforma. Quando falta dinheiro, a melhor reforma é o corte de gastos”.

(Por Cezar Xavier)